HeLe 17/12/2017
Crise Humanitária
Em "Estranhos à nossa porta" , Bauman propõe uma reflexão atual e mais do que necessária, a crise humanitária.
O autor utiliza como referencial para as discussões e análises artigos, editoriais, livros e discursos de governantes. O corpo do livro é dividido em seis capítulos.
1) O pânico migratório e seus abusos – Bauman contextualiza que a migração em massa não é um fenômeno recente. Ele tem acompanhado a era moderna, por vezes, apenas mudando e revertendo a direção. No momento, com a profunda e aparentemente insolúvel desestabilização do Oriente Médio. O autor traz termos bem discutíveis como: pânico moral; comunidades fechadas; mixofobia; políticas suicidas; cultura do conforto e câmaras de eco.
2) Flutuando pela insegurança em busca de uma âncora – Bauman resgata pesquisas realizadas na Europa em relação ao posicionamento da população com políticas de flexibilização para migração. E, como a política e a mídia são aliadas na disseminação do chamado "medo e ansiedade oficial", em um termo até então não muito conhecido –, securitização. Analisa como o mercado lucra com o medo; que a securitização favorece o recrutamento de verdadeiros terroristas e o crescimento de alistamento e aliciamento de jovens europeus a grupos extremistas.
3) Sobre a trilha dos tiranos (ou tiranas) – Bauman destaca como os discursos de Trump ganharam e ganham força. A partir do texto intitulado "Donald Trump e a revolta da classe ansiosa (de Robert Reich)" . Neste capítulo há algumas analogias, baseadas tanto no Evangelho de Mateus, em livros como "O processo", "O Castelo", na tese de doutorado de Foucault, textos de Bakhtin e na obra pioneira de Eric Hobsbawm. Atenta-nos aos discursos e "truques de mágicas"; como os sistemas religiosos tiram proveito com a fabricação do "medo oficial" e disseminam a "individualização". Termos chaves no capítulo são: sociedade da performance, sociedade da disciplina, a sociedade sólida moderna, cultura do individualismo e a consciência cosmopolita.
4) Juntos e amontoados – Bauman afirma que a migração presente desde os nossos ancestrais - iniciou-se na África para o Oriente Médio e se dispersaram por todos os continentes do planeta. Atualmente, somos 7 bilhões, um grande desafio, pois somos seres formados durante longos milênios numa vida em hostes locais e, há a necessidade de equiparmos com ideias e instituições que permitirão convivermos como uma tribo global. Bauman corrobora com Kant, ao reivindicar a substituição do termo (no agir e ser) da hostilidade pela hospitalidade; o direito de se associar (estabelecer laços de amizades mutuamente benefícos). Discussões sobre a imigração nos EUA e na Europa nos séculos passados e a atualmente são feitas a partir da discordância entre moral e política, e, posteriormente, a associação da ética –, com estudos por Emmanuel Levinas e destrinchados pela Arendt.
5) Problemáticos, irritantes, indesejados: inadmissíveis – Bauman ao contrário da maquiagem utilizada pela mídia e dos discursos políticos vai ao ponto central (e cruel) da crise humanitária –, fronteiras, muros, alarmes, a desumanização, à exclusão da categoria de seres humanos, o uso da palavra "baratas"*, associação feita por Katie Hopkins, com discursos odiosos, porém disfarçados como "recuperar o controle" das fronteiras do continente.
Michel Agier, um dos mais experientes no assunto afirma que " a política migratória se destina a consolidar uma divisão entre duas grandes categorias mundias cada vez mais reificadas: de um lado, um mundo limpo, saudável e visível; de outro, o mundo dos 'remanescentes' residuais, sombrio, doente e invisível". Daí parte a maior crueldade, esses campos "não serão mais usados para manter refugiados vulneráveis, mas para reunir e vigiar todos os tipos de população indesejável". Por fim, Bauman apresenta as políticas de migração "europeização" e como elas estão moralmente insensatas e contribuindo para uma carnificina e a desvalorização da dignidade humana.
6) Antropológicas versus temporárias: as raízes do ódio – Bauman inicia o capítulo discordando do que Kant acreditava que "o conhecimento moral, o conhecimento do certo e do errado, é permitido a todos os seres humanos graças às suas faculdades racionais", com o apoio de evidências empíricas apresentadas por Hannah Arendt em "a conduta moral não é algo que ocorra naturalmente". Kant atribui uma "lei moral dentro de mim" , o que eleva o valor do ser, revelando "uma vida independente de toda animalidade e até de todo o mundo sensível". Enquanto Arendt afirma "a qualidade pessoal de um indivíduo é precisamente essa qualidade moral", e como "persuadir a vontade a aceitar os ditames da razão". Ela localiza duas áreas, Pensamento e Ação, e a ponte entre eles é a arte do Diálogo.
Aplicando-se para uma linguagem atual, dois mundos diferentes – o "on-line" e o "off-line". On-line, mundo seguro, amplo, confiável, autoadministro, estabeleço e defino, recompenso e puno a indisciplina, detenho a arma do banimento e da exclusão.
Off-line, mundo sob controle –submeto ao controle das circunstâncias contingenciais, voláteis e muitas vezes sou forçado a isso – há regras de obediências, ajustes e negociações.
A associação desses mundos com a crise migratória é clara.
Sem diálogo será impossível a vivência e convivência humana na Terra. O fenômeno do encontro, com diálogos à compreensão mútua, como "saber de que modo ir adiante" uma fusão de horizontes, de conhecimentos, de linguagens, de conversações, "mundos da vida". É entrelaçar, condicionar um ao outro, conduzir e contribuir para uma concretização exitosa.