Letícia 09/05/2023
A crise do desamparo humano.
Eu nunca me canso de dizer o quanto Liev Tolstói consegue ser um dos escritores de maior genialidade do mundo. Eu sou suspeita pra falar dele, mas essa obra atingiu outro patamar. Creio que se tornou a minha favorita dele.
Já conhecia a história do Liev com a sua fé e sua religião, mas a Confissão presente nesse livro é a forma mais humana de se retratar o desamparo humano nas nossas vidas. O livro é angustiante, trágico e extremamente sentimental. A forma como ele trata com naturalidade a depressão, a crise existencial e o suicídio foi de outro mundo. Penso o tanto que essa obra não deve ter causado uma confusão na época, até nos dias de hoje, não se fala sobre o suicídio de forma clara, e muito menos sobre o poder ou não de Deus.
Creio que pessoas que não possuem muita fé em Deus, irão estranhar esse livro e vão considerar algo religioso. Mas não, passou longe de ser puramente religioso, esse livro retrata a decadência do homem. A forma como nós nos inserimos em ciclos sociais que nos levam a decadência, Liev fala sobre a época que viveu com pessoas que bebiam, luxavam, riam dos outros e menosprezavam qualquer coisa que não fosse considerada "verdade" para eles. Além disso, ele também se recordou da época de guerra, época que matou e era elogiado por isso. Os vícios e a glorificação de caminhos destrutivos.
Vejo muito dessa obra nos dias atuais, seguimos caminhos pré-ordenados por outras pessoas, e quando crescemos e nos informamos sobre o mundo ao redor, batemos de cara com essa crise existencial que o Liev retrata nesse livro. Eu fui batizada com 4 anos de idade e permaneci na igreja até os meus 14 anos de forma involuntária, obrigada e sem sentir apreço algum por aquele lugar, religião e pessoas. Passei por fases horríveis, e me considerei ateia. Hoje, aos 25 anos, percebo que nada do que fui me cabe mais.
Eu e Tolstói compartilhamos muito das mesmas opiniões, percebi que o meu maior repúdio daquele lugar, era justamente pelo fato de eu me prender ao que aquelas pessoas faziam dentro ou fora da igreja, pessoas invejosas, maldosas. E como uma criança e adolescente, não sabia separar uma coisa da outra. Não vou entrar no mérito da religião porque isso cabe a cada um.
Mas posso dizer sobre o fim dessa obra, que nos deixou bem claro que podemos não ter a resposta de tudo, e nem sabermos se temos ou não sentido nas nossas vidas, mas que a coisa mais corajosa que podemos fazer, é continuarmos vivos mesmo quando queremos morrer. Pois se o homem vive, é porque ele acredita em alguma coisa. E essa alguma coisa, deve bastar pra nossa vida.
Já dito por Liev: Na doutrina existe verdade, disso não tenhamos dúvida, mas também não há dúvida de que nela existe mentira, e nós temos de encontrar a verdade e a mentira, para então separar uma da outra. Não podemos chamar esse sentimento de outro modo, senão de busca de Deus.