Giovana 12/07/2018"As pessoas formam uma opinião antes de conhecerem você."A história de Tudo o que nunca contei começa na década de 50 nos Estados Unidos, época que Marylin e James (pais de Lydia) se conhecem.
Marylin é norte-americana e branca e James filho de imigrantes chineses.
Hoje em dia o relacionamento deles não seria nada demais, certo? Pois é, mas imaginem que nos EUA nessa época havia LEIS anti-miscigenação (proibição de relacionamentos entre raças diferentes) até 1967 e que mesmo depois de decretado a decisão de revogá-las, alguns estados demoraram muitos anos pra mudar as constituições e permitir o casamento inter-racial. Ou seja, o casamento deles só seria "aceitável" aos olhos das pessoas anos depois. Mas, contrariando a todos, eles escolhem ficarem juntos.
Ok, situado nesse ambiente terrível, teremos também uma aparição do feminismo, pois Marylin se sente frustrada por não querer seguir a vida de dona de casa como a mãe (muito comum nessas décadas), mas sim de médica; E acaba "perdendo" a chance de realizar esse sonho depois de descobrir que está grávida.
E durante todo o livro então, vamos conhecer a história ao redor desse núcleo familiar dos Lee. Através de uma narrativa em terceira pessoa e intercalando passado (antes da morte de Lydia) e presente (dia da sua morte e eventos posteriores), Celeste nos apresenta a ótica de todos os membros da família. E olha, ao ler, dá vontade de abraçar os personagens e dizer a todo momento: "Calma, tudo vai ficar bem".
Percebe-se claramente que o foco da história é Lydia (apesar de os outros integrantes da família aparecerem muito também). Com seus 15/16 anos, a menina é o alvo dos pais, que desejam que ela supra suas expectativas e os objetivos frustrados do passado. E aí entra outra e, pra mim, a maior das questões do livro: o peso das expectativas familiares. Lydia não quer ser médica ou popular ou o que for, ela só deseja ter liberdade de escolha, embora algo a pressione pra guardar esses sentimentos para si.
Quando ela morre, fica aquela dúvida no ar se foi suicídio ou assassinato. Mas o livro não gira ao redor desse mistério. Não que não seja algo importante, é sim. Mas o ponto central, a meu ver, é a discussão e reflexão sobre uma família assombrada por racismo e acontecimentos passados. Celeste nos mostra como pequenas ações de ódio afetam a vida e escolhas das pessoas, impactando também suas futuras gerações.
Eu nunca conheci alguém próximo que fosse de descendência chinesa (e oriental, no geral), então nunca presenciei preconceitos do tipo. Embora saiba que exista, foi bem pesado ler algumas coisas. Rola aquela sensação de querer entrar no livro e resgatar o personagem de toda aquela maldade alheia? Total.
Mas e aí você pode se questionar: Daria pra resolver tudo isso apenas dialogando mais? E eu digo que talvez sim, talvez não. Imagino que em qualquer família é praticamente impossível ser aberto sobre tudo.
Logo, é difícil julgar a família Lee por tudo o que ocorreu (e que não ocorreu também). O livro serve pra nos fazer refletir sobre alguns temas e isso, garanto que faz com maestria.
Já adianto que o desfecho da história é, de certa forma, sujeito a interpretações. O que pode não agradar a todos, mas eu acho que complementou todo o cenário da história.
Por fim, devo dizer que recomendo sim (e muito!) o livro. É algo difícil de se ler e ao mesmo tempo tão fácil de se identificar. O título resume perfeitamente o tema do livro e fala por si só. Tudo o que nunca contei, vale para todos os personagens, que guardam as coisas pra si e se deixam sufocar por isso.
Gostei muito da escrita da autora. De uma forma marcante, ela soube dissecar a história e transmitir vários sentimentos envolvidos, o que me levou a conexão com os personagens e, claro, sofrer junto com eles.
Já inclusive adicionei à minha wishlist o outro livro dela publicado: Pequenos Incêndios por toda parte (que promete ser outro tapa na cara).
site:
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