fernandaugusta 05/06/2021Inesquecível"Pachinko" é um épico escrito com propriedade. Vai da década de 30 até 1989 sem deixar nada para trás. O cenário de início é a Coreia sob dominação japonesa. Na ilha de Yengdo, uma família de pescadores pobres tem um filho com lábio leporino e uma perna torta. Estas características físicas, além da pobreza, marcam a vida de Hoonie. Ele não espera se casar nunca.
A família prospera e passa a alugar um cômodo para trabalhadores. Os coreanos se veem cada vez mais empobrecidos pela cobrança de impostos e taxas. Hoonie, contra todas as probabilidades, arruma uma noiva - Yangjin. Dessa união, após numerosos abortos nasce Sunja, criança amada pelo pai. Após a morte de Hoonie, Sunja e a mãe herdam a pousada e tocam o negócio sozinhas.
Sunja então se vê grávida aos 17 anos. O pai da criança já é casado, e membro da yakuza. Neste dilema, desonrada e com uma criança a caminho, surge doente na pousada o pastor presbiteriano Isak Baek. Após ser cuidado pelas mulheres, ele decide se casar com Sunja e dar um nome ao filho dela. Os dois se mudam para Osaka. No Japão, o restante da saga se desenrola.
Muitas coisas merecem ser pontuadas: a tradição e o moralismo oriental dão o pano de fundo para as escolhas de todos os personagens. No Japão, há forte xenofobia e racismo contra coreanos, considerados burros, sujos e indignos. As dificuldades em Osaka são muitas: os coreanos vivem em um gueto, segregados. Com o desenrolar da história passamos pela Segunda Guerra Mundial, pela cisão das Coreias e somos inseridos dentro das mudanças históricas no contexto de cada núcleo.
O cerne de tudo é Sunja e sua família: a luta pela sobrevivência, o medo, a vergonha, as perdas que vão acontecendo e moldando quatro gerações. Muitos destinos paradoxais, extremamente reflexivos e muitas abordagens que lembram o jogo "pachinko", que dá nome para a obra: você pode até calibrar a máquina, mas as chances de ganhar ainda persistem, e por isso tantos seguem jogando. Assim é a vida.
Pelos meandros das vidas de Sunja, Noa, Mozasu, Kiunghee, Yoseb, Koh Hansu e tantos outros, entramos nas particularidades da cultura oriental, suas casas, mercados, pratos típicos, vestes, política, ensino, costumes e até mesmo idioma. Uma grande aula.
Para mim, "Pachinko" fica no mesmo patamar de beleza de "O Físico" e "Shogun", para começar citando apenas dois épicos que amo. Aborda com riqueza toda sorte de temas profundos, expõe verdades e acaba se tornando uma leitura inesquecível.
P.S.: a leitura em inglês foi bem fluida, apesar de muitos termos e expressões novos do coreano e do japonês. Neste aspecto, o Kindle ajuda bastante com os dicionários e sinônimos.