Estêvão 03/04/2021Romancista como vocação, de Haruki Murakami, como o título sugere, é mais uma daquelas obras que temos um escritor falando sobre escrita, sobre sua trajetória profissional, entre outros temas desse universo. Aqui, o escritor japonês faz isso de uma forma pessoal, evitando ao máximo teorizar ou soar academicista, e isso é o melhor e o pior desse livro.
Melhor porque deixa tudo mais acessível, informal, a leitura flui bem. Para quem é gosta de seu trabalho, saber como começou a carreira, como trabalha ao escrever um livro, o que pensa de alguns temas, como prêmios literários, por exemplo, certamente tem aqui informações curiosas e interessantes.
No entanto, essa mesma proposta deixa as coisas sem uma condução organizada, com o autor entrando em assuntos paralelos que apenas deixam o livro inchado – um exemplo disso é o capítulo sobre escolas –, expondo sua opinião sobre temas que não se relacionam com o que se espera encontrar em uma obra como essa.
Além disso, a arrogância com que emite algumas opiniões se torna tão evidente que fica difícil separar o conteúdo da pessoa que escreve.
É por não dosar objetividade com opiniões contundentes que o livro descamba para uma série de falas que demonstram um amargor, uma frustração e, por que não, uma raiva ao discutir alguns temas, como prêmios literários, a relação com os críticos, uma dificuldade em lidar com opiniões contrárias que revelam bastante do autor.
Outro ponto que me marcou durante a leitura foi a forma defensiva com ele muitas vezes se coloca, iniciando constantemente seus parágrafos fazendo menção a “seus 35 anos de carreira” ou a “seus vários romances publicados”. Isso não só busca ser uma forma de se afirmar como escritor, como seria argumento de autoridade, o curioso é se citar para isso.
Enfim, como disse, é difícil falar desse livro sem falar do seu autor, até por a obra ter esse tom mais pessoal, quase que como um diálogo, o que faz com que as coisas que diz – poucas, mas algumas interessantes – se percam em sua amargura, rancor e arrogância.