Nath 15/01/2020
A pessoa que está presente, ali, na caminhada, é o mais próximo do que ela é de verdade.
Caminhar para ser livre!
Esse, sem dúvida, poderia ser o mote principal para nomear esta obra incrível e magistral!!
Mas, talvez, antes de falar da obra em si, eu deva mencionar um pouco o meu antigo amor pessoal pelo caminhar.. E sim, talvez esse meu antigo hábito de percorrer longas distâncias tenha influenciado e MUITO o meu interesse para começar essa leitura. E sinceramente, ela tornou-se uma das histórias mais tocantes que eu já li na vida. Não só a nível de quadrinho, como á nível de literatura também.
Como o próprio autor o Taniguchi mencionou em um texto de apoio complementar desta edição: "Para mim, o passeio é uma liberdade sem objetivos ou limites de tempo. (..) Quando caminhamos devagar, podemos descobrir coisas fugidas. São, claro, coisas ínfimas, acontecimentos que nos enriquecem e, se me deixar levar por meu entusiasmo, diria até que ao caminharmos nos deparamos sempre com coisas que nos fazem sentir plenamente o prazer da vida!"
Qualquer um que iniciar essa leitura, perceberá que esta é uma narrativa que nos levará indiscutivelmente para uma fronteira entre a história em quadrinho e a poesia.
Pois o autor aqui busca mostrar através de um único personagem principal em suas andanças em sua cidade natal, o prazer único do simples caminhar e de contar histórias a partir de coisas aparentemente “insignificantes” do cotidiano e refletir sobre cada uma dessas questões tidas como supérfluas pela nossa sociedade capitalista individualista.
O personagem principal aqui não tem um nome, e isso não importa! O que importa mesmo é essa subjetividade nas reflexões rotineiras, esse aprendizado constante da simplicidade do puro viver e sentir-se vivo em meio ao caminhar no ambiente que nos cerca.
O homem que passeia poderia ser eu, poderia ser você, poderia ser qualquer um.. Contanto que se deixe entregar a essa contemplação infinita da vida, tão necessária para o autoconhecimento humano e para uma visão mais ampla do mundo que nos cerca.
A arte do Taniguchi é simplesmente magistral e um deleite aos olhos! Os traços naturalistas são incrivelmente detalhista, tanto que em muitos momentos eu me senti caminhando junto com o protagonista, sentindo texturas, cheiros e sensações. Sempre sozinho. Sempre contemplando. Sempre caminhando. Sempre refletindo os momentos fugazes e essenciais da vida: á exemplo dos vários recortes do sentir entre os dedos da mão a casca de uma velha árvore centenária, a maciez das pétalas de uma cerejeira derramadas suas folhas sobre a grama antes de se deitar nela ou o peso gravitacional dos pingos da chuva antes de uma tempestade.
Este foi um quadrinho que eu li com um sorriso no rosto do começo ao fim, lembrando de minhas próprias andanças “fugazes” pelas ruas de minha cidade, sempre contemplando pelo simples prazer do olhar e caminhar.
Um quadrinho originalmente lançado no Japão em 1990, mas que continua tão atual em tantas reflexões! O meu primeiro favorito do ano!! E como já disse o próprio Jiro Taniguchi no Posfácio dessa edição:
"Quando tiver um tempo livre, leitor, procure sair para andar sem rumo. Aqui ou ali, encontramos coisas esquecidas, sentimos prazer em observar a passagem das nuvens e nos sentimos cada vez mais tranquilos. A pessoa que está presente, ali, na caminhada, é o mais próximo do que ela é de verdade."