Natalia 01/06/2020
Apassionata
Conheci Jane Hawking através do filme "A Teoria de Tudo". Para mim, ela era apenas "a esposa de Stephen Hawking". Triste categorizar a mulher pelos feitos de seu marido. Mais triste ainda quando se descobre que ela tem uma escrita notável, fluida e compassada, como uma sinfonia. Esse é o retrato do livro "A Pequena Pianista": a visão de uma criança sobre a sua vida cotidiana, tão bem descrita que nos envolve, exatamente como uma música envolveria.
Ao longo da leitura, é possível vislumbrar Ruth, a protagonista, em múltiplos estágios do seu crescimento. A narração muda conforme a personagem se desenvolve; seus pensamentos ganham maior complexidade e seu olhar sobre os ocorridos da sua vida amadurece. Destaques do livro são os relacionamentos interpessoais de Ruth. Com seu pai, transborda amor e cuidado. Com seu avô, a aventura superava os medos. Com sua avó, Nan, a doçura e a felicidade de ter alguém que não só amava, como também ensinava e inspirava. Com sua mãe, a dificuldade de, em sua fases mais frágeis, compreender uma doença mental. Nessa última, é interessantíssimo (e, muitas vezes, triste) perceber como uma criança processa uma situação de doença psiquiátrica, inclusive quando respostas lhe são negadas por "proteção". A relação mais explorada no livro, entretanto, é a de Ruth com a música. Com impedimentos importantes no caminho, a menina anseia se tornar, justamente, o título do livro. É muito bonito ver o seu caminhar. Ruth aprendeu a valorizar a arte e, com isso, a sua inteligência emocional se desenvolveu, superando desafios através dos sons que aprendeu a tecer com os dedos.
A leitura me prendeu e me emocionei em diversas passagens. Tenho uma tendência a avaliar as leituras pela capacidade que elas têm de provocar sentimentos em mim... É possível que a identificação tenha vindo do fato de que, quando criança, também fui uma menina que aprendeu a tocar piano com sua avó. Memórias foram despertadas e a vontade de sentar na frente de um piano voltou com tudo. A escritora foi muito bem sucedida em criar uma aura de encanto, suficiente para ler ouvindo meus clássicos preferidos, incluindo Apassionata do Beethoven, imaginando Ruthie tocando com maestria. Por isso, o sobrenome Hawking não mais me desperta apenas a lembrança do Stephen; me traz também um gostinho do que Jane me fez sentir.
Prazer em conhecê-la, Sra. Hawking.