spoiler visualizarDiliam Andrei 09/04/2022
Um alerta para a dispersão
O alerta vale por dois: para quem pretende ler o livro e resume o valor moral da obra.
O intuito (da minha leitura) é observar a tensão entre o querer do individuo e o que é imposto pela sociedade. Na p. 72 notei que, apesar de ficar normalmente nervoso perto das "raparigas", conforme ele havia dito antes, quando uma "de cor" senta-se perto dele ele a trata com indiferença. Será que é porque segundo seu julgamento ela nada poderia oferecer-lhe? Ou apenas o pegou numa hora ruim? O julgo da sociedade se impregnou nele também ou ele não é mais que um membro da sociedade?
Tem sido realmente um desafio seguir e concluir a leitura do livro, pois retrata a triste superficialidade do povo brasileiro, maior que a dos outros. Por exemplo, retrata a tentativa de se igualar a Buenos Aires através de um decreto no qual ninguém poderia andar descalço na rua, para assim parecer mais elegante. Parecer, isso que importa.
A questão do decreto de uso dos sapatos foi usada habilmente pelo jornal O Globo, que induziu o povo à rebelião. Como resultado o jornal saiu ainda mais poderoso do que era, mandando e desmandando nos cargos públicos do mais alto escalão. A parte enfadonha passou e no final a obra assume seu valor, que é enfatizar os perigos que podem levar um homem a se perder no caminho. O começo trágico do Isaías, sua miséria inicial por não ter meios de realizar uma vida com sentido simplesmente por falta de recursos e oportunidade, é substituído pela tragicidade de uma autoavaliação na qual a não realização dos sonhos da juventude não se deve mais à falta de meios, mas à adequação à própria sociedade da qual se propunha a ser um agente ativo em primeiro lugar. O Isaías vítima e autor de sua derrocada olha pra trás e vê que seus talentos foram subutilizados, esquecidos e empregados de maneira torpe, vil e mundana. Mas deixa também uma ponta de esperança pois em algum momento de fato se mudou "para o mato" e pôde criar algo de verdadeiro (subentende-se). O final da obra, marcada no ano de 1908, deixa bem claro o estado em que se encontrava a sociedade, que logo mais tarde ia culminar no período turbulento do fim da primeira república. Trazendo para os nossos dias, não vejo evolução. Ao contrário, se antes os jornalistas queriam parecer ser, hoje o povo está mais baixo do que esteve ao ponto de não haver mais do que mentiras e histórias rasas nos periódicos de massa e na televisão. O que podemos esperar do futuro então? Não penso que nada menos que uma tempestade possa vivificar a população. Mas essa nova revolução não será política, mas do pensamento. Deverá vir de cima, não do poder político, mas de cima no plano moral. Enquanto isso não acontecer, façamos cada um sua parte, falando e agindo do lugar mais alto possível. Se nada mudar, ou mudar para pior durante a carreira, que seja. Na pior das hipóteses o Eterno está vendo, e isto é tudo o que importa no fim das contas.