Tamirez | @resenhandosonhos 30/07/2018Eternamente CecíliaQuem ai assistiu ou se lembra de Terra Nostra, novela da Globo que falava sobre a imigração italiana para o Brasil e o amor tórrido entre Giuliana e Matteo? Pois essa foi a minha primeira lembrança quando me deparei com a sinopse de Eternamente Cecília. Com um enredo que se passa em 1890, temos como cenário os anos seguintes ao fim da escravidão e a vinda de imigrantes para trabalhar nos cafezais.
Nossa protagonista é uma jovem corajosa e determinada, de temperamento forte, que após a morte da mãe tomou as rédeas da família, olhando principalmente sobre seu irmão mais novo, ainda uma criança e o pai, que está doente. Com a promessa de um futuro melhor eles chegam ao Espírito Santo não encontrando exatamente o que foi prometido.
Acho que um dos pontos interessantes da trama, antes de entrarmos no aspecto do romance, é toda a questão social envolvida. Sem os negros e agora tendo que remunerar os trabalhadores, isso acaba por não mudar completamente a visão dos fazendeiros sobre quem está trabalhando pra eles, e eles ainda veem pessoas inferiores, sem importância, agora na figura dos italianos. O desprezo marcado pela pompa da riqueza, aqui muito bem representado por Estela Dias, nos mostra que um pedaço de papel como a Lei Áurea pode mudar um cenário, mas não é o bastante para mudar a mentalidade das pessoas.
“Sempre criticou a escravidão, mas viveu no Rio de Janeiro gastando o dinheiro produzido pelo trabalho escravo. Nunca se dignou a abrir mão de boa vida em favor dos seus ideais. Criticar é fácil, mas trocar de lugar conosco você nunca quis.”
Numa outra ponta da balança, porém, temos Francisco. Herdeiro da fazenda Bela Vista, se formou em direito no Rio de Janeiro e não quer ter muito a ver com a vida no campo, mas é obrigado a voltar para lidar com a situação financeira da família – que não é boa – e com a mãe – com quem não se dá bem. Ele é um mulherengo e por ser bonito não tem dificuldades em encontrar jovens dispostas e cair aos seus pés. Entretanto, é alguém de boa índole, bom coração e que luta pelos direitos humanos e por uma igualdade social melhor, ajudando pessoas através da sua profissão, tudo isso com a controvérsia de onde veio o dinheiro que possibilitou isso. Já a visão de Otávio, o amigo que o acompanha até a fazenda é um pouco diferente. Também um jovem rico e bem afeiçoado, acha que pode conseguir o que quiser à força, pois é seu “direito”, em sua visão distorcida.
É então, que quando ambos pousam seus olhos sobre Cecília, a vida da garota começa a se transformar. O bom é que a jovem não é nem um pouco boba e sabe muito bem as consequências que qualquer envolvimento pode significar pra ela aqui. Seu objetivo é manter sua família unida e à salvo, conseguir dinheiro suficiente para tratar o pai e tocar a vida sem incômodos. Mas às vezes o coração pode dificultar esse caminho.
Romance histórico é um tipo de leitura que eu quase não faço porque praticamente não leio romances em geral. Porém, quando me deparo com eles, gosto de encontrar sempre algo a mais, pois essas histórias proporcionam que o leitor encontre inúmeros debates e questões em seus backgrounds, então porque não usar? E é o que a autora faz aqui. Há sim uma história de amor, mas ela é em suma pautada pelo cenário e as questões sociais da época e isso sempre é muito interessante.
Ao estarmos distantes por mais de uma centena de anos, vislumbramos algo longe da nossa realidade atual, mas que ainda assim reflete no nosso presente. Pessoas negras ainda são tratadas com inferioridade, imigração ainda é um assunto em pauta, principalmente entre a política internacional e, claro, todo esse cenário do fim do século XIX teve um papel na economia nacional.
Com isso, acabei por gostar bastante da leitura e devorar o livro. A escrita da autora é bem gostosa e fluída. Os capítulos são curtos e intercalam as visões de Cecília e de Francisco sobre a história.
Então, se você é um fã do gênero e está procurando uma história bacana pra ler, deixo aqui a dica de Eternamente Cecília. Além de tudo, acho que tem um gostinho ainda mais especial acompanhar esses personagens em solo brasileiro e, quem sabe, aprender um pouco sobre o nosso passado também.
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