isa! 17/10/2023
“I’m not a poet. I’m just a woman.”
Antes de escrever sobre os principais pontos desse livro, preciso comentar sobre a mágica interação entre leitores e autores que a literatura nacional nos proporciona. Comprei esse livro na bienal e tive o grande prazer de conhecer a autora - e até mesmo receber um lindo autógrafo! Cris Valori me contou sobre o quanto gostava da história do seu livro e que a leitura era daquelas de se emocionar. E, puxa, ela estava tãããão certa! Seu livro foi como uma sensação diferente, nunca havia experimentado. Nunca tinha lido um livro que abordasse essa questão da Síndrome de Down e em como o preconceito está enraizado na nossa realidade. Às vezes, apesar de raras, nem pela má intenção, como a situação de Luísa. Mas, ainda sim, temos em vista que o preconceito sobre o assunto gera reações como as de Leonel - algo que é absurdamente triste. Portanto, o livro nos mostra a resistência e o amor incondicional de Felícita pelo seu filho, algo que é de mais belo na história. E a luta pela conquista de uma parte de seu coração, pelo lado de Max. Assim, indico todo mundo a conhecer esse mundinho de Cris Valori, porque sua história é muito original e precisa ser mais reconhecida.
Confesso que não sou a maior fã de livros escritos em terceira pessoa, porque não consigo me conectar verdadeiramente com o personagem principal - mesmo que saiba que a proposta da terceira pessoa seja se conectar com todos os personagens. Mas, apesar de ser narrado em terceira pessoa, Notas de Amor consegue trazer todos os pensamentos e sentimentos dos personagens de uma forma clara- ainda que eu tenha sentido um pouco de falta da pessoalidade. Além disso, a narrativa desse livro não é como a de um romance qualquer, ela é detalhada e muitas vezes poética -- e gosto disso! Mas, ainda sim, senti falta de interação entre os personagens. No livro, existe uma quantidade breve de diálogos, eles são rápidos e muito sérios. E, sabe, talvez tenha sido a proposta da autora - e, poxa, tudo bem! O livro é bom, de qualquer jeito. Estou apenas dizendo minha opinião sobre alguns detalhes irrelevantes para a história.
Felícita é uma personagem muito interessante, daquelas que temos a sede de conhecer além do enredo principal. Desde sempre, a personagem é encantada pela magia da cantoria e com sua bela voz, Felícita deseja mostrar suas músicas ao mundo. Porém, por um deslize jovem, ela tornou-se mãe com apenas 19 anos. E, não é de se espantar quando digo que seu mundo virou de ponta cabeça, não é? No livro, a personagem diz como nunca teve uma boa relação com os pais e, naquela noite, que cantou para um público de verdade, tudo que esperava era que eles aparecessem para prestigiá-la. Mas, isso não aconteceu. E tudo isso é imensamente triste, porque assim como Daisy Jones, Felícita também ansiava por ser vista, ainda que tivesse pais que não a enxergava como deveria. Então, após sua apresentação de sucesso, Felícita se rendeu aos prazeres curiosos de uma noite sem fim, assim conhecendo Max. Um homem que, futuramente, se revelaria muito mais do que apenas uma noitada qualquer. Ao longo do livro, a relação deles se intensifica e a intimidade e abertura para comunicação evolui gradativamente. E, puxa! Isso é tão legal de acompanhar. Perceber que Felicita está se permitindo amar novamente é uma das coisas mais emocionantes do livro.
Ademais, a história também foca no filho de Felícita e na sua condição, Síndrome de Down. Durante as cenas, ela sempre se revelava um tanto quanto preocupada com a possibilidade de qualquer coisa acontecer ao seu pequeno filho. De fora, as pessoas questionavam sobre sua preocupação excessiva e afirmavam que estaria sufocando sua criança. E, é nesse ponto que deixamos nossa crítica de lado e tentamos entender a situação. Não adianta. Eu não sou mãe, sou apenas filha. Eu não entenderia sua preocupação. Desde que vi o filme da Barbie, penso muito sobre a seguinte questão: relacionamento mãe e filho. E, caramba! Eu não consigo tirar da minha cabeça que as nossas mães ficam paradas para que nós consigamos ver o quão longe chegamos. E, sim! Felícita é uma mãe que faz de tudo pelo filho, ela guarda suas lágrimas e se mantém em pé todos os dias para proporcionar algo de melhor para ele. Ela estava parada há anos, abandonou os seus sonhos e seus desejos. Ela se esqueceu de quem era. E tudo isso é tããããõ triste! Entendo que as mães fazem isso por amor - e que, provavelmente, nunca seriam capazes de voltar atrás. -, mas é gigantemente triste pensar que sua mãe também sonhava como você. Que nossa mãe também já teve a nossa idade e que fazia lista de coisas que gostaria de fazer e que, pensando por agora, nunca fez. Porque nós nascemos. E, tudo bem! Não gostaria que isso soasse dramático dessa forma. Mas, ver Felícita abrindo mão de todas as oportunidades é um tópico bastante profundo.
Além da questão da maternidade, esse livro aborda o preconceito estrutural e interno da nossa população em relação à Síndrome de Down. Claro que terei que comentar sobre os comentários e atitudes escrotas de Leonel, mas, para mim, a história de Luísa é muito mais interessante. Sabe, é óbvio que sabemos o quão errado é menosprezar uma pessoa independente de sua situação, porque moramos em um mundo cruel. Antes mesmo de aprender a andar, já escutamos notícias ruins no jornal. Ainda existem pessoas preconceituosas como Leonel que demonstram sua infelicidade através de comentários maldosos - e, enquanto estivermos vivos, continuará existindo pessoas desse jeito. Mas, existem pessoas como Luísa também. Quer dizer, acredito que todo mundo tem um pouco da Luísa dentro de si, já que crescemos rodeados de acontecimentos malucos e nos questionamos sobre as verdades a todo momento. Luísa engravidou de um bebê Down e, no primeiro momento, sentiu-se muito culpada e, ao mesmo tempo, assustada, porque não saberia como cuidar de um filho como esse. Luísa imaginava que seria uma condição devido a sua idade avançada e, por um tempo, questionou-se sobre todas as possibilidades. E, é por isso que digo que o preconceito está gravado em todos nós. Mas, a partir do momento que começamos a nos distanciar das palavras externas, enxergar aquilo por completo e amar o que vê, percebemos que, não, não somos pessoas ruins. Assim como Luísa, devemos aprender que, poxa, não existem diferenças. Somos do mesmo sangue.
Por fim, quero indicar esse livro a todo mundo, porque além da história ser linda, precisamos também apoiar a literatura nacional. Esse é o nosso legado, pessoal. E, Cris! Que história original e emocionante. E, antes de ir, Felícita pode ser uma poeta, uma compositora, uma cantora. Mas, antes disso, ela é uma mulher. Das fortes, hein.