Flavia_Lo 02/04/2024
Uma luta constante contra o esquecimento
Eu me lembro, claramente como foi a repercussão do incêndio da Boate Kiss, todos os veículos de comunicação tradicionais falavam só disso, mas naquele final de janeiro de 2013, mesmo acompanhando diariamente, eu não tinha o mínimo de noção real da gravidade dos acontecimentos, até porque isso logo se tornou notícia antiga e outras pautas ocuparam o seu lugar.
Espaço que não foi ocupado com a mesma facilidade na cidade, uma parte de Santa Maria vive até hoje, mais de 10 anos depois, um luto em constante busca de justiça.
Uma vez ouvi em um podcast, não me lembro quem disse ou onde disse, mas o entrevistado falava sobre o luto, diante de tanta sensibilidade no tema, ele fez um comparativo: quando uma pessoa perde o cônjuge, ela se torna viúva. Se alguém perde os pais, se torna órfão, porém não existe palavra alguma que descreva a ausência de um filho para um pai.
Nesse livro temos os relatos descritivos, de algumas pessoas que estavam presentes de diferentes formas no ocorrido, motorista de ambulância, médicos, pais, amigos, vizinhos, policiais, sobreviventes? Todas as histórias contam com uma narrativa repleta de detalhes, extremamente pessoais, memórias antigas, detalhes tão genuínos que tornam a leitura mais complexa, daquela noite que até hoje não obteve fim.
Uma escrita sensível, que tem como principal objetivo, com os textos extremamente documentais, não permitir que a memória dessas pessoas seja esquecida, de uma forma extremamente respeitosa e que não seja apenas midiática, com foco em vender mais exemplares e lucrar em cima de uma tragédia.
Temos detalhes da pericial, dos laudos médicos, das conclusões policiais, em que pé o processo ocorre, quem foram os acusados e quais as famílias se mantém na ?frente de batalha? em relação ao processo, detalhes do que causou a morte dos jovens e os artigos lançados.
Muitos pais tiveram suas vidas definhadas aos poucos, a tragédia mudou completamente a vida desses familiares, muitos casais se divorciaram, outros perderam o emprego, a depressão e falta de perspectiva de esperança foram muitos. Muito além de 242 falecidos, o incêndio gera vítimas indiretas mesmo depois de alguns anos ocorridos.
Um livro bem curtinho, mas difícil de ser lido, palavras duras, que não fáceis de serem digeridas, geram desconforto, enjoo e mal estar. Essa leitura não é indicada para pessoas sensíveis ou que podem ter esse assunto como algo sensível, que te faça mal.
A todas as pessoas enlutadas, meus mais sinceros sentimentos, essa luta continua, espero que a justiça seja realmente alcançada, mesmo que ela não diminua, de forma nenhuma a dor que vocês sentem, aguardamos pela justiça e que suas memórias não sejam perdidas, que elas não caiam no esquecimento assim como aquelas primeiras matérias televisivas.