Gramatura Alta 06/06/2018
http://www.gettub.com.br/2018/06/lovestar.html
LOVESTAR é um livro que gera confusão pela forma como é apresentado. Seu título e a edição brasileira, com muito rosa e cheia de detalhes fofos, podem levar o leitor a pensar que essa é uma história de amor. Porém, LOVESTAR é, na verdade, uma história futurística com um enredo bem complexo.
Resumidamente, a Love Star mudou drasticamente a vida das pessoas. Agora, as pessoas são como dispositivos sem fio, que se conectam à rede online sem cabos ou aparelhos, fazendo ligações, ouvindo música e vendo vídeos.
O criador dessa corporação, também chamado de Love Star, é um homem cheio de ideias que não desiste enquanto não consegue colocar em prática aquilo que idealiza. Mudando a forma como as pessoas lidam com a morte e com o amor, ele não só cria novas tecnologias, ele também cria uma cultura totalmente nova.
A forma como o livro é narrado é completamente diferente do que estamos acostumados. Em muitos momentos, ele parece um documento histórico, pois narra as mudanças ambientais que foram ocorrendo e que motivaram Love Star a exterminar os fios e aparelhos eletrônicos. Eu senti que estava lendo um documento, realmente, repleto de dados e informações.
Eu gostei demais dessa narrativa mais técnica e impessoal que deu um tom mais realista ao livro. Ela me lembrou muito as distopias clássicas, como 1984, que conseguem imergir o leitor no universo criado e dar maior veracidade à história.
Em outros momentos, quando acompanhamos o casal Indrid e Sigrid, o livro parece uma tragédia shakesperiana, com muito romance e aquele enorme sofrimento ao ter que se afastar da pessoa amada. Em um terceiro momento, quando acompanhamos o próprio Love Star, a narrativa se torna mais sombria e introspectiva. Essas diferentes narrativas trazem uma complexidade ao livro que é muito interessante, além de tornar a leitura mais gostosa, já que não dá tempo de cansar da narrativa.
Ao controlar o amor, a Love Star tira das pessoas a responsabilidade pela escolha do parceiro. Essa premissa, apesar de não ser original, é muito bem trabalhada no livro e quase consegue convencer o leitor de que essa é a melhor opção. Esse é, inclusive, um dos pontos fortes do livro: o autor consegue nos fazer acreditar não apenas nas mudanças, mas nos porquês. A LoveDeath, que é o ramo da Love Star responsável pela morte, é brilhantemente explicada e quase me fez ansiar por algo assim na vida real.
Por outro lado, a iniciativa que nos é apresentada na segunda parte do livro, não me convenceu tanto, apesar de ser interessante, e não me soou tão verosímil quanto as iniciativas ligadas ao amor e à morte.
Quando o livro começa, a história já está próxima do desfecho. Ou seja, a narrativa do livro não é linear. Então, assim que iniciamos a leitura, já temos algumas informações importantes, como, por exemplo, que Love Star morre e que Sigrid é cauculada para outra pessoa que não Indrid. Em seguida, a narrativa vai indo e voltando no tempo, mostrando como chegamos nesse ponto da história, relatando desde os primórdios da Love Star.
Essa narrativa profunda e complexa, infelizmente, não se estende aos personagens. O desenvolvimento de personagens é muito pobre e impede que o leitor consiga se envolver. Por outro lado, pode ser que isso faça sentido na história, já que estão todos tão imersos nessa sociedade estranha e dependente de tecnologia, que é como se suas personalidades nem tivessem a chance de se desenvolver de forma adequada. Mesmo assim, isso me atrapalhou um pouco ao longo da leitura.
Love Star é o personagem mais complexo do livro. Sua genialidade beira a loucura e sua força de vontade beira a obsessão. Ele mesmo diz que as ideias que ele tem são como prisões, que o deixam preso enquanto ele não as liberta. Os estragos que isso causou em sua vida pessoal são permanentes e catastróficos, e estar ciente disso, torna ele uma pessoa triste e amargurada. Essa figura de gênio perturbado é bem interessante.
Tem muitas coisas no livro que, certamente, estão relacionadas ao mundo real, principalmente sobre como as pessoas estão presas às tecnologias. Diferentemente do livro, nós precisamos de cabos e aparelhos para nos conectar, mas isso não impede que estejamos conectados o tempo todo. No livro, temos um investimento em publicidade que beira o absurdo, não muito diferente do que temos em algumas plataformas de música e vídeos atuais.
Toda essa complexidade e esses links com a nossa realidade, sem dúvidas, conseguem tornar esse livro bastante único. Porém, não foi o suficiente para tornar essa leitura 100% positiva. É até difícil explicar o porquê, mas eu terminei a leitura sentindo que faltou alguma coisa, sentindo que a história estava incompleta.
Além da dificuldade em sentir empatia pelos personagens, minha maior ressalva é em relação à trama envolvendo o casal que acompanhamos, que a sinopse dá a entender que é a trama central do livro. Quando eles descobrem que não são um casal ideal calculado pela Love Star, há certas coisas que se esperam. Uma revolta? Uma luta contra o sistema? Uma revolução? É natural esperarmos esse tipo de coisa. Porém, o livro continua seguindo no mesmo ritmo e, ao fim, me fez perguntar: "Era isso? A gente acompanha o casal, torce por eles, e o desfecho é esse? Só isso?".
O sentimento é frustração, porque quando esse dilema é inserido, o leitor pensa: "Agora a coisa vai ficar feia. Agora vai ter treta, confusão e gritaria". Os personagens são tão letárgicos e o mundo em si tão anestesiado, que até eu fiquei meio apática quando terminei o livro. O desfecho foi bem bobo e todos os problemas que o autor propõe são solucionados de forma simples demais.
O final, em si, é um clichê tão grande, que me deixou até com raiva. Toda a premissa, a veracidade, os dados e o excelente desenvolvimento de mundo, somado ao clima tenso, aos problemas inseridos e às expectativas criadas, tudo isso disperdiçado em um final desses. Para quem leu CAIXA DE PÁSSAROS e se frustrou com aquele final, a sensação é mais ou menos essa.
Então, para concluir: sim, eu gostei do livro, o começo me empolgou muito, o universo pensado pelo autor é muito interessante e perturbadoramente real, as tramas são instigantes e a atmosfera sombria é envolvente. Porém, faltou um melhor desenvolvimento dos conflitos e uma conclusão à altura da premissa. Recomendo para quem está buscando uma ficção-científica bem maluca.
Para finalizar, quero mencionar a edição da Editora Morro Branco, que está linda como sempre. O corte das páginas é rosa, a capa é bonita e o livro tem alguns detalhes em rosa que dão um charme a mais. Infelizmente, eu encontrei alguns erros de edição, palavras escritas erradas e vírgulas no lugar errado, essas coisas. Mesmo assim, a edição é bem bonita e, certamente, dá vontade de ter na estante.
site: http://www.gettub.com.br/2018/06/lovestar.html