Steph.Mostav 09/04/2022"Não há reparação possível para Deus nem para os romancistas"É meu primeiro contato com a obra do McEwan e enfim entendi toda a fama que ele tem como escritor. Reparação é muito bem descrito, principalmente nos trechos descritivos: McEwan gosta de destrinchar cada detalhe sensorial que compõe os cenários, os personagens, a atmosfera, para que o leitor sinta, veja e ouça o mesmo que seus personagens. E toda a primeira parte do livro, que toma metade da extensão dele, depende muito dessa proximidade com estes personagens, porque o conflito nasce de interpretações errôneas causadas pela mudança de pontos de vista. O que a protagonista interpreta dos pequenos intervalos de cenas que ela vê são distorcidos por sua imaturidade e visão maniqueísta das coisas. E, o que seria apenas um erro infantil toma proporções muito maiores do que uma criança poderia lidar, apesar de ser a única culpada por esse erro.
As consequências desse erro são exploradas mais adiante, nas partes dois e três do romance. Não só elas, como os horrores da guerra, mais uma vez sob mais de um ponto de vista: o de quem luta (e foge) e o de quem cuida dos que sobreviveram. Uma das forças de "Reparação" está nessa divergência de perspectivas, tanto de pessoas diferentes quanto de uma mesma pessoa conforme ela cresce e percebe que sua concepção de mundo era muito limitada. Outro mérito é a abordagem sobre arrependimento e culpa, sobre a tentativa de se redimir de seus erros mesmo que o perdão nunca seja alcançado, apenas pela vontade de fazer o que é certo.
Porém, para mim, onde o livro brilha mesmo é em sua parte final, no qual vários temas do início são abordados novamente, como se fosse um ciclo (um dos meus temas preferidos na literatura). Além disso, as revelações e reflexões das últimas páginas são emocionantes e belíssimas. Uma leitura incrível.