João Pedro 23/05/2022Sobre buscar a felicidadeLiev Tolstói se tornou um dos meus escritores favoritos desde que li a novela “A morte de Ivan Ilitch”. Ali, eu já soube que a prosa desse autor russo me tocava profundamente. Transmitia-me um senso de justeza tão grande, como se cada palavra estivesse no devido lugar. Sem excessos, sem carências. Nada além de um intenso prazer literário. E desde o início de "Anna Kariênina" eu tive a mesmíssima impressão. Sem tirar nem pôr, o início dessa obra arrebata tanto que merece ser citado: "Todas as famílias felizes se parecem, cada família infeliz é infeliz à sua maneira" (p. 14).
Esse livro me acompanhou por bons cinco meses e posso afirmar que, mesmo tendo intercalado com outras leituras, sempre que o pegava para ler tinha certeza de que logo me conectaria às suas personagens e histórias. Não tem como: Tolstói cria personagens como ninguém. Cheias de humanidade, padecem de vícios, riem, choram, regozijam-se, e, acima de tudo, lutam por sua felicidade. De todas as emoções que tive, essa é a ideia que mais se afixou em mim. Na verdade, só agora enquanto escrevo e reflito é que tenho mais certeza de que "Anna Kariênina" é sobre quão longe podemos ir para obter a sonhada felicidade. Por isso nos identificamos tanto. Ao fim e ao cabo, mesmo errando, ferindo, sangrando, Anna, Vrónski, Liévin, Kitty, Dolly, Oblónski e todos os outros seguiram na direção do que imaginavam ser, para eles, o pote de ouro no fim do arco-íris.
Para ser bem sincero, não acho que seja um livro para qualquer um. Não em termos de ser difícil, nada disso. É que, sim, a obra é extensa, mas não somente em quantidade, ela é vasta em essência, marcando a passagem do tempo pelo compasso das estações. A vida das personagens vai se tornando a nossa vida. Apegamo-nos. E o nosso coração fica completamente rendido às mãos de Tolstói. Sugiro fôlego e uma couraça aos corações sensíveis.
"- Penso - respondeu Anna, brincando com a luva que despira -, penso... se há tantas cabeças quantas são as maneiras de pensar, há de haver tantos tipos de amor quantos são os corações." (p. 146)