Gean 09/03/2024
"Temo somente uma coisa: não ser digno do meu Tormento".
Às vezes muitas vezes eu acho que minha vida não tem sentido. Diante disso, decidi reler este livro, vários anos após.
Pois bem. Os fatos expostos se passam num Campo de Concentração e nosso protagonista é o próprio autor, Victor Frankl, o psiquiatra no Campo de Concentração Nazista. Como um todo, é evidente que a vida dos prisioneiros nesse período foi marcada por condições desumanas as quais dispensam comentários. Contudo, permeia pelo livro uma ideia central da qual se pode privar a pessoa de tudo, menos de uma última liberdade inerente a todos os indivíduos, que seria aquela de assumir uma atitude alternativa frente às condições que nos são dadas, que basicamente pode ser representada pela não aceitação do autor e de outros tantos prisioneiros de se render aquela condição imposta.
Essa observação decorre do fato de que diversos prisioneiros não conseguiam prever um final positivo daquela situação, de forma que não conseguiam obter um motivo, mesmo que provisório, para justificar sua luta para sair do campo, ao tempo em que essa pessoa não mais consegue almejar um futuro e passar a existir voltada para o passado, para os tempos em que era livre e feliz.
Em contrapartida, alguns prisioneiros possuíam a insaciável necessidade de retornar para casa, reencontrar seus familiares e/o terminar algo que deixou inacabado, tal como uma obra de arte ou uma novidade científica que ele sabia que ninguém mais o conseguiria fazer, pois naquele ramo esse indivíduo seria insubstituível. Ante isso, o autor demonstra, por intermédio de Nietzsche, de que ?Quem tem por que viver aguenta quase qualquer como?. Tal situação denota o sofrimento do indivíduo em não conseguir fazer mais nada do que pode e ama por estar encarcerado, mas também evidencia uma noção e um paradigma de que, mesmo diante do sofrimento, este, em última instância, é único e exclusivo em todo o universo, pois ninguém mais conseguiria terminar a pintura, a tese científica ou tampouco aquecer o coração daqueles familiares que sente a falta deste indivíduo, de forma que o sofrimento deste, é único e inteiramente seu, cujo peso reside em o suportar almejando a possibilidade de obter uma vitória única e singular, qual seja, a de sair vivo do Campo e concretizar aquele último desejo que não deixa de perpassar por sua mente nenhuma dia sequer.
Tal conflito acima seria um exemplo entre o conflito existente no que tange a saúde mental dos prisioneiros, a qual, segundo o autor, é baseada num grau de tensão entre aquilo que já se alcançou e aquilo que se deveria alcançar; ou ao hiato entre aquilo que se é e o que se deveria vir a ser. Isto é, representa o sofrimento, a incerteza e o vazio que nos abala diversas vezes quando estamos em uma situação difícil e nada consegue clarear nossa mente, nem mesmo aquilo que seria nomeado como prazer, visto que este, a partir do momento que ele se torna um objetivo em si mesmo ele deixar de ter sentido, uma vez que ele é um efeito colateral ou um produto secundário. Eu particularmente noto isso quando estou triste e tento por várias maneiras assistir um filme ou uma série ou jogar videogame para imediatamente me sentir bem e feliz, fato que muitas vezes não surte efeito, acredito pelo fato de eu buscar fugir da dor e do sofrimento, negando-os e fingindo que não são reais e que o sentido da vida é ser feliz, o que não é sem sentido. Contudo, se o sentido da vida é ser feliz, o sofrimento também tem um sentido, um porquê, e reconhecendo essa circunstância seria possível o aceitar e deixar de fugir e negá-lo, ao tempo que a melhor solução seria tratar o significado por trás dele para que seja possível sentir-me bem ou feliz com um filme ou um jogo que gosto, passando essas ações a ter um efeito secundário.
Outro ponto a se citar é que esta época dá a entender que não vivemos o suficiente, que nossas vidas passam por nossos dedos como se fossem areia e não a aproveitamos porque estamos presos demais ao trabalho, a faculdade e a necessidade de ser alguém na vida, o que nos afasta do lembrete de que esta vida pode ser a única possível; ou a teoria de que esta vida poderia ser a 2ª oportunidade que nos foi dada para viver pela segunda vez aquilo como se fosse a primeira vez e como se na primeira oportunidade tivéssemos agido tão errado e negligente que nossa vida tivesse sido jogada no ralo, junto com nossos sonhos.
Diante do exposto, uma citação me chamou a atenção, de autoria de Dostoievsky, o qual afirmou que: ?Temo somente uma coisa: não ser digno do meu Tormento?. A esta frase eu imponho grande significado e acredito que, diante de tudo o que foi relatado e de toda a dor ou sofrimento que a vida possa vir a se apresentar, o pior que pode vir acontecer é imaginar que todas as circunstâncias mencionadas são apenas tragédias sem sentido ou porquê, o que, em última instância resultaria na máxima de que nossas vidas foram perdidas em prol do vácuo existencial. E nesse momento eu penso e imagino o Livro de Albert Camus intitulado O Mito de Sísifo e imagino que, redundantemente, que seria preciso imaginar que Sísifo estaria feliz em empurrar uma rocha ao topo de uma montanha só para a ver rolar no dia seguinte e repetir isso por toda sua eternidade.
Por fim, anotei 03 caminhos apontados pela Logoterapia pelas quais se podem chegar ao sentido da vida, vejamos:
1) O primeiro consistiria no sentido que poderia ser alcançado através do trabalho;
2) O Segundo estaria em experimentar algo ou encontrar alguém, o qual o autor cita o amor. A este eu aponto como algo que realmente concede sentido a vida e que transcende a mera existência humana, desde que o amor seja correspondido;
3) E o mais importante, para o autor, seria a hipótese do campo de concentração, isto é, mesmo com o indivíduo sendo uma vítima sem recursos e numa situação sem esperança, enfrentando um destino que não pode mudar, ele pode erguer-se acima e além de si mesmo, mudando-se e transformando a tragédia pessoal em um triunfo, resignando o sofrimento e encontrando um porquê, qualquer que seja, que o permita passar por quase qualquer como e a partir dele viver em seu sentido mais amplo.