gizaqueo 27/02/2023When was the first time you knew to be afraid? Galaxy “Alex” Stern recebeu uma segunda chance: estudar em uma das universidades de maior prestígio do mundo com bolsa integral. Ela é a caloura mais improvável em uma instituição de elite como Yale. Por que ela?
Veterano e membro da Casa Lethe, Darlington é um cavalheiro rico, leal às tradições e culto nos estudos das sociedades secretas. Agora, Daniel se vê obrigado a mentorar Alex. Por que ele?
Ninth House é um romance “dark academia” com elementos fantásticos, sobrenaturais e uma pitada de horror. Ambientada em New Haven, nos Estados Unidos, o leitor é imerso em um mundo acadêmico cheio de mistérios, além de discutir questões sociais e de privilégio.
A escrita de Leigh Bardugo em Ninth House é rica em detalhes e nos permite entrar de cabeça nesse universo. Sua descrição da cidade e de Yale é envolvente e ambienta o leitor no mistério, instigando a curiosidade e alimentando as teorias. Uma das primeiras cenas já é bem impactante e cria uma tensão que nos deixa o livro todo ansiosos. Criamos suspeitas, especulamos motivos, desconfiamos dos personagens, mas ainda assim, nossa única certeza é de que não temos todas as respostas. E a partir do momento que somos introduzidos à Nona Casa, o sentimento de que há fantasmas à espreita não nos deixa.
“Darlington liked to say that dealing with ghosts was like riding the subway: Do not make eye contact. Do not smile. Do not engage. Otherwise, you never know what might follow you home.”
Caso você tenha receio com livros mais descritivos, não precisa se preocupar, a escrita é bem dinâmica e isso se dá principalmente pelo fator passado-presente que Bardugo estabelece. Também temos dois narradores, alternando os pontos de vista e nos permitindo entender melhor a situação. Ao mesmo tempo que nossa visão é ampliada e algumas perguntas são respondidas, a autora não permite que o tédio domine a história, gerando mais dúvidas com frequência, porém sem deixar a narrativa confusa.
Creio que para aproveitar melhor essa leitura é essencial balancear as expectativas e ler no momento certo, assim como qualquer outro livro. Eu criei uma expectativa muito alta para Ninth House, esperava ficar presa e não conseguir desgrudar, mas ele foi mais arrastado do que eu esperava. Estava ciente do estilo da escrita, sabia que deveria esperar algo mais lento e descritivo, mas, como eu disse, essa parte me agradou, achei a escrita muito encantadora e fluida. O que me deixou meio empacada foi ter demorado tanto para criar uma conexão com os personagens. Sentia que tinha lido o dobro de páginas e não fazia sentido ainda não ter criado um vínculo com aquelas pessoas diante de tantos acontecimentos.
“Her map had been changed. Her coastline altered. Mors irrumat omnia. Death fucks us all.”
Alex é uma personagem com um desenvolvimento incrível. Não é uma pessoa fácil e agradável, passou por muitos problemas, mas sabe dominar a situação, sabe controlar e até manipular as pessoas quando necessário, não é perfeita e nem tenta ser. Ao mesmo tempo, não tem aquela arrogância que personagens assim costumam ter, como se fosse única, a mais diferente e especial de todas. Por mais que eu tenha gostado dela de início, ainda estava receosa porque custei a me sentir conectada. Contudo essa conexão veio, foi se fortalecendo até o final do livro e tenho uma grande expectativa em relação a ela para a continuação da série.
“He was a boy on an adventure, not a boy swallowing poison.”
Com o Darlington não foi muito diferente. Eu me afeiçoei a ele (e me apaixonei) desde o início, tenho que confessar. A narrativa dele foi a minha preferida, justamente por ter criado uma conexão maior e mais rápida que com a Alex. Ao mesmo tempo não sofri com o que deveria ter sofrido, porque eu não aceitava as desgraças que ele vivia. Enquanto com a Galaxy tudo parecia mais real, mais cruel – talvez por serem sofrimentos mais tangíveis e por, como mulher, conseguir me imaginar no lugar dela –, com o Daniel eu estava em estado de negação, me recusando a acreditar pelo que ele passou e esperando as soluções mágicas que costumam ter em livros. Isso acabou atrapalhando a minha ligação com ele ao decorrer da história, mas agora, refletindo e me lembrando de momentos com ele, digamos que estou passando pelo sofrimento atrasado.
“…he’d read enough stories to know you never looked back on your way out of hell.”
Como eu disse, já estava enfrentando algumas dificuldades para me conectar com os protagonistas e não foi diferente com os personagens secundários. Sinceramente, me recordo de 1/3 deles e eu esperava ficar muito instigada com os membros das Casas e as sociedades em si, mas não lembro o nome da maioria das Casas e só sei melhor sobre duas, talvez. Isso foi uma quebra de expectativa para mim, o livro se chama “Nona Casa”, nós conhecemos o sistema dessas sociedades secretas e ficamos curiosos com ele, porém – apesar das descrições incríveis e da magia presente na história – não senti que as outras Casas se tornaram personagens, como acontece com Lethe, que é quase uma protagonista.
Entretanto não é de todo ruim, aquele um terço de personagens memoráveis realmente se destacam. A princípio temos o mistério sobre Hellie e Len, que nos deixa curiosos sobre o que aconteceu, quais foram os papéis dessas pessoas para Alex chegar na situação atual e ambos não me decepcionaram. Durante a narrativa do passado da protagonista consegui desenvolver sentimentos por eles, ao contrário da indiferença que tive com outros personagens secundários.
Também temos a Dawes, uma personagem que, a princípio, não se destaca, mas vai nos encantando ao longo do livro. Talvez tenha sido culpa da narradora (li acompanhando com o audiobook), porém, para mim, Pamela foi a maior surpresa, não por mudança de personalidade nem desenvolvimento, apenas por como a participação dela vai aumentando gradualmente de uma forma bem cativante. O meu relacionamento preferido do livro foi o dela com a Alex, porque foi muito bem construído, assim como a nossa própria conexão com ela. Da mesma forma gostei muito da relação dela com o Darlington, porque, por mais que não seja tão desenvolvida, são evidentes o carinho e a admiração dela pelo protagonista, então, mais uma vez, nos enxergamos no lugar dela.
Além desses, temos as colegas de quarto da Galaxy. Infelizmente para mim elas pareceram deslocadas a maior parte do livro, porque além do fator convivência, a autora não dá mais motivos para a protagonista ter um vínculo tão forte com elas até acontecer algo extremo. Por outro lado, temos Turner e North, The Bridegroom, personagens de apoio que tem uma relação lógica com a protagonista e nos trazem diversos sentimentos, desde divertimento até medo, passando por um pouco de indignação, admiração e até compaixão.
“That was what magic did. It revealed the heart of who you’d been before life took away your belief in the possible. It gave back the world all lonely children longed for. That was what Lethe had done for him. Maybe it could do that for Alex as well.”
Sobre romance: caso tenha sido a intenção da autora criar uma relação amorosa entre a Alex e o Darlington em Ninth House, Bardugo falhou em um primeiro momento. Há indícios de sentimentos, porém não há evidências de um relacionamento e isso gera uma confusão, porque a história nos leva a procurar essas provas de que eles viveram algo além da amizade. A narrativa alternada deixa a entender que em algum momento vai ter um cruzamento e o romance vai acontecer, mas ficamos apenas na espera para o próximo livro.
“And maybe he wanted her to be the kind of girl who dressed as Queen Mab, who loved words and had stars in her blood.”
A autora também não nos poupa da dor, abordando temas extremamente pesados como (alerta para os gatilhos): estupro de menor, uso de drogas, assassinato, abuso sexual, violência explícita, entre outros. Eu senti que um desses assuntos poderia ser tratado com mais cuidado, houve uma falta de lógica em como se resolve a questão de vício para a protagonista, que passou anos usando drogas e na sua narrativa no presente, não parece enfrentar quaisquer problemas de abstinência, mesmo estando em um ambiente no qual o uso de alucinógenos e outros entorpecentes é comum. Além disso, para mim, pareceu que outro tema foi mal inserido, como um ato desesperado para gerar ligação com uma personagem. Você sente dor e empatia por ela, mas, ao mesmo tempo, fica confuso, porque não tinha motivos suficientes para se importar com aquela personagem, não havia conexão.
“Mal tormento que soplo. He was a bad wind that blew through.”
Todavia não é somente do choque com coisas pesadas que a autora se sustenta. Desde o começo do livro, Bardugo cria situações que nos deixam extremamente curiosos, porém, com tantos acontecimentos, acabamos esquecendo no decorrer do livro. Por mais que nos esforcemos para não sermos pegos de surpresa (o que eu particularmente não gosto, mas não consigo evitar), a autora consegue construir mistérios que são bem resolvidos no tempo certo e também é certeira com as perguntas que deixa para serem respondidas na sequência, inclusive o gancho para o segundo livro no último capítulo.
“But the real question, the right question, was: When was the first time you knew to be afraid?”