Ivandro Menezes 14/06/2019
Notícias de um Brasil profundo
O romance de estreia de Rosana Vinguenbah é ambientado em um garimpo mineiro e reúne uma coleção de acontecimentos que transcorrem no lugar, tudo em torno de Sr. Leôncio e sua família.
A dureza da lida no garimpo, os personagens que brotam dele tal qual cascalho são incluídos em conversas no bar de Manolo, nas desavenças, alegrias, pertenças e peripécias dos miúdos. É tudo facilmente reconhecível por quem vive ou viveu em cidades interioranas. Nisso, adquire um tom estranhamente universal.
Em certos aspectos, lembrou-me Vasto Mundo, de Maria Valéria Rezende, cuja unidade enquanto romance não provém de um enredo centrado em pessoas, mas voltado ao lugar. E essa é a maior riqueza do romance.
As personagens são críveis, poderíamos esbarrar nelas por aí muito facilmente e imaginar suas vestes, trejeitos e sotaques. Porém, senti um certo descompasso entre o modo como se colocou os diálogos, por vezes, corretos demais para pessoas tão simples. Senti falta de certa oralidade, que ouvimos por inseri-los naquele lugar, mas não lemos no texto.
Há pequenos vícios na escrita que me incomodaram, como a constante necessidade de dizer quem fala e o que diz, deixando em alguns bons diálogos pouco espaço para o leitor preencher as emoções e reações.
Porém, não se engane, Rosana mostrou-se uma autora consciente de suas escolhas na narrativa, nunca há a sensação de não saber para onde ir e, de forma muito eficaz, constrói um universo bem particular, com matéria-prima para outros romances. Poderia explorar a vida do Sr. Leôncio, marcada desde a infância pelo garimpo; ou do negro Tito, cercado de tantos mistérios quanto de bondade e candura, sem mencionar seu legado a Valentin; quem sabe, dos antipáticos ciganos ou do argentino Manolo.
A sensação que fica é de começo - de uma escritora que tem ainda muito por produzir (e vejo nela essa sede e empenho), e de uma saga fantástica a esse Brasil profundo e esquecido.
Vida longa, Rosana, vida longa!