Nathalie.Murcia 07/06/2019
Um romance filosófico multifacetado
Um belíssimo romance filosófico, que vai muito além de uma história bonitinha da relação de um cão e uma mulher. A protagonista, uma escritora e professora universitária, após o suicídio do melhor amigo, narra, em forma de diário (como se estivesse conversando com o próprio), reminiscências e pensamentos evocados a respeito de variados temas, tais como, amor, velhice, morte, literatura e a arte de escrever, atividade à qual o amigo também se dedicava. Ela não contava, entretanto, com o legado que o falecido lhe reservara: um gigante e dócil dogue alemão de nome Apolo, também enlutado pela perda. Para piorar a situação, no apartamento na qual ela residia, não eram permitidos animais, o que lhe rendeu uma notificação de despejo, problema que demandava uma solução urgente. Contrariando todos os conselhos, desfazer-se de Apolo estava fora de cogitação.
Esse livro me tocou profundamente, pois, além de ter aliado temáticas que aprecio muito, me levou a digressões importantes a respeito das questões abordadas. A prosa da autora é de um brilhantismo ímpar. A conexão humano-canina estabelecida (ela até tentou evitar o antropomorfismo, sem sucesso), e a semiótica do cão (representando uma parte do falecido), é comovente. O final não é nada clichê.
As referências durante toda a narrativa, de escritores como Rilke, Virginia Woolf, Kundera, Nobokov, entre outros, e a alusão ao personagem Davi Lure, de Desonra (esse personagem é uma espécie de espelho do amigo), tornaram a trama ainda mais instigante. Seguem dois excertos que me marcaram:
"Idílicas é como Kundera descreve as relações humanas com os animais. Idílicas porque os animais não foram expulsos conosco do paraíso. Lá eles permanecem, não perturbados por complicações como a separação do corpo e da alma, e é através do nosso amor e amizade que somos capazes de nós reconectar com o Paraíso, ainda que por um fio". " Mais uma vez me deparo com a famosa definição de amor de Rilke: duas solidões que se protegem, se complementam, se limitam e se inclinam para a outra"."O que somos, Apolo e eu, se não duas solidões que se protegem, se complementam e se inclinam uma para a outra?".
Sem dúvidas, uma das minhas melhores leituras deste ano, e indico sem pestanejar. Espero que sejam publicados outros livros da autora.
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