Keila 23/11/2022
Samba, autoconhecimento e amizade
Iniciei a leitura imaginando algo totalmente diferente do que o livro entregou.
Achei que retrataria somente uma amizade nascida nos engenhos de açúcar no nordeste dos anos 30, entre a ?patroinha? e a ?criada?, mas o livro entregou muito mais do que isso!
A amizade inesperada entre das Dores, mais conhecida no engenho como Jega, e Graça, a filha do senhor do engenho, é permeada por música desse a infância, por influência da mãe de Graça. As meninas crescem mirando na independência e no dia que sairão daquele local e se apresentarão na rádio Mairynke.
Quando fogem do colégio de freiras e se deparam com uma Lapa diversa e cheia de segredos e nuances, percebem que a vida não é tão fácil mas em nenhum momento desistem de seus sonhos. Até que o destino as direciona para Madame Lúcifer, que as introduz nos bares e cassinos boêmios da Lapa e suas vidas começam a mudar e ganhar relevância.
Mas quem se destaca na frente do público é Graça, e ao conhecer Vinicius, das Dores percebe que seu verdadeiro dom é na composição, mesmo que deixar Graça brilhar doa. E aí começa a grande história de Sofia Salvador (Graça) e a amizade fiel mas cheia de altos e baixos entre as duas.
Por vezes queremos amar Sofia Salvador e por outras, a desprezamos. Das Dores é tão fiel que chega a ser deprimente, mas o que a autora criou é vivo e tão real que apesar de ficção, sabemos que esses sentimentos e relacionamentos existem!
Toda história é contada pelas memórias de Das Dores e passeamos por Pernambuco e os engenhos de açúcar, pela Lapa, por um Brasil governado por Getúlio Vargas, por Hollywood, por uma guerra mundial e vemos claramente em Sofia Salvador uma Carmem Miranda, pra mim é nítido o quanto a personagem foi inspirada nessa figura fortíssima.
Vivenciamos encontros e desencontros, os encantos e desencantos do sucesso, os bastidores e rodas de samba da Lapa, o nascimento de ritmos que hoje são tão nossos, vícios, o despertar da sexualidade e do autoconhecimento, mesmo em meio a tanta descriminação.
Vemos o nascer e o morrer de uma estrela.