Djeison.Hoerlle 11/04/2022
Eu hesitei um pouco em escrever sobre este quadrinho. Na verdade, não especificamente sobre este, mas sobre qualquer um que aborde a temática serial killer. Isso porque o fascínio que nossa sociedade tem por este tema muito me incomoda e até me choca um pouco. Volta e meia me pego refletindo sobre os motivos que nos levam a incursões de horas diante de documentários da Netflix, reportagens de TV, livros e artigos acadêmicos sobre o tema. Arrisco dizer que a definição que mais me atrai é a de Miriam Elza Gorender em seu artigo “Serial Killer: o novo herói da pós-modernidade”, na qual, por meio de uma analogia a Hannibal Lecter, traz a provocação “Se Deus é o maior dos assassinos, por que não pode o homem também matar?”. Uma fantasia de poder em seu estado cristalino.
Inclusive o título deste artigo se faz especialmente apropriado quando levamos em conta que Landru, o protagonista da vez, viveu justamente o advento da modernidade e de conceitos como a morte de Deus, segundo o filósofo alemão Nietzsche, que pareceram desafiar os homens ególatras até os limites do que pode ser considerado a falta de humanidade, temática inclusive abordada em Crime e Castigo, de Dostoievski.
Mas deixando para lá esse blábláblá de acadêmico charlatão e voltando-me para onde um dia eu menti para meus seguidores que focaria - os quadrinhos - preciso dizer: Chabouté conseguiu de novo.
O autor é um mestre do contraste entre nanquim e papel. Juntamente com o estilo narrativo lento e os planos-detalhe extremamente expressivos, organiza-se um pequeno conjunto de assinaturas que fazem da sua obra uma das mais charmosas que temos acesso hoje no mercado.
O ponto, porém, é que já vimos sua roupagem em álbuns mais reflexivos e por que não, acalentadores, mas em uma história digna de um thriller, é a primeira vez.
E o efeito deste singelo encontro me foi especialmente agradável na obra em questão, que parece unir o útil ao agradável, não somente criando atmosfera, mas também aumentando nosso nível de imersão.
Há ainda um detalhe interessante quanto ao roteiro, que se propõe a fazer uma releitura com ares conspiratórios da história de Landru. Somando isso à sábia decisão de não trazer violência explícita, temos um prato cheio para os amantes de quadrinhos de valor histórico-biográfico.
Cabe também, por fim, um comentário sobre a posição do quadrinho no mercado hoje: ele ainda possui estoque na Amazon, entretanto temos observado um esgotamento crescente dos materiais de Chabouté, portanto eu não será surpresa caso ele suma nos próximos seis meses. Eu não perderia tempo.