Rabo de pipa

Rabo de pipa Maitê Rosa Alegretti


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Rabo de pipa





Em seu segundo livro, Maitê Alegretti nos conduz por um percurso. Dificilmente os leitores não associariam esse movimento aos tempos recentes pelos quais passamos e às dificuldades que encontramos para retomar nossos caminhos cotidianos. De início, a obra em questão já nos introduz que, após essas vivências, nada mais seria como antes, pois “eu precisava aprender/ que a mesma rua/ já não guardava as pessoas de antes/ e a cidade se deslocava todos os dias/ centímetros abaixo de nós”.


Há, dessa forma, evidente melancolia nesse movimento de regresso ao mundo exterior, que exige, inclusive, uma preparação. Afinal, depois da clausura, “ter espaço/ de sobra/ dentro dos pulmões/ parece tarefa/ desmedida”. Apesar de o mundo continuar se movimentando abaixo de nossos pés, a percepção do tempo, a partir do contexto posto e imposto, altera-se. Assim, “o tempo parece não existir” e é necessário um esforço para a realização da possibilidade que se dispõe aos sujeitos: “apenas os movimentos/ circundantes”. A dimensão temporal, desprovida de parâmetros anteriores, impõe o ritmo do corpo, mais lento, aos poucos acontecimentos. Por isso, o dia, com todas as suas horas, precisa ser distendido para contemplar cada músculo de carne.



Todavia, ao direcionar o olhar ao que é possível ver, surgem as varandas. Na obra, os detalhes que se mostram por meio dessas aberturas são os recortes do mundo e o pedaço reduzido do outro a que os sujeitos podem ter acesso. Tal percepção culmina em versos que podem ser associados a outra questão: “na minha versão/ dentro de nós/ era tudo claro e/ luminoso”. Esse tipo de construção evidencia a dinâmica que se estabelece entre interior e exterior no que se refere a outros sujeitos.



Além disso, elaborar esse retorno, a nível da própria linguagem, também é um desafio. Desse modo, parte dos poemas e da prosa poética aventura-se por idiomas estrangeiros, como o italiano, língua estudada por Maitê Alegretti ao longo de sua formação acadêmica. Lado a lado, páginas em diferentes idiomas mostram distintos caminhos para a mesma questão, a busca pelo retorno perdido e a retomada do que não mais se verifica igual.


Entretanto, há um momento singular do livro que faz o sujeito e os leitores buscarem os céus, a despeito da clausura: o aparecimento das pipas e do vento, “como se/ antes não/tivesse sido/ detido”, que se espraia e leva esses recortes coloridos pelo dia de cor azul irretocável. A vida parece se anunciar novamente, apesar de um carnaval triste, o qual não apaga o passado, ao mesmo tempo em que a separação deve se converter no indivisível. Por fim,o último poema demonstra um novo parâmetro, o qual deve reger esse mundo por vir, por se criar e se recriar em nossas mãos, para que possamos, enfim, amarrar a vida às costas e desejá-la como nossa. A despeito da melancolia e das constatações de que nada permanece igual, há, ao final, uma esperança em relação ao porvir.

Luana Claro

Poemas, poesias

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