Magno Loyola 20/08/2021
Como Sobreviver a Esse Livro
O início da história me pareceu promissor mesmo que eu já suspeitasse de um desenvolvimento anêmico dada a quantidade de páginas, porém, tive a confirmação de minhas suspeitas conforme lia os curtíssimos capítulos, é notável como são pouco desenvolvidos seus personagens e arcos narrativos, mal discorre-se um ocorrido e o autor já corre para contar o próximo, o livro visivelmente tem foco num público jovem e acostumado com o dinamismo e velocidade das redes sociais, cada capítulo tem conteúdo e duração dignos de um storie.
Há também certos erros gramaticais, utilizando-se palavras em contextos nas quais elas não se encaixam, por exemplo, quando o autor se refere à "conjectura atual" da cidade onde se passa a história como se 'conjectura' significasse "estado, condição" quando, na verdade, significa "adivinhação, dedução", e uma enorme quantidade de referências à cultura pop estadunidense apesar de a história ser ~supostamente~ nacional.
A influência da cultura estrangeira se dá não só nas obras citadas pelo protagonista, mas nos nomes dos personagens (que não soam comuns como nomes, ou até apelidos, brasileiros... JP, Ed, Lola), nos nomes dos capítulos cujo alguns contém referências a obras como American Horror Story e Forrest Gump e na narrativa em si, a história é completamente derivativa de filmes de zumbi estadunidenses, não há nada idiossincraticamente brasileiro, se o livro fosse em francês e se passasse em alguma cidade pequena de Paris, não faria diferença alguma.
Voltando ao desenvolvimento dos personagens, é notável que para alguns personagens foi decidido como relevante descrever a cor de pele, como os de pele morena e negra, enquanto para outros tal característica foi deixada em aberto para que subentendêssemos que estes são brancos (ainda mais considerando a capa do livro), como se pele branca não fosse uma característica de distinção assim como outros tons de pele. A questão intrigou-me ainda mais considerando que Victor, o único descrito como negro, algo trazido à tona duas vezes na história (outros personagens ou só tem a cor da pele citada uma vez ou não tem esta descrita), possui um comportamento sadístico, violento e hostil (principalmente em relação ao protagonista, Ed, este branco) sem maiores explicações narrativas para tal comportamento. Além de (view spoiler), ser negro e hostil são as únicas características que o personagem possui, é como ler um livro escrito no início do século XX onde teorias racistas que pregavam supremacia branca reforçavam que povos não europeus eram extremamente violentos, hostis e irracionais, e por isso eram inferiores aos europeus e deveriam ser subjugados, estereótipos que vivem até hoje na mídia, embora de maneira menos explícita. Não haveria problemas em ter um vilão negro desde que o antagonismo e vilania fossem justificados por ocorridos na história e o personagem não fosse resumido ser negro e hostil ao protagonista branco, no formato atual, parece-me mais como um reforçamento de estereótipos seculares e racistas.