Thiago662 19/09/2021
Não, não somos livres!
É um livro melancólico e, talvez, um dos melhores escritos por George Orwell. Portanto, não é um livro para qualquer leitor. Não tem ação, é pura reflexão. Não há um "Grande Irmão" que a tudo vê (1984) ou um tirano ditador porco (Napoleão, A Revolução dos Bichos). É uma obra sobre um homem comum, de meia idade, gordo, fatigado com suas obrigações.
Orwell nos diz que não há liberdade e não é preciso viver sob uma distopia para não ser livre. Basta viver sob o signo do capitalismo, da exploração do homem pelo homem. A vida comum nos acorrenta a todos, mas poucos se dão conta disso. Um pouco de ar, por favor! é sobre um homem que cresce no final da era eduardiana, onde o progresso assumiu sua expressão máxima, e representa o lento declínio da paz conquistada após as guerras napoleônicas. George Bowling lutou na Primeira Guerra e seu máximo temor é o prenúncio da nova guerra que se aproxima.
George assim se descreve: "um homem gordo de 45 anos, com traje cinza de arenque, um pouco pior para desgastar e um chapéu-coco. Esposa, dois filhos e uma casa nos subúrbios escritos em cima de mim. Rosto vermelho e olhos azuis". A história começa quando ele busca a sua nova dentadura. A leitura de um nome no jornal, o leva a recordar o passado. O melhor momento de sua vida. A partir daí é paulada em cima de paulada.
"É engraçado como as coisas afundam em você aos poucos".
Ou:
"Aonde quer que estejamos indo, estamos indo para baixo".
O pessimismo de quem viu a merda acontecer. Uma guerra que duraria meses e durou quatro anos. Uma crise mundial e o anúncio de uma guerra ainda pior.
O pequeno comerciante que é dominado pelas grandes comparações; o homem que não pode fazer aquilo que gosta, por falta de tempo ou dinheiro; o medo constante de perder o emprego ou não conseguir pagar uma casa, que nunca será completamente sua; o envelhecimento e a reflexão sobre o corpo; as agruras do casamento; o temor de uma guerra e, mais ainda, o pós-guerra com a fome, sistemas opressivos e todo o resto...
"Como já disse várias vezes, não tenho medo da Guerra, apenas do pós-guerra. E mesmo isso, é provável, não me afetará pessoalmente. Por que quem se importaria com um sujeito como eu? Sou muito gordo para ser um suspeito político. Ninguém iria me golpear ou me bater com um cassetete de borracha".
Uma das resenhas daqui reclama do tesão pela pescaria que George tem, várias páginas são sobre isso, mas é mais que isso. São as coisas que abandonamos no caminho sem perceber. As coisas que gostamos, mas deixamos de fazer.
Era preciso ar... mas estaria esse respiro no passado? Não. Tudo muda. Passado e futuro pouco importam. Viva o presente e já será muito.