Flávia Menezes 15/09/2021
AS LÁGRIMAS QUE CURAM SÃO TAMBÉM AS QUE ESCALDAM E CASTIGAM?
?O Iluminado? é o terceiro livro publicado de Stephen King, e no ano de sua publicação, foram excluídos o prólogo e o epílogo, onde King descreveu toda a história do Hotel Overlook, detalhando sobre os primórdios de sua construção, passando sobre todas as tragédias e crimes acontecidos, bem como conta um pouco sobre a relação complexa de Jack Torrance e seu pai. Felizmente a versão que eu li, continha esse material extra, renomeado para ?Antes do Ato? e ?Depois do Ato?. Um material riquíssimo, e que vale muito a pena ser lido.
Desde as primeiras páginas, ?O Iluminado? me encantou completamente, e vou ousar aqui em dizer que, para mim, essa é a maior obra-prima do King, talvez perdendo apenas para ?IT? (muito embora não seja essa a opinião do próprio King).
Além de ter uma narrativa muito poética, a riqueza de detalhes dessa história, e como as cenas vão se interpondo e se complementando é assustadora, e muito fascinante. Meu fascínio foi tão grande, que confesso que não queria terminar logo essa história. Na verdade, não queria que ela acabasse nunca.
As partes adicionais sobre o Hotel Overlook, me deixaram ainda mais extasiada com a riqueza de detalhes que esse autor consegue desenvolver, e com uma narrativa que não é só descritiva (algo que deixa a história sempre cansativa), mas que ao contrário, nos seduz pelos sentidos, ou seja, nos emociona e nos envolve de uma forma muito natural.
A sensação é de que King nos conta uma história real, com aqueles detalhes que só existem na vida real. E essa é a mágica do King: de como ele, enquanto escritor, consegue descrever suas histórias com uma minúcia de detalhes, criando uma vida fictícia como se fosse real, visualizando passado, presente e futuro como se estivesse vendo um filme que se passa diante dos olhos dele, e vai passando para a ponta da caneta.
?O Iluminado? é uma história que vale muito a pena ser lida, não apenas pelo brilhantismo com a qual foi escrita, mas pela verdade dos personagens, suas dores e seus amores. E aqui eu preciso dizer que Jack Torrance foi o meu personagem predileto. E esse não é um personagem fácil para se colocar em um lugar desses, já que suas características mais marcantes envolvem alcoolismo e agressividade, que muitas vezes resulta em violência física.
Mas, a forma como o King o desenvolveu é bastante instigante, porque além de toda a fachada, você é pego(a) pela verdade do personagem. Pelas suas falhas, suas cicatrizes. Ou seja, pela forma mais humana que um personagem ficcional poderia ter. E eu confesso que do começo ao fim, eu torcia por ele. Acho que até mais do que Wendy e Danny, eu tinha fé em Jack.
Mas claro, falando em personagens virtuosos, King não os deixou de fora aqui, e eles foram muito bem representados especialmente por Wendy Torrance e por Richard Hallorann, que faz um discurso final bem verdadeiro e muito emocionante. Quanto a Danny, ele é um garotinho, e foi bem representado como tal, com a inclusão de como King gosta de mostrar o quanto as crianças são mais ousadas, e consequentemente mais corajosas do que os adultos.
E eu acho esse pensamento que se repete em muitos de seus livros, algo que nos faz pensar no quanto ser criança é acreditar no mágico, no fantasioso, e de que amanhã tudo poderá ser melhor. Algo que deveríamos sempre nos recordar, e trazer essa essência de volta à tona nos nossos dias de pessoas crescidas, não importando quanto anos tenhamos.
Antes de concluir minha estadia e fazer o meu checkout no Hotel Overlook, quero aproveitar para finalizar com essa frase perfeita que Hallorann diz para Danny, e que serve para mim, e para você também:
?O mundo é um lugar duro, Danny. Não se importa com a gente. Não odeia você nem a mim, mas também não morre de amor por nós. Coisas terríveis acontecem no mundo, e são coisas que ninguém pode explicar. Indivíduos bons morrem de forma ruim e dolorosa, e deixam as pessoas que os amam sozinhas. Às vezes, parece que só as pessoas ruins permanecem sadias e prósperas. O mundo não ama você, mas sua mãe o ama e eu também. Você é um bom menino. (...) Mas veja, você deve continuar vivendo. É sua obrigação, neste mundo duro, manter vivo o seu amor, e seguir adiante, não importando como. Segure as pontas e vá em frente!?