Fabiane Ribeiro 16/07/2013
Resenha - O sonho de Eva
“Se vamos solidificar sonhos, pode contar comigo”
A literatura nacional vive uma ótima fase, com excelentes autores nos presenteando com textos criativos, ágeis e que serão apreciados por muito, difundindo assim nossas próprias ideias e nossa cultura. É o caso de O sonho de Eva, do autor mineiro Chico Anes.
A Dra. Eva Abelar dedica sua carreira a pesquisar os sonhos lúcidos, nos quais vivenciamos as sensações, como se estivéssemos acordados, de fato vivendo aquele sonho.
Ela está em um congresso em Viena, quando recebe a notícia de que duas grandes tragédias aconteceram com sua família no Brasil. Sua irmã, Anna, se suicidou, e seu filho, Joachim, que estava sob os cuidados de Anna, está desaparecido.
Tudo aquilo, além de triste, é estranho, pois Eva não consegue acreditar que a irmã seria capaz de tirar a própria vida. Além disso, o pequeno Joachim é uma criança autista, requer cuidados diferenciados, e tem algumas habilidades especiais.
Anna trabalhava na Yume, empresa de alta tecnologia, no desenvolvimento de um jogo que, utilizando-se dos sonhos dos jogadores, seria incrivelmente real e uma inovação, capaz de mudar o mundo e até alguns conceitos, como o livre-arbítrio.
“A terceira guerra mundial será a batalha pelo inconsciente coletivo, a guerra eletrônica, que terá como campos de combate os sonhos de todos” (Pág. 170).
Após a trágica morte da irmã, Eva é convidada a trabalhar na Yume, para ajudar na fase final das pesquisas que levarão o jogo ao mercado. Apesar de hesitar a princípio, os sonhos e os instintos de Eva dizem que a Yume pode ter as respostas não apenas sobre a morte de Anna, mas também sobre o paradeiro de Joachim.
Assim, ela parte para a China, determinada a obter respostas e a recuperar o filho, podendo contar com a ajuda de seu ex-namorado, Alec, que permanece no Brasil, seguindo rastros e também respostas que poderão ajudá-los a entender a complexidade do que está acontecendo.
Os sonhos lúcidos estão presentes em diversas partes da narrativa, permeando a vida de vários personagens, e sendo tão vivos, que podem chegar a impressionar. Há uma bela jogada da trama com a protagonista e a figura de mesmo nome, conhecida de todos nós, que, um dia, foi tentada no paraíso por uma serpente e um fruto proibido.
“A serpente torna a escalar os galhos e volta com outra fruta. Em vez de jogá-la, ela a morde, mastigando-a até transformá-la numa pasta viscosa, que lhe escorre pela boca. Desliza pela árvore, arrasta-se até meus pés e escala meu corpo nu, enlaçando-me” (Pág. 51).
A escrita de Chico Anes é ótima, assim como as informações dadas ao longo da narrativa sobre o universo onírico. Em alguns pontos senti-me apenas um pouco incomodada com alguns diálogos. Aprecio a caracterização que autor deu a cada personagem, tentando, inclusive, diferenciar a forma falada entre mineiros e paulistas, por exemplo, assim como as diferenças de idade. Porém, em alguns momentos, as formas de tratamento e a forma caricata como alguns diálogos foram escritos me incomodaram um pouco (sou paulista, mas vivi em Minas por cinco anos, onde fiz faculdade). Essa é a única ressalva, que certamente é apenas uma questão de gosto pessoal, em uma narrativa muito bem elaborada, cheia de ação e reviravoltas, com um final agitado, que, além de trazer respostas, não desagradará nenhum leitor.