spoiler visualizarMatheus.Correa 05/01/2022
Gostosinho de ler
"Quanto ao modo para diferenciar as duas metades, pareceu-me que fazer uma ruim e a outra boa seria o que criaria o máximo de contraste. Era toda uma construção narrativa fundamentada nos contrastes. Portanto, a história se baseia numa série de efeitos de surpresa: que, em lugar do visconde inteiro, retorne à terra natal um visconde pelo meio que é muito cruel, pareceu-me que criaria o máximo de efeito de surpresa" - O visconde cortado ao meio é um exemplo do bem e mal sem nuance, aquela ideia de que uma pessoa é interinamente boa ou má. Após um acontecimento em uma batalha; o visconde aparece em sua cidade com apenas metade do corpo, apenas o seu lado direito. Cruel e nefasto, fazendo maldades e exigindo coisas, a história é contada pelos olhos do seu sobrinho, que no início tinha uma boa relação com o homem, mas que após a vinda da metade ele, as coisas mudaram terrivelmente. O visconde mau é conhecido por todos, e igualmente odiado, até que em um dia qualquer, a outra parte aparece. Um visconde gentil, generoso, complacente. Que ajuda à todos e aqui está a grande crítica do autor. Esse novo e gentil Visconde vê a maldade em todos os outros, o olhar crítico às escolhas dos moradores para com os seus semelhantes. A questão de perspectiva; todos os cidadãos perto dele se tornavam ordinário e ruins, os que de fato se importavam em serem bons, já os levianos se aproveitavam disso " — Sim, nesse caso fui eu... — E ainda conta vantagem? Servia-lhe para dar pancadas na mulher, coitada... — Ele me disse que não conseguia andar por causa da gota... — Fingia... E você correndo lhe oferece a muleta... Acaba de quebrá-la nas costas da mulher e você anda se apoiando numa forquilha... Cabeça oca, não passa disso! E sempre foi assim! E quando você embebedou o touro de Bernardo com aguardente? — Esse não era eu... — Como não? Se todos dizem: é sempre ele, o visconde!" - Visconde sem ter a malandragem de ter a compreensão do que poderia ser o bem e o mal real, deu uma bengala ao homem que batia na mulher, Visconde (O bom) não sabia e sem perceber havia dado a arma ao opressor. Um livro pequeno, porém muito bom. Com o tom de ironia que te prende do começo ao fim.
"Porém, as intenções de meu tio iam mais longe: não se propusera apenas a curar os corpos dos leprosos, mas também suas almas. E andava sempre entre eles pregando moral, metendo o nariz nos negócios deles, escandalizando-se e fazendo sermões. Os leprosos não o suportavam. Os tempos beatos e licenciosos de Prado do Cogumelo tinham acabado. Com aquela exígua figura rígida numa perna só, vestida de negro, cerimoniosa e distribuindo regras, ninguém podia fazer o que lhe apetecia sem ser recriminado em praça pública, suscitando malignidade e despeito. Até a música, à força de ouvi-la ser recriminada como fútil, lasciva e não inspirada em bons sentimentos, acabou provocando aversão, e os estranhos instrumentos deles se cobriram de pó. As mulheres leprosas, sem o desafogo das farras, viram-se de repente sozinhas diante da doença, e passavam as noites chorando e se desesperando." - Ninguém gosta de um cuspidor de moralidade. Ser bom e mau, tendo qualidades e defeitos é o que nos equilibra, é o que nos torna humanos.