O queijo e os vermes

O queijo e os vermes Carlo Ginzburg




Resenhas - O Queijo e os Vermes


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Coruja 04/05/2011

E começamos mais um mês e mais um tema do Desafio Literário 2011. Os livros que escolhi dessa vez passam todos pelo mesmo tema e, claro, não se trata de uma coincidência: investigações históricas.

Iniciamos então com o pé direito, com o absolutamente delicioso O Queijo e os Vermes de Carlo Ginzburg. Esse livro está na minha lista de leituras desde a época do colégio, continuou lá durante a faculdade e esperou ainda mais um pouco até que um belo dia chega um pacote da Régis com ele no meio. Ia começá-lo no final do ano passado, mas aí apareceu a lista de temas do DL e me segurei até agora. Quando finalmente comecei, não consegui mais largá-lo, emendei com a leitura do Os Andarilhos do Bem do mesmo autor e estou neste exato instante pesquisando o preço de outros livros dele.

O Queijo e os Vermes é um livro curioso, sobre um personagem mais curioso ainda. O moleiro Menocchio é um indivíduo do povo que sabe ler, escrever e interpretar - o que era algo quase impensável numa região rural da Itália em plena Idade Média.

Não estou sendo preconceituosa ou elitista. Tenho plena consciência de que a Idade Média não foi a Era de Trevas e Ignorância que nos foi impingida no colégio isso foi intriga da oposição, digo, dos renascentistas. Mas viver nesse tempo também não era nenhum passeio no parque, e se educação não era uma coisa comum nem mesmo entre a elite, que dirá de um moleiro numa aldeia minúscula de uma região inteiramente agrícola.

É difícil, assim, de entender como Menocchio teve acesso aos livros e idéias que o levaram a criar uma cosmogonia própria, que ecoa panteísmo, mitologia hindu, princípios filosóficos, tolerância religiosa e morais e sociais totalmente deslocados numa sociedade feudal.

É pela capacidade de usar um arcabouço principiológico muito além de sua posição social que Menocchio chamou a atenção do Tribunal do Santo Ofício em 1583 e, quatro séculos depois, o porquê desse processo ter chamado a atenção de Ginzburg.

Tenho uma amiga que é estudante de História. Um belo dia, estávamos conversando não sei bem sobre o quê quando surgiu o assunto desse livro. Ela observou que não entendia porque O Queijo e os Vermes fazia tanto sucesso fora do círculo de iniciados estudantes e historiadores de uma forma geral. Afinal, trata-se de uma investigação histórica que analisa dois processos jurídicos realizados pela Inquisição, não sobre sabás demoníacos, mas simplesmente sobre o caráter herético ou não de uma série de afirmações feitas por um moleiro.

À época, não o tinha lido ainda, de forma que nada pude argumentar. Agora, contudo, tenho uma boa razão para esse gosto que de certa forma me foi inspirado pela própria investigação feita no livro -: a história de Menocchio se conforma a muitas leituras, da mesma forma que Menocchio conformava tudo o que lia à sua visão, ultrapassando inclusive todos os limites de interpretação destes textos.

Aliás, é uma referência cruzada interessante relacionar esse livro ao Superinterpretação e Interpretação de Eco, porque essa questão dos limites interpretativos e até onde Menocchio vai para fazer com que os livros a que teve acesso a Bíblia em vulgata, ou seja, no vernáculo local e não em latim; o Decamerão numa edição não censurada, as viagens de sir John Mandeville, uma coletânea de evangelhos apócrifos, tratados teológico-filosóficos e até, acredita-se, um Alcorão se adaptem a um conjunto de crenças pré-cristãs que permeia ainda a cultura e a sociedade da qual faz parte, junto às suas próprias deduções.

A bem da verdade, houve momentos em que quase rolei de rir com a obstinação de Menocchio, que simplesmente descarta aquilo que não interessa à sua doutrina, não importa quão óbvio ou quão necessário aquele detalhe seja para a completude das teorias apresentadas nesses livros. É quase como se ele brincasse de cortar palavras a esmo de uma página escrita, de forma a montar frases que sejam o exato oposto do sentido geral da folha de onde foram tiradas.

No meio dessa confusão hermenêutica, contudo, a grande verdade é que não importa tanto assim como Menocchio chegou às suas conclusões que é o objetivo confesso do livro e o interesse dos historiadores. O que importa é que a despeito de seu isolamento professar idéias diferentes daquelas da maioria, especialmente numa época em que você pode virar churrasquinho se o fizer, não é exatamente a melhor maneira de se tornar popular em sua vila e do risco que corria frente às acusações pelas quais foi investigado, Menocchio teve coragem de expor suas idéias.

Mais que isso: ele ansiava quase desesperadamente por uma oportunidade como essa, em que poderia falar diante de pessoas que pudessem ouvi-lo e compreendê-lo.

Lemos amplamente O Queijo e os Vermes não para compreender e interpretar uma determinada época, mas porque seu protagonista tem traços de uma verdadeiro herói. Porque ele faz algo impensável, difícil mesmo nos dias de hoje: eleva-se acima de seu status e daquilo que era esperado dele para chocar e quebrar dogmas. Porque ele questiona. E porque é um dos homens mais corajosos ou loucos com que você já cruzou.

Ginzburg, a despeito de estar escrevendo um estudo profundo para um público específico, jamais cai na armadilha dos tecnicismos. Pelo contrário, ele acha que essa é uma história que vale à pena ser contada, e deixa óbvio ao longo de todo o livro sua surpresa, seu prazer, sua curiosidade em relação à figura do nosso bom moleiro.

Ele compartilha conosco sua admiração.

Eis porque O Queijo e os Vermes não é um livro exclusivamente para iniciados, porque vale à pena ler a história de Menocchio frente aos seus consternados inquisidores.
Victor 06/03/2015minha estante
A resenha ficou ótima! Realmente a história de Menocchio é muito gostosa de se ler. Só um detalhe: ele não viveu na Idade Média, e sim na atualmente denominada Idade Moderna. O século XVI foi o século das grandes navegações, e dos grandes descobrimentos. A Inquisição ocorreu na Idade Moderna, e não na Idade Média. Essa confusão, no entanto, é comum. Fora isso, a resenha está ótima, parabéns!


Alipio 12/10/2020minha estante
o livro pode sim mostrar que pelo menos dois fatores determinaram uma nova dinâmica no campo ao longo do período do Renascimento:


Alipio 12/10/2020minha estante
precisa " ver" onde sua amiga esta aprendendo história. Se não compreende o porque da importancia desse livro na historiografia, algo está errado


Coruja 13/10/2020minha estante
Alípio, minha amiga não se surpreendia com a importância desse livro para historiografia. A surpresa dela era com o sucesso que esse livro tem fora dos círculos daqueles que estudam história, com os leigos. Gente que normalmente não tem um interesse óbvio em estudar História, mas que fica fascinado com a leitura desse livro.




Luciano Luíz 27/07/2017

Os livros de História sempre trazem personagens ligados à vitórias. Pessoas que estão numa classe social superior. Que detém um intelecto mais desenvolvido, que estudaram mais profundamente diversas áreas da natureza ou das artes. No entanto, fica aquela pergunta: e as pessoas mais simples, por que não há registros históricos sobre as mesmas? O povo, os mais humildes, desfavorecidos e por aí vai... Bom, é justamente pelo fato de que a História é escrita pelos vencedores, como se diz numa frase bem conhecida. No entanto, estes vencedores usam alicerces que raramente são mencionados...
O QUEIJO E OS VERMES é nada mais nada menos do que a vida de Menocchio, um moleiro italiano do século 16 que foi acusado de heresia pela Igreja Católica. Era um homem com mais de 50 anos, cuidava de seu moinho (alugado), sustentava filhos e netos. Porém, havia uma coisa diferente nele: tinha conhecimento como nenhum outro camponês da vila e arredores. Menocchio lançava perguntas e dúvidas que ninguém além dele sabia palestrar. Era alguém que sabia ler e escrever, algo raro numa classe que ficava muito abaixo dos dominantes que eram condes, reis, príncipes, padres, bispos e claro, o papa.
Menocchio era considerado um ateu pelos olhos da Inquisição, e por isso fora intimado, interrogado, torturado, preso, solto, depois novamente pego e então executado. Assim como qualquer pessoa que questionasse a doutrina cristã, Menocchio sofreu. Tinha um vocabulário rico e que acabava ficando superior aos de seus interrogadores. Falava que Maria era uma puta (pois como uma virgem pode engravidar?!), que as hóstias eram tão grandes quanto bestas, que Deus estava em todas as coisas, que Jesus Cristo se fosse mesmo tão poderoso teria se livrado da cruz e outros temas mais. Só que o pessoal da Igreja não tolerava isso. Achavam que Menocchio poderia ser mais um seguidor de Lutero (que havia se desconectado do catolicismo para pregar suas ideias protestantes e assim construir sua própria reforma e fazer as mesmas coisas que os católicos: como inquisição, cobrar dízimos e outras mais).
Ou seja, Menocchio era um verdadeiro perigo para a cristandade. Se os demais em sua vila começassem a pensar (e falar) como ele, a Igreja teria sérios problemas...
O historiador CARLO GINZBURG reconstruiu a vida do moleiro através de farta documentação que encontrara ao acaso. Sem dúvida Menocchio não foi o único herege que passou pelas correntes da Santa Inquisição, mas nenhum outro foi tão bem documentado. Apesar da vasta quantidade de informações, muitas dúvidas permanecem e então não dá pra comentar além de hipóteses.
O Queijo e os Vermes é uma leitura que fascina. Ali vemos toda a ignorância da religião para simplesmente fazer alguém aceitar que Deus existe e que deve ser amado, caso contrário, a morte é a única saída para quem é do contra...
Para quem gosta de História, biografia ou mesmo quer se sentir na pele de uma pessoa que para seus patrícios era só mais um louco com ideias absurdas, este livro é uma maravilha.
No início desse texto falei em pessoas ligadas à vitórias. Menocchio foi um vencedor. Pode não ter sido reconhecido em seu tempo. Mas hoje ele é uma das personalidades mais importantes de todos os tempos. Um homem que estava à frente de seu tempo. Alguém que ousou pensar. E falar...

Nota: 10

L. L. Santos

site: https://www.facebook.com/lucianoluizsantostextos/
Marie.Curie 01/08/2017minha estante
Resenha apaixonante, meu caro! Realmente, um livro que merece ser lido!


Luciano Luíz 02/08/2017minha estante
Obrigado. ^_^




Camargo 04/03/2022

Li como leitura obrigatória da faculdade. Tema bom, desenvolvimento bom e a pesquisa nominativa impecável.
Porém o Menocchio não para de fazer cagada oq me deu uma certa agonia e o fato de o Ginzburg falar demais sobre tudo faz parecer que o livro não tem fim.
Apesar de tudo, muito importante no debate sobre a Cultura Popular e não acho que uma pessoa simplesmente interessada por história gostaria desse livro (se não fosse pela faculdade, talvez eu não gostasse).
Guilherme 28/07/2022minha estante
Eu sou só uma pessoa interessada por história e gostei kkk.
Acabei lendo esse livro de uma forma aleatória e achei bem interessante.

Ps. Comprei pela capa, nunca tinha ouvido falar
ps2. ainda bem que julguei o livro pela capa




IvaldoRocha 22/09/2017

Difícil entender como um estudo de micro-história se torna um livro tão lido.
Antes de mais nada é interessante saber que Carlo Ginzburg e Giovanni Levi foram os criadores do gênero “Micro-história”, onde o estudo histórico está totalmente restrito a um caso, naquele tempo e naquela localidade (cronológica e geograficamente limitado) e tem claro que este estudo não necessariamente é válido fora desses limites estabelecidos.
O caso do moleiro (trabalhador ou dono de moinho) Domenico Scandella, conhecido como Menochio, foi encontrado por acaso enquanto Ginzburg pesquisava os arquivos da Cúria Episcopal em Udine. A sentença tão detalhada, onde uma das acusações ao réu era de que o mesmo sustentava que a origem do mundo se dava na putrefação, assim como os vermes vinham da putrefação do queijo. Oito anos depois Ginzburg volta ao caso e assim nasce “O Queijo e os Vermes”.
A partir da rica documentação existente foi possível relatar e tentar entender o que levou Menochio a chegar às conclusões que chegou. Os livros ao qual teve acesso, o fato de que alguns livros publicados na época eram na verdade versões resumidas e um tanto alterada de livros clássicos, e o entendimento de Menochio da sua cultura popular e a mistura que fazia com que conseguia extrair desses livros.
Enfim o comportamento de Menochio se torna além de bastante arriscado, no mínimo um tanto bizarro. Saindo de toda a capa acadêmica que cerca o livro eu me permitiria dizer que se tratava de um tremendo cabeça dura. Simples assim. Juntando pedaços de coisas que julgava entender, com os conhecimentos/crenças populares ele estabelece uma visão de mundo que surpreende. Não há como negar a sua coragem e um pouco do seu orgulho, além de uma certa prepotência quando dizia aos seus vizinhos:
- Se eu pudesse diria diretamente ao Papa que....
- Eu diria ao príncipe que....
Agora não deixa de chamar a atenção o fato de um livro que praticamente se trata de um trabalho acadêmico seja tão lido e por tanto tempo. Talvez algumas pessoas, como eu, foram levadas a ler o livro achando que teríamos como principal pano de fundo a “Santa Inquisição” e suas mazelas e não a maneira singular do pensamento de um moleiro. Mas uma vez começado é difícil interromper a leitura, Menochio de certa forma cativa o leitor que se preocupa com seu destino e o segue até o final.
nabu 27/01/2020minha estante
Querido, sinto que não entendeste muito bem o sentido da Micro-história. É uma abordagem mais ampla e não vem no sentido de restringir a analise geograficamente, não se trata de um estudo de caso. O objetivo dessa abordagem é sempre dialogar com o Macro, buscando nas minúcias, aspectos que passam despercebidos quando se faz uma análise em maior escala. Como no caso de Menocchio, que nos permite notar - apesar de não nos ser possível esmiuçar - a presença de uma cultura oral camponesa não observada antes. Não sei se é de ser interesse mas já um artigo ótimo explicando de forma clara e simples a Micro-história, é do professor José D'Assunçao Barros, da UFF. Abraços




João 28/09/2023

Do queijo os vermes, destes os homens, dos quais o maior foi Deus
"Como pudera sair da cabeça de Menocchio uma antropologia tão abtrusa e complicada?"

Muito interessante como a história do moleiro é construída. Com fontes e investigação social apurada, um único caso foi capaz de revelar toda uma estrutura antropológica e social.

O trabalho é raro e dispendioso, mas inspira ao sério e curioso.

"A comparação, que salienta o que é divergência e mesmo erro, assim permite entender o erro como ruído; e o ruído, sabemos ouvindo a música mais recente, pode ser também música. O que Menocchio compreende mal é, na verdade, o que ele compreende de outro modo". =)


Joana 28/09/2023minha estante
veio aii




Paulo 08/01/2017

visão social
Uma ótima visão da sociedade e dos deveres do "santo oficio" entres os séculos xv e xvI na Itália onde verificamos um apanhado geral de: entre ás diferenças classes ,intolerância religiosa, estereotipacões , manipulações, disputa pelo , poder, a ganância , a crueldade, a bondade . No qual tudo isto era calcado na FÉ e regido pelo "santo oficio" ( inquisição)
Sérgio Filho 24/01/2017minha estante
Que legal Paulo, continue sempre sendo um ávido leitor e compartilhando conosco suas experiências de leitura.




Jaqueline.Schmitt 05/07/2015

História maravilhosa sobre a cultura popular na Idade Média.
Priscilla Akao 15/01/2016minha estante
Achei maravilhoso também como a leitura pode ampliar os horizontes e fazer uma pessoa questionar o mundo. Jamais pensei que isso pudesse ter acontecido numa aldeia do interior da Itália na Idade Média.




Lucas 05/02/2009

Um Marco na Historiografia
Ginzburg abre um marco na historiografia pois ele inaugura em sua obra O Queijo e os Vermes, a micro-história, e a história da vida privada. Ao utilizar-se dos documentos inquisitórios do Moleiro Menocchio, ele passa ao leitor todo a afervescência e o dia-a-dia dos homens daquela época. Fica claro em sua narrativa como um pequeno fato pode ser utlizado para se entender a história de um todo. No seu caso seria o julgamento de Menocchio, e sua relação com a igreja, a inquisição, e até mesmo a difusão da leitura naquele período da história, já que era partindo dela, ou da falta de um aprofundamento da mesma, que nosso protagonista desenvolvia teorias esdrúxulas, chamando assim a atenção dos padres Dominicanos responsáveis pelas Santas Fogueiras.
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bela 25/04/2024

O queijo e os vermes
é um trabalho historiográfico que te prende, da vontade de terminar e saber o desfecho da história. diferente de tudo que já li, nesse livro consegui enxergar os cenários e imaginar Menocchio em seu mundo, como se fosse uma ficção mesmo.
Menocchio é uma exceção em sua aldeia, um homem que lê, reflete, reflete mais e chega a conclusões totalmente foras da caixa. um homem solitário, que só quer expor sua opinião a quem estiver disposto a ouvi-lo.
Ginzburg vai destrinchando os documentos a ponto de, surpreendentemente, chegar aos pensamentos do nosso herói, que tem tanto a nos agregar com suas palavras de tolerância religiosa, questionamentos contra a autoridade dos clérigos, etc?
a bíblia não foi realmente escrita por homens? homens que leram, pensaram, estudaram? o que é Deus, se não simplesmente tudo? somos feitos de água, ar, terra e fogo, se somos a imagem e semelhança de Deus, ele também não seria feito desses elementos? é estranho concordar com Menocchio?
enfim, obra incrível. de um trabalho de formiguinha complexo. uma micro-história sensacional. tomo aqui um trecho do capítulo 61 para terminar essa resenha:
?Muitas vezes vimos aflorar, através das profundíssimas diferenças de linguagem, analogias surpreendentes entre as tendências que norteiam a cultura camponesa que tentamos reconstruir e as de setores mais avançados da cultura quinhentista. Explicar essas semelhanças como mera difusão de cima para baixo significa aderir à tese - insustentável - segundo a qual as ideias nascem exclusivamente no âmbito das classes dominantes. Por outro lado, a recusa dessa tese simplista implica uma hipótese muito mais complexa sobre as relações que permeavam, nesse período, as duas culturas: a das classes dominantes e a das
classes subalternas.?
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Biblioteklara 30/10/2009

Muito bom!
Pelo menos do ponto de vista que eu li...
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Pandora 03/12/2009

Um moleiro perseguido pela Inquisição
Em O queijo e os vermes, Carlos Ginzburg vai nos contar com base em documentos históricos e com toda a metodologia da ciência História, mas com a leveza da literatura a história de Menoquio, um homem comum dono de alguns moinhos, um moleiro, que adora ler e ler tudo que lhe cai na mão.
Através de suas leituras Menoquio constroe idéias filosoficas sobre o mundo, sobre a criação, sobre Deus e as religiões, essas idéias muitas vezes destoam daquilo que a Santa Igreja Catolica apregoa como verdade e nosso moleiro acaba perseguido pela Inquisição.
Nos tribunais do Santo Oficio, esse moleiro expõe suas idéias e mostra o que pensa de maneira que se tornou possivel ao históriador Ginzburg, através dos restos, dos sinais, reconstruir as idéias desse homem comum e mostrar através dele as idéias que circulam na mente das pessoas.
Um livro decididamente muito interessante, de leitura agradavel e que qualquer um que ame História e uma boa história vai amar ler.
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TeTe 25/12/2009

A contribuição da micro-história em: O queijo e os vermes, de Carlo Ginzburg
Tento aqui apresentar uma descrição com ponderações da obra de Carlo Ginzburg, O queijo e os Vermes – O cotidiano e as idéias de um moleiro perseguido pela inquisição. Publicada no Brasil em 1987, pela CIA. Das Letras, sendo esta edição reimpressa (2ª) em 2006 em São Paulo a obra do italiano traz um olhar novo da História de maneira sofisticada, tornando acessível o conhecimento de um fato que, em certa medida, demonstra o quão presente pode ter sido a resistência ideológica do período e espaço que estuda (os processos inquisitoriais na Itália quinhentista) se essa tivesse sido mais bem registrada, como foi no caso de Menóchio, o moleiro e personagem central do livro. Esse texto é um produto de um novo gênero historiográfico surgido nos anos 80, a Micro-História, da qual Carlo Ginzburg é seu principal pioneiro. Este gênero tem como premissas um recorte de tempo e espaço geográfico reduzidos e uma busca exaustiva de fontes de múltiplos tipos, incluindo oralidades e registros culturais do objeto pesquisado.

A obra trata de um caso em particular dentre os tantos processos da Inquisição na Itália, mais precisamente em Montereale na região da cidade de Friuli. O processo chama atenção pela sua duração e pela sua reabertura e continuação do julgamento do réu, quinze anos depois. O réu é um moleiro de meia idade que desenvolveu idéias próprias, embasadas em leituras particulares, acerca de um tema tão controverso e unilateral no período em que vive e no lugar onde reside. Ginzburg, então, resolve desenvolver uma pesquisa á parte de seus estudos analisando o processo de Menochio, o moleiro que desenvolveu idéias acerca da origem da vida, da existência de Deus, Cristo, dos anjos, dos espíritos malignos e dos homens e por isso considerado herege e denunciado pelo pároco de sua própria aldeia.

O livro dividi-se em 62 pequenos capítulos, introduzidos por dois prefácios, um de edição inglesa e outro de edição italiana, e concluídos por um posfácio. Contém 255 páginas. Seu foco constitui-se ora em narração em terceira pessoa, com descrições das idéias do personagem central e pequenas descrições de idéias semelhantes em outros casos, ora em ponderações do próprio autor do livro.

A idéia central do personagem descrito, Menóchio, que carrega o título do livro, trata-se de uma analogia com os vermes que nascem do queijo com os anjos que nascem de uma massa espiritual que continha o material perfeito para a essência dos seres. Essa massa seria o caos: ”Eu disse que segundo meu pensamento e crença tudo era um caos, isto é, terra, ar, água e fogo juntos” (pag.95, cap.25) e a origem de todos os seres, da qual constituíram-se inicialmente os anjos e dentre eles foi eleito o mais viril e poderoso para liderá-los.

Enquanto descreve o processo do moleiro, Ginzburg usa alguns capítulos para dar ênfase ás leituras de Menochio, julgando estas de vital importância para o desenvolvimento de suas idéias. Entretanto frisa também como o personagem desenvolve idéias próprias e como declara isso aos inquisidores com a convicção de que o leitor, qualquer que seja tem propriedade para tal.

Nesse sentido, é importante salientar que um moleiro, dentro daquela sociedade, era uma profissão que se enquadrava em uma posição de trabalhadores que tem certa possibilidade de acesso á leituras, pois é, naquele período e em tal espaço, uma profissão de nível um pouco destacada em relação ás outras, em suma, pode-se dizer que se tratava de uma profissão de “classe média”. Ponto essencial para entender o desenvolvimento das idéias de Menochio, pois a leitura, ainda que escassa e de pequena bibliografia, foi o que possibilitou seu contato com outras visões de culturas e religiões que diferem em diversos aspectos, daquela que lhe é imposta e aos seus concidadãos. Nesse sentido, vale salientar os capítulos finais do livro, quando Ginzburg dá um exemplo parecido de processo inquisitorial contra um outro moleiro de nome Scolio e atenta para um dado fundamental: “Na Europa pré-industrial, o fraco desenvolvimento das comunicações obrigava mesmo pequenos centros habitados a ter pelo menos um moinho, de água ou de vento. A profissão de moleiro era então um das mais comuns. A presença maciça de moleiros nas seitas heréticas da Idade Média e mais ainda entre os anabatistas não apresenta, assim, nada de excepcional (...) A hostilidade secular entre camponeses e moleiros consolidara a imagem de moleiro esperto, ladrão (...) A acusação de heresia casava muito bem com tal estereótipo. Contribuía para alimentá-la o fato de o moinho ser um lugar de encontros, de relações sociais, num mundo predominantemente fechado e estático. Um lugar de troca de idéias, como a taverna e a loja ”. (pag. 181, cap.59), ou seja, os moinhos era lugares propícios para discussão de idéias consideradas heréticas.

Ainda nessa linha de raciocínio, o moleiro descobre que as relações espirituais desenvolvidas em cada sociedade tem muito a ver com as atividades empíricas ali efetuadas: “Senhor, eu penso que cada um acha que a sua fé seja a melhor, mas não se sabe qual é a melhor...” (pag.94, cap.23), o que é uma característica dele próprio, pois, apesar de suas idéias controvérsias, ainda defende certa religiosidade, mas toda ela embasada em suas experiências empíricas, em suas práticas cotidianas, em sua realidade mais latente. Para Menochio, as idéias do cristianismo muito se distanciam do que ele e seus vizinhos e amigos conhecem e as coisas e fenômenos com os quais convivem inclusive no que diz respeito ás autoridades clericais e seus atos em relação ao divino: “E me parece que na nossa lei o papa, os cardeais, os padres são tão grandes e ricos, que tudo pertence à Igreja e aos padres. Eles arruínam os pobres...” (pag.50, cap.8). Menóchio destaca e usa como argumento, como os atos religiosos de seu tempo estão distantes tanto do que conhece do cristianismo como do que tem como idéias de espiritualismo.

Menochio, ao que parece, tem dificuldades para concluir sua “tese”. Em determinados momentos se contradiz, volta atrás em seus apontamentos e depois os retoma. Ele questiona a existência de Deus como ser personificado e diz ser este o todo que se conhece, ou seja, Deus é, para Menochio, toda a substância, todo o mundo em cada partícula, o produto do caos, do “queijo”. Isso se explica talvez pela escassa leitura que fez e que tinha acesso e, também, pela maneira como fazia suas leituras que, como aponta o Ginzburg, diferia em muito de um sentido mais fiel aos textos que leu: “Vimos, portanto, como Menóchio lia seus livros: destacava, chegando a deformar palavras e frases; justapunha passagens diversas, fazendo explodir analogias fulminantes (...) triturava e reelaborava suas leituras, indo muito além de qualquer modelo preestabelecido.” (pag. 95, cap. 24).

O autor aproxima as idéias de Menóchio á idéias vigentes naquele período que também contestam a hegemonia católica do momento, o anabatismo e o luteranismo em voga na segunda metade do século XVI. Mas ele próprio deixa evidente que se tratam de idéias originais que, apesar de terem a mesma posição no sentido de criar oposição ao cristianismo e existirem possíveis relações entre as idéias, Menóchio desenvolveu seus preceitos como ele mesmo aponta “de minha própria cabeça” e das obras que leu não se tem provas que tenham relação com as doutrinas citadas.

Menochio, apesar da originalidade de suas idéias, sofre com a retórica e a boa oratória dos inquisidores durante os processos, o que o leva a muitas vezes não saber o que responder, talvez pela falta de outras leituras ou pelo pequeno desenvolvimento da dialética de sua tese, tendo em vista que o que conseguiu até o momento do início do processo foi, no máximo, divulgar as idéias que conhecia aos camponeses e aldeões de Montereale, não obtendo críticas que o forçassem a desenvolver boas respostas. Daí surge nele a necessidade de transmitir seus pensamentos á indivíduos que o pudessem ajudar nesse processo de construção de seu pensamento e, para tanto, o moleiro se entusiasma com a idéia de dialogar com os inquisidores, mesmo que isto lhe custe a vida. Entretanto em dado momento, em fins do seu primeiro processo, o que ocorre é o inverso: por conta do calibre da repressão ideológica que se dava naquele contexto, ele acaba sendo convencido de que errara em alguns pontos de suas idéias e aceita que é um herege, talvez mesmo por conta de ter se convencido que estava louco com suas idéias, talvez por medo do que lhe pudesse ocorrer e intentando se livrar da pena que lhe fosse deferida. O que se percebe em seguida é que se tratava deste ultimo aspecto, pois Menóchio, mesmo recebendo punições, é liberto e ao receber concessão para ir a outras cidades (uma das penas que lhe foi aplicada era justamente permanecer sempre em Montereale), retoma suas idéias e volta a divulgá-las, pois sente-se profundamente ferido pela penalização que limitou as fontes de renda de sua família, permitiu que ocorresse a morte de sua esposa e filho sem que ele pudesse trabalhar para outros clientes além dos monterealenses.

Dentre outras motivações que Menóchio obteve para retomar suas idéias, Ginzburg destaca um diálogo com um mendigo judeu, semelhantemente reprimido pela hegemonia cristã. Fato esse que permite um paralelo interessante: em outros capítulos o autor ilustra a rotatividade de livros que, pela sua escassez e difícil acesso, era a melhor maneira de se ampliar o acervo de conhecimento. Nesse sentido, o autor descobre uma série de diálogos diretos e indiretos entre Menóchio e outros personagens que tinham também críticas á religião predominante e novas teorias sobre o espiritualismo. Mesmo Menochio considerando insuficiente esses processos dialéticos, preferindo falar aos doutos detentores de maior sabedoria, tais diálogos contém teor de oralidade aplicado no desenvolvimento de seu pensamento, mesmo que inconscientemente ele tenha dito conceber suas idéias apenas de suas leituras e de sua própria cabeça.

Menóchio tem sua trajetória findada com o encerramento do segundo processo, quando os inquisidores recebem uma ordem fulminante de seus superiores em Roma depois de descobrirem os descumprimentos do moleiro de suas penas e que, sobretudo retomara suas idéias heréticas. Menóchio já muito idoso e emocionalmente abatido é torturado e morto.

No geral, O queijo e os Vermes, traz um exemplo muito interessante de como a totalidade influi diretamente em todos os pequenos fatos do cotidiano das sociedades, sejam elas de qualquer proporção e como, inversamente, os pequenos detalhes fazem frente ás idéias totalitárias. Entendendo que a história, desde o surgimento da propriedade privada, nos mostra a gênese, o desenvolvimento, e a cristalização de classes dominantes e de classes subalternas, torna-se extremamente importante para os historiadores que mais trabalhos como esse sejam feitos, pois registram como as hegemonias políticas, ideológicas e econômicas interferem (e ferem) diretamente a vida de pessoas comuns, trabalhadores, indigentes, etc. E , mais interessante ainda do que mostrar as limitações dessas classes marginais impostas pelas classes dominantes, evidenciam como se dá a resistência contra estas imposições em suas variadas formas e, no caso desta obra, no campo ideológico com ‘suporte’ do cultural.

Podemos concluir que a vital importância da leitura [e da oralidade presente em parte desta] para o desenvolvimento das idéias de Menóchio, a coerência de suas idéias em determinados aspectos, a vitalidade de seus argumentos e a sua convicção sobre suas conclusões, ou seja, todos os questionamentos acerca da ideologia predominante, era exatamente o que se procurava evitar com aquilo que Claro Ginzburg denomina, usando no título de um dos capítulos como “O monopólio do saber”. O livro ilustra bem esse caso com um fato interessante: aqueles processos duraram mais tempo que o habitual provavelmente pela confusão que Menochio inserira nas idéias dos inquisidores, que achavam coerências em suas idéias e sentiam a necessidade de fazer longos intervalos para estudar seus depoimentos.

Este livro aponta para uma perspectiva diferente de resistência, dentre tantas outras que se pode perceber, a resistência intelectual. Menóchio é um exemplo nesse sentido, pois ruma contra o catolicismo hegemônico, apresentando outras perspectivas religiosas de outras sociedades e, o mais interessante, desenvolve sua alternativa própria de percepção espiritual.

Ótima leitura, muito interessante tanto pela abordagem de um tema tão complexo e pela originalidade de um caso pouco conhecido dentre os processos de julgamento de hereges durante a atuação da Inquisição e também pela originalidade e atualidade das idéias do personagem central. Obra interessante para o estudo das diferentes formas de resistência ideológica de classes subalternas, para estudo cultural do declínio da Idade Média.

Carlo Ginzburg é um Antropólogo e Historiador italiano, um dos pioneiros da Micro-História.





Por:

Evandro coutinho

Graduando em Licenciatura e Bacharelado em História.
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Nameless 30/04/2011

O conhecimento cria...
Grande obra que prioriza mostrar o choque entre cultura oral ou popular contra os ditos da Santa Igreja. Forma de mostrar como a busca por conhecimento nos torna questionadores e de alguma forma cria repulsa por parte das classes dominantes, que tentam manter a classe mais probre em seu devido lugar garantindo seus privilégios.
Vale ressaltar que isso é visto até hoje na religião, política, economia, etc.
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Silvia 15/07/2012

Acho que Carlo Ginzburg deve ter dado pulos de alegria quando encontrou os documentos referentes ao caso do moleiro cheio de idéias próprias a respeito de deus,dos anjos e da criação. O Queijo e os vermes e um livro gostoso de ler, um caso singular que apresenta a cultura popular em confronto com a cultura erudita.
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William 19/07/2012

Análise do Livro O Queijo e os Vermes de Carlo Ginzburg (www.paginadowll.com)
O Autor.
Carlo Ginzburg nasceu em Turim na Itália em 1939, filho do professor e tradutor Leone Ginzburg e da romancista Natalia Ginzburg. Iniciou sua formação na Escola Normal Superior de Pisa, concluindo os estudos no Instituto Warburg em Londres...
Ginzburg formou-se em História e passou a lecionar na Universidade de Bolonha. Mas logo se mudou para os EUA onde passou a lecionar nas Universidades de Harvard, Yale, Princeton e da Califórnia, ocupando por duas décadas a cadeira de Renascimento Italiano. Em 2006 retornou a Itália e agora leciona na mesma Escola Normal Superior de Pise onde iniciou sua formação.
Carlo Ginzburg está entre os intelectuais mais notáveis da Itália e seus livros já foram traduzidos para mais de 15 línguas. Estando entre os pioneiros e principal nome da Micro-história.
Micro-história.
Segundo Giovanni Levi a Micro-história surgiu durante os anos 1970, e deriva da crise do marxismo como metodologia e interpretação. Essa falência dos sistemas e paradigmas existentes requeria não tanto a construção de uma nova teoria social geral, mas uma completa revisão dos instrumentos de pesquisas atuais e a micro-história foi apenas mais uma das diversas respostas que surgiram a essa crise.
A micro-história como uma prática é essencialmente baseada na redução da escala da observação em uma análise microscópica e em um estudo intensivo do material documental. Entretanto, não basta somente chamar atenção para causas e efeitos em escalas diferentes. Para a micro-história, a redução da escala é um procedimento analítico, que pode ser aplicado em qualquer lugar, independentemente das dimensões do objeto analisado. O que é alvo de criticas de diversos historiadores.
O principio unificador de toda pesquisa micro-histórica é a crença em que a observação microscópica revelará fatores previamente não observados.
Ainda segundo Levi, apesar das diversas interpretações errôneas sobre à micro-história, ela deve ser entendida como um “zoom” em uma fotografia. O pesquisador observa um pequeno espaço bastante ampliado, mas ao mesmo tempo, tendo em conta o restante da paisagem, apesar de não estar ampliada.

A obra: O Queijo e os Vermes.
Esta pesquisa surgiu por acaso, enquanto Carlo Ginzburg pesquisava sobre uma seita italiana de curandeiros e bruxos, o historiador se deparou com um julgamento excepcionalmente detalhado. Tratava-se do depoimento de Domenico Scandella, dito Menocchio, um moleiro[1] do norte da Itália, que no século XVI ousara afirmar que o mundo tinha origem na putrefação. Segundo ele: “Tudo era um casos, isto é, terra, ar, água e fogo juntos, e de todo aquele volume em movimento se formou uma massa, do mesmo modo que o queijo é feito do leite, e do qual surgem os vermes, e esses foram os anjos”. Graças ao fascínio dos inquisidores pelas crenças desse moleiro, Ginzburg encontrou farta documentação a partir da qual pôde reconstruir a trajetória de Menocchio num texto claro e atraente, tanto para especialistas quanto para leigos, e desembocar em uma hipótese geral sobre a cultura popular da Europa pré-industrial.
Ginzburg busca neste livro, não apenas reconstruir a vida e o julgamento de Menocchio, mas principalmente entender como essas idéias se manifestaram em sua mente, como surgiram, quais foram seus influenciadores, quais livros leu, como leu, como absorveu o conhecimento contido nesses livros, com quem conversou e assim por diante.
Resumo:
Domenico Scandella, vulgo Menocchio, nasceu em 1532 em Montereale na Itália. Casado e pai de 7 filhos, sustenta a família através de sua profissão de moleiro. Outro dado importante sobre Menocchio é que este sabia ler, escrever e somar.
O moleiro era bastante conhecido na cidade e costuma já há muito tempo blasfemar durante conversas informais pela cidade. Todos escutavam aquilo e não levavam em consideração pelo fato de ele ser considerado uma “boa pessoa”. Entretanto, após algumas divergências com o pároco local, Menocchio começou a se confessar com na cidade vizinha, sendo então denunciado no dia 28 de setembro de 1583 ao tribunal do Santo Oficio por suas diversas heresias.
Em suas conversas Menocchio sempre dizia ter vontade de falar a um rei, papa ou príncipe tudo o que achava que estava errado na religião e esta foi a sua chance. Criticou a igreja, a missa em latim, a santíssima trindade, os evangelhos, o poder da igreja, e apresentou aos inquisidores sua teoria de criação do mundo.
Após meses de interrogatório, Menocchio foi condenado à prisão perpétua e a usar pelo resto de sua vida uma túnica com uma cruz no peito. Ficou então encarcerado por três anos, até que seu filho conseguiu por meios diversos uma espécie de segunda chance para seu pai. Onde este poderia sair da prisão, mas jamais tirar a túnica, sair da cidade ou voltar a blasfemar.
E foi tudo o que Menocchio não fez saiu da cidade várias vezes para trabalhar, tirava a túnica, pois com esta não conseguia serviço, e aos poucos voltou a dizer heresias. Logo foi novamente denunciado,torturado, julgado, condenado e desta vez executado.
Análise.
Este livro narra então à história de Menocchio e busca nela suas leituras, discussões, pensamentos e sentimentos, além de sua cultura e o contexto social em que ela se moldou. Como é possível que um moleiro do interior da Itália do século XVI tenha desenvolvido uma teoria tão complexa e crítica contra os mais diversos dogmas da igreja católica.
Menocchio viveu em uma época conturbada com a invenção da imprensa que possibilitou a rápida impressão e circulação de livros em língua vulgar, a Reforma Protestante de Lutero e a Contrarreforma da Igreja Católica da qual foi vitima.
Para Ginzburg, Menocchio já possuía uma cultura oral camponesa que moldara sua visão de mundo e quando ele entrou em contato com a cultura escrita houve um choque que o induziu a formular opiniões singulares. Um exemplo disso são os mais diversos exemplos de que ele se utiliza para explicar suas teses aos inquisidores, repletos de analogias ao seu trabalho.
Apesar de ler os livros, parece que Menocchio se valia apenas do que lhe dizia respeito, ou seja, suas leituras eram deformadas, mas de forma inconsciente. O autor acredita que o que ocorria era que o moleiro se servia de trechos de diversos livros para validar suas opiniões já formadas pela cultura oral.
Isso mostra como sua reflexão é bem pessoal, apesar de receber estímulos dos livros e das conversas com viajantes. Todas as diversas idéias que ele recebe são processadas em seu cérebro formando assim sua visão única de mundo.
Fechando assim com a idéia de que Menocchio, como diz Carlo Ginzburg logo no inicio do livro é um personagem singular e não representativo, recusando a delimitá-lo respeitando assim sua originalidade, que tanto causou espanto entre os inquisidores.
Esta é a história de Menocchio, um homem simples de uma cidade pequena do interior da Itália, que impressionado pelo que sabia e pelo que lera, teve coragem de blasfemar contra a igreja católica durante o peírodo Contrarreforma. E que graças a Ginzburg e a, se assim podemos dizer, igreja Católica (que guardou toda a documentação deste período) conseguimos conhecê-lo.

Sites consultados:
http://www.infoescola.com/biografias/carlo-ginzburg/ acessado em 04/01/2012
http://pt.wikipedia.org/wiki/Microhist%C3%B3ria acessado em 04/01/2012

Bibliografia:
BURKE, Peter (org.): A Escrita da História. São Paulo: Editora UNESP, 1992, 360pp.
GINZBURG, Carlo: O Queijo e os Vermes; o cotidiano de um moleiro perseguido pela inquisição. São Paulo, Companhia das Letras, 2006. 255pp.
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