Polly 06/05/2020
Harry Potter e a Câmara Secreta: qual livro fez você se reconhecer como leitor? (#111)
Eu fui uma criança solitária (e desconfio que ainda sou). Não que eu não tivesse amigos ou coisa do tipo. Sim, eu os tinha. Mas, ser filha única e crescer num bairro de periferia nos anos 90 deve ter feito minha mãe redobrar os cuidados, então sempre tive que ficar mais em casa.
Nunca me importei com a solidão, sempre soube conviver com ela. Apesar de ser uma pessoa difícil (e como!), sempre gostei da minha própria companhia. Estar sozinha era minha licença para imaginação (e ainda o é, eu só resolvo meus problemas no silêncio). A solidão fez de mim uma pessoa criativa. No entanto, não foi só ela a responsável por isso, os livros também desempenharam seu papel. Minha mãe, com seu salário de professora, sempre fez questão de separar uma parte (sacrificada) dele para comprar livros para mim. Cresci em meio a eles. Ajudaram-me a viajar sem tirar os pés do chão nas minhas brincadeiras solitárias. Porque, sim, ler para mim era um tipo de brincadeira.
Mesmo diante dessa realidade, eu só fui me enxergar como leitora um pouco mais tarde, quando eu já estava saindo da infância, aos 11 anos. Foi nessa época que, pela primeira vez, eu peguei um livro de Harry Potter nas mãos que, no caso, era justamente A Câmara Secreta. Despeitada como eu era, só decidi lê-lo porque tinha uma amiga que amava os filmes e eu os achava uma droga. Eu leria só para provar que aquilo definitivamente não prestava. Quebrei a cara. Bonito. Foi a primeira vez que eu percebi o quanto eu gostava de ler. Hoje, eu tenho 27 anos e já li inúmeros autores, muitos de peso, como Gabo, Brontë, Woolf e Beauvoir, mas Harry Potter nunca saiu da minha lista de preferidos, pois se não fosse por ele, talvez não viesse todos os outros depois dele.
Acompanhar Harry, Rony e Hermione em busca do herdeiro de Slytherin me deixava ansiosa para chegar em casa da escola e me agarrar em todas as linhas, palavras e letras escritas naquele livro. Eu sonhava com os corredores de Hogwarts, e ficava extremamente irritada com Snape sendo tão mau com Neville, e angustiada com Hagrid sendo levado preso por uma coisa que ele claramente não tinha feito (gente, Hagrid tão bom... com o coração proporcional ao próprio tamanho, impossível de ser ele). A Câmara Secreta definitivamente me mostrou o poder da literatura. E a literatura me ensinou a conviver comigo mesma, a escutar os silêncios da vida. E a ser imaginativa também, porque tem dias que só com imaginação é possível acordar com coragem na manhã seguinte.
Enfim, A Câmara Secreta fez com que eu me reconhecesse leitora. Devo muito do que sou a esse livro. Por causa dele, vieram os muitos outros livros que me fizeram sonhar, acreditar no Amor, ser resiliente (o quanto dá, porque ninguém é de ferro e a gente surta, sim) e tantas outras coisas. A amiga? Eu nem tenho mais e desconfio que ela nunca passou dos filmes, mas não sabe ela que me deu um dos meus melhores refúgios na vida.
P.S.: Incrível com Hermione salva o dia mesmo petrificada!