Diego Lunkes 15/08/2018
Um dos benefícios que a leitura pode proporcionar é apresentar assuntos com os quais você dificilmente entraria em contato no seu dia-a-dia. Ler sobre determinado assunto é ter um vislumbre de ideias, sentimentos e experiências pessoais de um autor, narrador e/ou personagem. Talvez nenhum outro gênero aprofunde tanto este quesito quanto biografias. Neste sentido, a biografia de Esther Earl Grace se destaca por apresentar sua vida não somente nas palavras da própria autora, mas também em um mosaico com diversas fontes, além de transparecer verossimilhança através de seus relatos.
Talvez o nome de Esther não desperte nenhuma lembrança na maioria das pessoas, mas basta citar a personagem Hazel Grace do livro "A Culpa é das Estrelas" para perceber como um número considerável de pessoas conhece, em parte, a história de sua vida, ainda que não saibam disso. Contudo, embora o romance de John Green tenha sido parcialmente motivado pelas experiências de Esther, é importante ressaltar que o livro não reproduz (ou sequer tem a pretensão de reproduzir) a vida da garota e que, mais importante, Esther Earl não é Hazel Grace, nem Hazel Grace é Esther Earl.
Diagnosticada com câncer de tireoide aos doze anos, Esther Earl Grace decidiu por registrar sua jornada de combate à doença. Mas seu livro é mais do que isso. Nas palavras da própria autora "é uma história sobre uma garota que encarou uma experiência que mudou sua vida conhecida como Câncer de Tireoide. Esta não é uma daquelas histórias dramáticas do tipo ‘baseado em fatos reais’, especialmente porque Câncer de Tireoide não é um dos piores tipos de câncer. Este é uma história sobre mim, Esther Earl, enfrentando uma doença muito assustadora."
Essa veracidade proposta nas primeiras palavras, aliás, permeia o livro como um todo, a começar pelo fato da publicação acertadamente ter mantido os textos tal qual foram escritos, sem se preocupar com hipercorreções a fim de padronizar e formalizar a escrita. E não menos verossímeis são os relatos sobre o dia-a-dia de Esther, que englobam desde procedimentos detalhados sobre seu tratamento até entradas curtas e simples sobre dias de ócio. Este contraste ajuda o leitor a compreender que sim, a vida de Esther possui muitas situações peculiares, mas não, a vida de Esther não é definida apenas pela sua condição, nem tampouco é Esther.
A verossimilhança ainda está presente na variedade de relatos. Esther nos é apresentada sob seu próprio ponto de vista, mas também sob a visão de familiares, de amigos próximos, de amigos virtuais e da doutora responsável pelo diagnóstico e tratamento. Este leque de personalidades, de alguns relatos mais superficiais e de outros mais profundos, ajudam o leitor a combinar as diferentes informações, permitindo criar uma visão de Esther multifacetada, tridimensional e mais próxima da realidade.
As fontes das informações, por sua vez, corroboram para imergir ainda mais o leitor na vida e na pele da garota. Entradas de diários, posts de blogs, cartas, histórico de conversas online, bilhetes. Tudo isso fornece dicas sobre como Esther escrevia em diferentes situações, sobre o que costumava pensar, sobre opiniões a respeito dos mais variados assuntos.
O livro ainda exibe uma diagramação propositalmente elaborada para criar a impressão de se ter um diário em mãos. As páginas coloridas transmitem um tom infantil e inocente que combina com a personalidade de Esther. As fotografias em abundância ilustram momentos íntimos e descontraídos (fotografias que, por sinal, às vezes se encontram deslocadas no layout, como estivessem coladas na página). Mudanças de fonte e tamanho de letras marcam os diferentes tipos de textos. Alguns textos pessoais são acompanhados de uma fotografia do texto original, como a fotografia de uma carta, permitindo admirar a caligrafia de Esther. Desenhos, colorações, rasuras, erros gramaticas e semânticos são mantidos inalterados para que se mantenha o sentido que se pretendeu passar pelas palavras.
A biografia de Esther se afasta do jeito tradicional de se fazer biografia. Isto é, relatos que, por mais profundos e completos que sejam, sempre estão limitados à visão de um autor. Ao invés disso, "A Estrela Que Nunca Vai Se Apagar" compila uma ampla gama de informações, combinando a profundidade de ideias e sentimento vindos das palavras da própria autora com visões externas de entes próximos, o que cria uma visão mais rica, honesta e imersiva. É claro que no meio destes relatos encontram-se diversas passagens sobre fatos corriqueiros que podem cansar o leitor por apresentar nada de relevante. Mas esse é justamente um dos méritos desta biografia: retratar a vida como ela é.
site: https://barbaliterata.wordpress.com/2018/08/15/a-estrela-que-nunca-vai-se-apagar/