Mandy 21/01/2019
Estamos mais perto desse futuro distópico do que imaginamos...
❝ As águas mudam conforme a lua, abraçam a terra, não têm medo de morrer no fogo ou viver no ar. ❞.
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Memória da Água nos apresenta um mundo distópico, onde as guerras acabaram com muitos recursos que o mundo possuía, sendo o principal deles a água. Como consequência das ações humanas, as geleiras derreteram e os oceanos avançaram, levando não só a água potável, mas também a historia e conhecimento das gerações passadas. Agora os militares são os donos da água, quem controla as poucas fontes que sobraram e distribui aos vilarejos e cidades em pequenas cotas.
Noria Kaitio vive nesse mundo. Aprendiz de seu pai, o mestre do chá, ela se dedica ao ritual assim como toda a sua família um dia fez. Quando a vida deixasse o corpo de seu pai, ela assumiria a profissão de mestre do chá e conduziria as cerimônias no vilarejo. No entanto, o que Noria não sabia, é que junto do título vinha uma responsabilidade ainda maior. Cada mestre do chá era também guardião da água em segredo. Eram responsáveis por cuidar de uma nascente, que produzia água fresca e potável para realizar as cerimônias tradicionais.
Noria era muito nova quando todas as responsabilidades recaíram sobre ela. Era ingênua, envergonhada, inexperiente e altruísta. Não tinha nenhuma outra orientação além do ritual dos chás e que a nascente era uma fonte que ninguém mais poderia saber sobre. Logo, era previsível que ela iria cometer erros grotescos até aprender algo. E gosto da evolução dela, ainda que não tenha perdido a ingenuidade por completo, Noria amadurece significantemente e tenta contornar os erros que cometeu, ainda que soubesse que muitos deles não tinham mais volta e que estava fadada a um destino breve e sombrio. Não consigo desgostar da personagem ou culpar ela inteiramente pelos acontecimentos que sucederam o final do livro. Em um mundo como o dela, onde pessoas definham por falta de água, seria impossível manter um segredo tão pesado sozinha. Ainda mais quando as poucas pessoas que restaram presentes em sua vida sofriam diretamente com isso. Ao meu ver, suas escolhas foram compreensíveis, ainda que fosse óbvio que, mais cedo ou mais tarde, ela teria um círculo azul pintado na porta de sua casa.
Sobre o plot, ele não me incomodou por nenhum segundo. Não tem envolvimento romântico ou suspense durável. O drama se desenvolve no segredo da nascente, e na sociedade castigada pelas ações humanas passadas. O livro foi escrito como uma crítica a maneira que preservamos o meio ambiente. A mensagem é bem clara desde o começo do livro. Esse futuro mostrado por Emmi não está tão longe quanto o leitor imagina. O que mais ouvimos é sobre desastre ambiental, poluição, desmatamento e aquecimento global, mas não damos atenção o suficiente para o assunto. A prova disso é que o livro foi publicado em 2014, e quase cinco anos depois, temos países saindo de acordos de preservação em vez de outros aderirem.
Finalmente, a escrita de Emmi Itäranta. A linguagem poética adotada pela autora fora, sem dúvidas, uma das melhores partes da leitura. Os sentimentos da personagem principal, o desenvolvimento da história do pai, os detalhes das cerimônias do chá, todas as descrições feitas, de forma impecável, me deixaram fascinada. Se caso a história ou as personagens não tivessem me cativado, a escrita definitivamente me manteria conectada ao livro até o fim.
Memória da Água foi uma leitura que me teve do inicio ao fim. Um livro que me fez refletir sobre a minha própria vida e as escolhas que tomo. Não tenho dúvidas que levarei comigo. E espero que todos os que leram, ou que irão ler, levem consigo também.