Adriana Perrone 14/08/2023
A queda do céu
Publicado originalmente em francês em 2010 e lançado pela Companhia das Letras em 2016, A queda do céu é um livro de não-ficção que nos apresenta o incrível relato do líder Yanomami Davi Kopenawa, gravado e transcrito pelo etnólogo Bruce Albert.
Preparem-se para mergulhar nesse incrível calhamaço de 729 páginas com extensos capítulos, anexos - onde um deles nos dá uma noção sobre etnia, língua e ortografia e também um breve apanhado sobre os Yanomami no Brasil. E um breve texto intitulado “O massacre de Haximu” que me deixou completamente devastada com tamanha brutalidade e violência. Além de um glossário etnobiológico e geográfico, fotografias e mapas.
O livro é dividido em três partes. Na primeira, “ Devir outro”, nos é apresentado Omama, considerado pelo povo Yanomami, o criador da terra e das florestas. Vamos também conhecer a história de como nasceu o primeiro xamã, que pra mim foi um dos primeiros trechos do livro que me deixou impressionada, de quão incrível é essa história. Ainda na primeira parte do livro, um capítulo é dedicado aos xapiri, que são os guardiões invisíveis da floresta, os espíritos que visitam os povos Yanomami. Davi faz um relato sobre sua infância e de como parte de seu povo foi dizimada por epidemias propagadas pelo homem branco.
Kopenawa também nos revela sua experiência ao tomar o pó de yãkoana e como foi seu processo de iniciação para se tornar um xamã.
A segunda parte, “A fumaça do metal”, descreve o encontro do povo Yanomami com os brancos. Kopenawa conta sua experiência de convivência com missionários que passam a viver aos arredores e como essas missões cristãs interferiram na vida e na cultura de todo o povo da comunidade Yanomami. Davi se mostra revoltado com essas pessoas, mas não se deixa influenciar. Vale também destacar que nessa parte do livro, o povo Yanomami sofre muito com a violência provocada pelos garimpeiros que invadem seu território, deixando um rastro de destruição.
Na terceira parte do livro com o subtítulo “A queda do céu”, o autor nos apresenta a trajetória e a luta de Davi para denunciar o extermínio de seu povo e a devastação da floresta. O desejo de Kopenawa é que sua voz seja ecoada aos quatro cantos e especialmente que seja ouvida pelo homem branco. Ele faz um apelo sobre os perigos iminentes em continuar com a exploração dos recursos naturais e das florestas.
O tamanho do livro pode causar certo receio para iniciar a leitura. Mas não deixem que isso interfira na sua decisão de ler. Garanto que não irá se arrepender com quão incrível é essa leitura. Por ser uma narração transcrita, a leitura pode parecer um pouco cansativa no início, mas no decorrer das páginas vamos nos envolvendo com a quantidade de conhecimento que é absorvido e o quão interessante é o tema, que a leitura começa a fluir rapidamente.
É uma leitura extremamente rica de relatos, de cultura e de visão de mundo que nos faz refletir e repensar sobre as atitudes predatórias da nossa civilização.
Foi uma leitura que me deixou completamente devastada com certos relatos, mas ao mesmo tempo fiquei maravilhada com tamanha sabedoria que Kopenawa nos proporciona nesse livro.
“Enquanto os xamãs ainda estiverem vivos, eles poderão evitar a queda do céu, mesmo que ele fique muito doente”