Pandora 06/08/2017
Não é novidade o quanto o tema deuses, divindades e milagres causam fascínio e encantamento. O "Pensamento Mitológico" foi a primeira forma de explicação para a realidade criada pelos seres humanos. Não por acaso, mesmo hoje, com todos os nossos adventos tecnológicos e explicações cientificas para isso e também aquilo, a figura dos deuses continue nos fascinando. O poder, a grandiloquência, a força dramática e expressiva atribuída aos deuses são imãs para a nossa atenção.
Partindo dessa força de atração exercido por narrativas mitológicas Kieron Gillen, Jamie McKelvie e companhia criaram o argumento central para a HQ "The Wicked + The Divine" na qual se conta a história de divindades saídas dos diversos panteões do mundo aparecem no Planeta Terra de 90 em 90 anos com o objetivo de criar inspiração através de milagres, maravilhas e muito tumulto por exatos dois anos, depois disso eles morrem e o ciclo retorna.
"A Lei de Faust", vol. 1 de "The Wicked + The Divine", nele nós somos apresentados ao ponto inicial da história, seu argumento, aos personagens e seus tons e formas. Esse primeiro volume em si é um triunfo em termos visuais e uma alegria em termos narrativos. É muito agradável a maturidade do texto e da arte apresentada. Salta aos olhos a diversidade étnica e de gênero dos protagonistas da história.
A partir do volume 1 não posso dizer para onde essa HQ vai, mas seu ponto de partida é instigante. A HQ é um legitimo produto da ânsia e luta por visibilidade protagonizada por pessoas negras, trans, homossexuais, bissexuais, travestis etc. Nele encontramos de forma respeitosa, real e clara personagens desses grupos a começar pela capa na qual uma jovem negra toma conta da página inteira.
Quanto a história, como já foi dito, aqui se parte do pressuposto de que os deuses são imortais mas não podem ficar para sempre no mundo dos vivos. Exceto por Ananke, responsável por orquestrar o despertar e o fim da estadia dos deuses no planeta, todos tem sua presença limitada a exatamente dois anos. Quando esse tempo acaba eles devem se suicidar. No entanto, durante o atual ciclo, ocorre algo estranho dentro do "Panteão dos Deuses", algo com cheiro de traição, um dos deuses precisa sai de cena prematuramente e uma humana meio maluca decide investigar o que há por trás disso.
Há muitas coisas não explicadas nesse volumes, mil e um mistérios ficaram no ar e as personalidades dos deuses apenas começaram a ser exploradas. Lúcifer, Odím, Sakhmet, Minerva, Baal, Amaterasu, Ananke, Morrigam, Inanna, Baphomet foram as divindades apresentadas nesse primeiro volume, mas poucas tiveram realmente um espaço no palco da ação.
Os holofotes estiveram apontados para Lúcifer, ou Lady Lucy, que nessa encarnação é uma figura andrógena, questionadora, bastante carismática, inspirada em David Bowie, tal como o/a Desejo dos Perpétuos. Também se destaca a figura Baal, o deus babilônico aparece com todo porte altivo de um jovem negro bem sucedido no auge de sua carreira e cara de multimilionário hahaha... Além deles, Morrigan, como uma divindade ligada a arte cujo lugar de atuação é o submundo do metro aparece um pouco mais que os outros personagens do panteão divino.
Tanto a arte quanto o roteiro de "The Wicked + The Divine" é fortemente inspirada na obra de Neil Gaiman. É muito difícil ver uma história sobre deuses entre mortais no século XXI e não pensar em "Deuses Americanos" e em toda HQ há uma destacada presença de temas e formas vistas em "The Sandman". Ainda que com menos força e maturidade narrativa, em todos os locais da HQ se sente a presença e inspiração dos Nove Irmãos Perpétuos criados por Gaiman.
Apesar de não conseguir pressentir para onde essa história vai ou se ela vai avançar e se aprofundar nas coisas que pretende discutir, pretendo seguir com ela. Se a trama não se adensar e alcançar tons mais profundos como ocorreu em The Sandman, ainda terei em minha estante uma obra na qual os autores procuraram da visibilidade a quem merece ser visível. Esse tipo de projeto precisa ser estimulado.
site: http://elfpandora.blogspot.com.br/2017/08/the-wicked-divine-lei-de-faust.html