whoisreavy 04/02/2023
Carta de amor a Shakespeare
Este livro foi a minha primeira experiência com o estilo dark academy, e eu não poderia estar mais satisfeita. De certa maneira, mesmo sem saber, a intrigante história desses sete jovens ?shakespearianos? me envolveu em um abraço poeticamente perturbador. E foi maravilhoso.
Há diversas camadas neste livro, e preciso elogiar a escrita. Uma rápida pesquisa me confirmou o que eu já imaginava: além de escritora, ela também é atriz e possui mestrado nos estudos de Shakespeare. Claro, ela usou esse conhecimento totalmente ao seu favor, e é fato que para se entender a história, é preciso entender (ou, no mínimo, querer entender) Shakespeare. Poderia se dizer que Shakespeare é o protagonista desta história, mas eu interpreto que o papel principal aqui é de Péricles, de ?Príncipe de Tiro?. Mas chegarei a isso mais à frente.
A autora teceu uma intrigante teia na trama de todos os personagens através da literatura inglesa e principalmente das palavras de Shakespeare. Já li algumas peças dele, mas ainda assim me senti meio despreparada pela quantidade de informações que talvez eu estive perdendo nas referenciações. Mas também não é nada que te tire da imersão. Uma simples pesquisa te recoloca no centro dos acontecimentos.
Este livro vive de Shakespeare, da mesma forma que os sete personagens foram hipnotizados por ele. O drama, a tragédia, a fúria, inveja, dor, amor, ressentimento, está tudo lá. É extremamente fácil se perder em outra pessoa quando você se recusa a aceitar a si mesmo. Porém, no caso desse grupo de amigos, aconteceu diferente: eles assumiram os papéis que forçaram a eles desde a primeira peça, e depois não conseguiram parar de fingir. Quando o primeiro vento da mudança chega, ele é forte o suficiente para derrubar o Castelo que eles dividiam (literalmente).
Quem nunca passou por isso? Em qualquer grupo, qualquer interação, qualquer rede de pessoas ou ambiente, sempre haverá um papel para te classificar. E quanto mais esperam certa atitude sua, mais você se vê inclinado a forçar essa personalidade. Afinal, estamos todos desesperados por aceitação. Não existe dois galãs ou dois vilões. Este jogo de estereótipos pode ser chato, mas a autora o utiliza bem, pois deixa claro desde o princípio quem é quem. E ela toma seu tempo para lentamente desenvolver e aprofundar as camadas de cada personagem, revelando que o buraco vai mais fundo.
As relações desses amigos é um dos pontos fortes. Muito sobre eles está no não-dito, e os papéis que eles representam das peças de Shakespeare ao longo da obra faz esse trabalho de desenvolvimento.
O que me faz voltar aos estereótipos. Quando te forçam a sair do seu lugar seguro, pode ser desesperador. Em um mundo que respira a dramaticidade shakespeariana, ações extremas se tornam normais. Tudo é justificável quando se dito com poesia o suficiente.
Mais do que as outras peças, é Péricles que movimenta a história de Oliver (e por consequente a de James). Uma citação da peça ou do personagem está sempre lá, em diversos cantos durante a história. O final me perturbou tanto que retomei diversos trechos para me ajudar a entender. E eu entendi (eu acho?!)
Ainda assim, não sei ao certo como me sinto em relação ao final. É agridoce, claro, mas também muito rápido. Parte de mim queria algo diferente, algo a mais. Algum tipo de reencontro mais justo. Mas claro, era isso que Oliver e os outros queriam também.
De toda maneira, a abertura ao desejo do imaginário é algo que conforta o que seria inconfortável. O leitor termina sonhando com uma possibilidade, com um eterno ?talvez? romântico. O que é mais Shakespeare que isso?