Kaktus 22/02/2023
Maravilhosamente complicado. Real, humano, perverso.
SEM SPOILER:
Variações Enigma com certeza me surpreendeu muito. Nesse livro vc viaja para a Itália, visita Nova York e ai recebe de presente um protagonista com a mente quebrada e personalidade duvidosa. Eu diria até que o nome desse livro deveria ser "as traições de Paolo" ksksk brincadeiras a parte.
Já havia lido "Me chame pelo seu nome" antes e não comecei essa nova leitura comparando os dois livros; no fim, de qualquer forma, isso me fez descobrir nuances novas nessa obra que não existiam em MCPSN.
Começando pelos plot Twists. Os plots se tornaram comuns em todos os capítulos. Eles tinham o propósito se trazer finalidade e eu realmente gostei, nunca vi o André fazer algo assim; nunca havia um grande plot em Me chame pelo seu nome e isso me surpreendeu.
Como sempre, André Aciman fala especialmente de desejo, como em todas as suas obras. Mas o mais divertido aqui nesse livro é que cada capítulo, por parecerem mais crônicas soltas do decorrer da vida do personagem, traz um sentimento a mais, uma emoção diferente, uma nova loucura de Paolo; e além do mais, trás novas percepções de mundo do personagem que vai envelhecendo conforme dos capítulos se passam.
Algumas pessoas dizem que os últimos capítulos foram se tornando mais chatos. Eu concordo em partes. Acho que na verdade foi o plano do André Aciman: decair a vida do personagem, a tornar rotineira, mostrar que ele está ficando mais velho e que ele não é o mesmo Paolo do primeiro capítulo do livro. Tudo começa amarelo, e de repente vai descendo, decaindo, vem as dúvidas, as obsessões, as manias, as fanfics (ele faz simplesmente fanfic com todos por quem ele se apaixonou) e para mim isso foi brilhante.
Indico o livro por ser um amarrotado de crônicas tão humanas e reais que nos enche de perguntas e nos faz pensar: Paolo está maluco.
COM SPOILER:
O primeiro capítulo é meu preferido. Eu amo verões na Itália, amo casarões, amo essa vibe MCPSN. Nesse primeiro capítulo Paolo se apaixona pelo marceneiro da cidadezinha onde ele passa os verões com a família. Nanni, o marceneiro, não dá bola para ele (obviamente) apensar de começarem a passar momentos juntos por Paolo forçar isso.
Esse capítulo tem uma diferença de Idade muito grande entre os dois (lembrando que eles não se envolvem nem sex'ualmente e nem romanticamente). E sinceramente, gosto do fato do André ter a cara de pau de retratar assuntos que são tabu, que são condenados e não são discutidos ou retratados em livros, porquê como ele fala do desejo humano e as nuances da humanidade sabemos que ele vai usar algo do tipo para deixar tudo mais cru e talvez trazer polêmica: ele quer testar você e saber se você tem mesmo cabeça para pegar tudo que ele escreve e não se limitar ao superficial. Ele quer que vc leia as entrelinhas.
Em Me chame pelo seu nome a diferença de idade era a construção de uma metáfora Naturalista (literatura naturalista). Mas aqui ela é apenas uma simples diferença de idade. Nada tão poético.
Nannie nos é apresentado delicadamente. Paolo está com 12 anos e Nanni é para ele um exemplo a ser seguido. Um modelo. Paolo, muito sozinho e sem amigos (assim como os personagens mais novos do A. Aciman), deseja que Giovanni seja seu amigo, quase que um pai. Ele sente desejo sexual, como nós, seres humanos, sempre sentimos quando nos apaixonamos por alguém independente da idade. Mas ele não percebe, não sabe o que é aquilo ou porquê ele se sente assim, é tudo muito novo para ele e ele não sabe lidar.
Apesar disso, ele vê em Nanni uma oportunidade de proteção. Uma figura paterna; ele confia em Nanni de olhos fechados. Paolo se pega confuso e machucado quando forja momentos com o Nanni, como quando ele achava que Nannie o desejava tanto quanto ele (E amo como o André faz esses jogos de "seria amor? Ou seu psicológico está doente?). O plot twist desse primeiro capítulo é simplesmente inacreditável. Eu quase pulei da cadeira e tive que esperar alguns minutos para me recompor.
O segundo Capítulo, chamado "Entusiasmo de primavera", é uma loucura. Paolo, nosso protagonista, namorando Maud e durante todo o capítulo ele acha que a mulher está o traindo com um colega de trabalho. Ele imagina, cria em sua mente confusa situações em que ela o trai e fica na cara a obsessão que ele tem; não por ela, mas para com a traição. Esse capítulo trás não só desejo, mas trás também dúvidas, fala de desconfiança, amores no ápice de seu fim e bissexualidade não explícita.
Lendo esse capítulo tive a certeza absoluta que nosso personagem não está sadio dos documentos mentais.
Ah, esse terceiro capítulo é divino. É o melhor que temos (para mim) e é deliciosamente perturbado. Paolo se pega apaixonado por Manfred, um companheiro de jogo de tênis. Ele se vê tão imerso em seu desejo por esse homem que parece descrever pele, ossos, músculos e articulações do homem. Esse capítulo, diferente dos outros, é narrado em segunda pessoa, como na série da Netflix 'YOU' (nunca li os livros), e eu achei isso brilhante! É diferente dos outros capítulos do livro e trouxe muito à tona a obsessão. Eu amei de coração esse capítulo, eu amei.
Amor estelar. Esse é o nome desse novo capítulo. Sabe aquele amor orgânico? Aquele que passa anos e anos e ele ainda existe pq é tão verdadeiro que faz questão de não sair de sua cola? O tipo de amor que mesmo não alimentado continua existindo? Eu sei muito bem como é pq eu tenho um amor assim, e por essa razão me identifiquei tanto com esse cap. Chloe, a mulher por quem Paolo é apaixonado, é uma mulher negra e o que mais achei interessante foi a forma como o André especificou a cor da sua pele: "pele cor de hematoma". Achei meio grosseiro, mas falo delicado!? É uma coisa que eu nunca pensaria para descrever uma pele preta arroxeada, cor de açaí, e achei incrível, me prendi a essa parte. Chloe sempre existiu nos capítulos anteriores (menos o primeiro) mesmo que Paolo não tenha falado ela. Ela sempre esteve lá na mente dele e nós nem sabíamos e achei isso fascinante. Foi um capítulo meio chatinho de ler, mas gostei muito do final, gostei muito de como os capítulos começaram a se misturar e a história de Paolo ganhar forma.
Agora chegamos ao último capítulo. Simples, pequeno. Dá para perceber que ele não está no livro para encher linguiça, mas sim para dar um significado ao final. O final é surpreendente, fiquei novamente minutos inteiros pensando sobre o livro e toda a história de paolo e de repente me vi perdida e devastada: como pode um homem ser tão devasso assim? Tão doente, que vida miserável. Ele poderia ter feito escolhas melhores desde o começo de sua vida, mas não fez. Lembrem-se da pobre Claire.
(Desculpe algum erro de português, tenho muitas outras resenhas para fazer kssk)