leiturasdemadu 25/07/2023
Uma expoente crítica social
Melancólico e muito atual, o livro trata um pungente trauma amoroso resultado de um relacionamento abusivo. Ele é narrado pelos devaneios e ações de Renée Néré, mimóloga e dançarina de um café-concerto.
A obra ocupa páginas a dialogar sobre a dificuldade de se entregar à um novo relacionamento, uma vez que a pessoa foi dolorosamente machucada romanticamente. Renée conheceu a traição através de Adolphe Taillandy ? seu primeiro amor e com quem foi casada por 8 anos.
No desenrolar da história, ela acaba por se apaixonar por Maxime Dufferein-Chautel, um homem que quer ofertar o que, para ele, é tudo de mais suficiente: uma vida conjugal blindada por muita riqueza e promessas. Em dado momento, Renée põe fim a tudo quando se vê refém do medo de se entregar ao desconhecido, pelo pavor obsessivo sobre a perda de sua jovialidade, por se enxergar insuficiente para Max e pela tênue entre a repulsa ao homem e o desejo de ?ser dele?.
Nas entrelinhas, a obra conta a história de uma mulher de princípios nos quais, à época, a faziam ser incapaz de reconhecer o machismo como natural.
Renée conheceu mais de perto essa opressão quando decidiu se separar de Taillandy, sendo muito julgada pelo que fez ? o que culminou em seu isolamento social pela dor da mágoa e das críticas. O mesmo machismo vinha até de Maxime.
Aliás, ele é um homem de prestígio social e que não trabalha, enquanto Renée se enquadra na posição de burguesa que dispensa ?o corre?. Ela já se tratou como ?v4g4bund4? e isso faz pensar como existe um peso para duas medidas: por que não, Max, também um?
O título fala sobre um casamento abusivo, mas também sobre um novo amor duvidoso em palavras e atitudes. Max não demonstrou uma só vez a sua agressividade física ao discutir com Renée, e cansou a cota de decidir, por dois, como seria a vida deles. Mostra a posição de inferioridade e de recatado silêncio que ele a mantinha, sutilmente, maquiado por palavras doces e atitudes gentis.
Fala ainda sobre como era vista a mulher livre na sociedade: muitas retratadas como libertinas, somente viviam a plena solteirice e exploração sexual tal qual homens ? mas estigmas caem somente ao lado feminino.
Por fim, tem a linearidade difícil de acompanhar se não houver atenção, já que os fatos narrados mudam abruptamente. Ele contém ainda, por vezes, um linguajar racista. Ainda que possa ser uma crítica anacrônica, foi amargo de ler. Tem marcas expressivas de uma antiga forma de escrever, possível de ver nas pontuações e expressões coloquiais. Acompanha um tema que ainda atravessa a sociedade atual!