spoiler visualizarMariana113 17/01/2024
Agridoce
Adam Gordon é um jovem poeta norte-americano que, graças a uma prestigiosa bolsa de estudos, muda-se para Madri, pelo período de um ano, com o objetivo oficial de completar um projeto de pesquisa.
Adam é uma personagem bastante caricata. Sofre de uma gama de vícios, um sentimento de não pertencimento e descolamento, de uma dificuldade notável com o idioma que não é familiarizado, narcisista ao ponto de não enxergar ao outro e sempre preocupado com a imagem que quer externar.
A narrativa é organizada de acordo com as ?fases? do projeto de Adam que, por sua vez, exprimem etapas de acontecimentos bem distintos que Adam vivencia.
O protagonista tem a característica de estar sempre imerso em seus pensamentos, em suas inseguranças e projeções, ao passo que, em busca de uma experiência autêntica, acaba se afundando num profundo descolamento de si, do ambiente e pessoas ao seu redor, do próprio momento histórico que vivencia.
É bastante pessoal essa identificação com Adam. Amar odiar o personagem e querer insistir em entender como a trama poderia se desenrolar me manteve insistente na leitura, ao passo que um revirar de olhos aqui e ali eram inevitáveis.
Como estudante de espanhol, achei engraçado e compreensível a dificuldade com o idioma, e como essa barreira linguística abre tantas interpretações diferentes para os diálogos entre Adam e os demais personagens de Estação Atocha. Porém, Adam se utiliza dessa aparente dificuldade como traço de personalidade, não querendo perder esse limbo linguístico no qual se apoia como forma de justificar uma aparente incompetência, um afastamento de si daquele novo ambiente em que estava inserido, ou até mesmo como se fosse ser mais interessante, soasse mais misterioso e abstrato podendo se expressar com diversos furos e talvez até soar mais poético.
Isso, no entanto, nos dá uma interpretação tão ambígua dos personagens que acompanham Adam, como Isabel, Teresa, Arturo e Rafa. A relação com todos eles não é consistente, não é explorada com interesse, já que Adam, tão distante do agora, parece não se importar realmente com essas personagens, o que é irônico quando se vê apaixonado tanto por Isabel quanto por Teresa. Parece que o que mais o agrada é o sentimento de racionalizar esse sentimento, principalmente da parte delas, e ser desejado, ou acreditar que é desejado.
O final me decepcionou um pouco, principalmente depois do quão frenético o livro se torna quando há o ataque terrorista na Estação Atocha, da qual Adam dá meia volta, enfrentando o movimento contrário da multidão, só dando mais enfoque ao quanto ele se sente um impostor, deslocado, a ponto de voltar para seu apartamento e vivenciar lá de dentro esse acontecimento, quando ele está acontecendo ali, no entorno dele.