Leonardo Fuerback 13/03/2020
O Impostor que Sou/Não Sou
Imagino que qualquer pessoa ao ler este romance acabe por se identificar com a sensação de que você está onde está por sorte, que os outros que insistem em afirmar sua capacidade para o que quer que seja estão, sempre, prestes a descobrir a fraude que você é. O autor dá a entender que, além de outros transtornos mentais possíveis, o personagem principal sofre de síndrome do impostor e a dúvida sobre sua capacidade para “ser poeta” é constantemente posta em xeque da primeira à última linha.
Estação Atocha, de Ben Lerner, é um romance que te deixa se identificar com o poeta Adam, ao mesmo tempo em que te faz duvidar se ele realmente é um poeta. Entre dúvidas que Adam lança sobre tudo que escuta ou fala, escondendo-se numa suposta não fluência da língua espanhola, nós, leitores, nunca temos certeza do que realmente está acontecendo na sua vida e do que é, de fato, fantasiado. E isso nos transporta para dentro da obra não como expectador, mas como personagem, tomado pelos mesmos medos e angústias e tentando decifrar cada linha de diálogo.
Apesar de não ser inédito um livro sobre personagens escritores, talvez valha a pena dar uma chance a obra justamente por trazer o tema sob uma perspectiva que, diferentemente dos seus símiles, é capaz de levar o leitor a uma identificação com as suas próprias angústias e dúvidas pessoais. Numa sociedade que exige uma luta ininterrupta, individual e solitária de se provar ser o/a melhor, é um mérito louvável conseguir traduzir isso em um romance como Estação Atocha. Como Adam por vezes parece ver sua vida como um expectador, olhando-a de cima, o leitor consegue ver nele suas próprias angústias e, assim, talvez, acabar por entender a si próprio um pouco melhor.
“[...] que eu fosse um impostor ninguém podia duvidar – quem não era? Quem não desempenhava de maneira ilegítima um dos poucos papéis pré-fabricados postos à disposição pelo capital, ou como quisermos chamá-lo, mentindo descaradamente cada vez que dizia ‘Eu’, quem não atuava, pelo menos como figurante, no comercial informativo, reprisado obsessivamente, sobre as injustiças da vida?”. (p. 122).