Analuz 27/09/2021
Em "O Perfume", acompanhamos o protagonista Jean-Baptiste Grenouille desde o seu nascimento, que, aliás, se deu nas condições mais inóspitas possíveis e marcou o seu primeiro abandono: o materno. Filho de mãe peixeira, o garoto nasce e é abandonado ali mesmo no mercado, pois a mulher acreditava que daria à luz um filho natimorto.
Ao logo de seu crescimento, o garoto passa por diversos locais, sendo constantemente renegado e não conhecendo, de fato, um lar. À medida que o autor desenvolve o personagem, percebemos os fatores que levam a esta rejeição. Primeiramente, é possível dizer que ele é insaciável ao se alimentar, custando muito às amas de leite, que precisam se dedicar somente a ele em vez de amamentar outras crianças. Além disso, há o fator determinante para tal rejeição, para a estranheza que causa e até para o medo que ele promove: o menino não tem cheiro. Nada! Ele simplesmente não exala nenhum aroma, seja agradável, neutro ou fétido! Mas se, por um lado, Grenouille não possui nenhuma essência, por outro, ele foi agraciado com o mais apurado dos olfatos, sendo capaz de distinguir cheiros a milhas e milhas de distância e de identificar as notas de cada perfume.
Certa noite, quando ainda é muito jovem, Grenouille se sente altamente inebriado pelo cheiro de uma jovem ruiva. Desesperado para captar aquele aroma para si e sem experiência alguma de como conservá-lo, ele a mata e absorve tal essência. Porém, para a sua infelicidade, o maravilhoso perfume se esvai à medida que o corpo da jovem esfria, o que faz com o que tal fragrância se perca para todo o sempre. Decepcionado com a perda, o rapaz decide aprender os manejos de um perfumista, de modo que possa captar essências e guardá-las para si (aqui, percebe-se que a insaciabilidade que o garoto tinha quando menor, mudou seu objeto de interesse do alimento para os perfumes).
E é assim que Grenouille se dirige ao renomado perfumista Baldini para aprender todas as suas técnicas. Mas é claro que, com um nariz superdotado como o do jovem, o profissional se aproveita disso para explorar o garoto, que sequer se importa com isso. Percebe-se aqui um jovem frio e calculista, que foca apenas em seus objetivos e manipula as pessoas ao seu redor para conseguir alcançá-los.
A escrita de Patrick Süskind nesta obra é extremamente envolvente. Desde as primeiras páginas já ficamos presos à história, à narrativa de da vida de Grenouille e à ambientação francesa impressa pelo autor. Posso afirmar que a descrição dos odores que permeavam a França do século XVIII é tão bem feita que ler este livro se torna uma experiência sinestésica: é como se estivéssemos ali, sentindo tudo o que está escrito nas páginas e constatando que a população francesa realmente fedia e vivia na miséria!
Sobre o protagonista, creio que seja um personagem bastante complexo. Com todas as condições desfavoráveis para seu nascimento e crescimento, senti pena do garoto durante a leitura inicial (mesmo sabendo que ele se tornaria um assassino, tal qual o título da obra revela). E, à medida que o rapaz se esforçava para atingir os objetivos, foi inegável o sentimento de curiosidade para descobrir os métodos que ele usaria. Eu mesma não me importava com as vidas de suas vítimas, mas queria saber se o rapaz concluiria seus planos!
Quanto ao fim da obra, só posso dizer que é bastante inusitado e levemente confuso. De cara pensei que era surreal demais, que não fazia sentido. Mas, tratando-se de um livro que aborda um personagem de olfato super dotado e que absorve a essência corporal de donzelas para fabricar perfume, por que eu deveria estar buscando sentido ou verossimilhança?
No mais, gostei muito do livro, mas tirei uma estrela devido a algumas passagens mais monótonas que se dão após os 50% da leitura.
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