Coruja 31/08/2011Este é outro título que vai entrar para minha lista de “livros que queria ter lido quando era criança”. A continuar nesse ritmo, terei uma biblioteca completa para meus filhos imaginários se eventualmente eles vierem a nascer.
Qualquer dia desses escreverei sobre a educação que pretendo dar aos tais pimpolhos. Tenho visões bastante claras sobre isso. Pretendo ensinar religião para o pirralho usando Small Gods do Pratchett como catecismo; vou cantar Queen como canção de ninar e ler Douglas Adams antes de dormir.
E aí já deu para entender porque meus filhos continuarão a ser apenas imaginários, não é mesmo?
Antes que eu comece a delirar aqui dando uma de Rousseau com Emílio, vamos ao que interessa...
George MacDonald escreveu A Princesa e o Goblin em 1872 e era um dos ídolos de Tolkien, que chegou a começar um prólogo de uma edição especial de outro conto do autor, Golden Key, em 1964 – e que terminou por se transformar no conto Smith of Wooton Major. Aliás, os goblins de MacDonald me fizeram constantemente lembrar de Gollum, até mesmo por suas origens...
A história é contada numa linguagem simples, quase musical – de tal forma que quando você acaba o livro, fica com aquela sensação de contentamento, vontade de sorrir para as paredes, de sair cantando e dançando por aí. A Princesa e o Goblin é o tipo de livro pelo qual você sente tanto carinho que dorme com ele abraçado ao peito, na mesma linha de volumes como O Pequeno Príncipe, A Princesinha e O Jardim Secreto.
Engraçado, tenho a impressão de que já usei palavras muito parecidas para descrever outros livros dessa série... vários dos mestres da fantasia antes de Tolkien escreveram contos que, a despeito de serem infantis, possuem uma dimensão e uma delicadeza muito características.
A Princesa do título, Irene, tem oito anos, e nunca viu o céu estrelado sobre sua cabeça. Desde a morte da mãe, ela vive escondida numa das residências de verão do rei, para sua própria proteção. Isso porque o reino vive sob uma praga de goblins, criaturas muito tolas, que vivem sob a terra, morrendo de medo do sol, de rimas e de canções.
Fica a dica: se algum dia acontecer de encontrarem com um goblin num ermo escuro, comecem a cantar alguma de suas rimas de infância - Sapo Cururu ou Pirulito que bate, bate ou ainda Ciranda, cirandinha.
O problema é que, embora Irene não tenha qualquer consciência dos goblins, os goblins têm consciência dela – na verdade, eles têm um intricado plano que subsiste em raptá-la, casá-la com seu príncipe e chantagear o rei.
E isso apesar do fato de que a princesa, que é humana, ter dedos nos pés, o que é horrível, simplesmente horrível – mas sacrifícios são necessários e estamos falando de política aqui, de forma que o príncipe consorte terá que passar por cima da aversão que os goblins sentem por dedos dos pés e engolir a noiva.
Se seu plano falhasse, havia outro de contingência: inundar as minas vizinhas ao seu lar e assim matar os mineiros, que eles acreditavam ser de fundamental importância para o reino.
Os goblins até que tinham bons planos... Eles não contavam, porém, com a presença do “fantasma” da rainha Irene, bisavó da princesa, nem com Curdie, um garoto esperto que trabalha na mina com o pai e é excelente com rimas.
Há muito que fica no ar em A Princesa e o Goblin. Há algo que não se explica sobre a natureza da família de Irene; algo sobrenatural em seu pai e em sua bisavó que me fazem muito lembrar dos elfos de Tolkien: altos, belos, poderosos, tristes.
Existe um filme baseado no livro – dá para assisti-lo no youtube (embora sem legendas) e quando o vi, tive a sensação de já conhecê-lo; tenho quase certeza de que assisti quando criança. Ele não é tão fiel à história original e o rei é bizarramente parecido com o Burger King, símbolo da cadeia de fast-food. Ainda assim, fiquei sorrindo como boba ao longo de todo filme...
Enfim, A Princesa e o Goblin é uma história incrivelmente delicada, gostosa de ler, que te deixa com gosto de quero mais – existe uma continuação chamada The Princess and Curdie, que ainda não li e da qual não vi tradução (o primeiro volume foi traduzido aqui no Brasil).
Para quem lê em inglês, ambos podem ser encontrados no site do Project Gutenberg, uma vez que já entraram em domínio público. Aliás, quando estava procurando o link, achei lá os Fairy Books de Andrew Lang... tô ferrada... vou endoidar até conseguir ler todos...