Alex 12/12/2023Você nasceu em uma família karamazoviana?Irmãos Karamazov é a última obra de Dostoievski, e claramente ele pretendia algo maior. Não é uma obra inacabada, mas ele claramente queria entregar um segundo volume a essa novela.
Dito isso, cabe lembrar que Dostoievski é um romancista russo que explora muito bem os dilemas psicológicos em seus romances, e em seus personagens. Em Irmãos Karamazov isso não é diferente.
A história conta as tragédias da família Karamazov. Fiodr, o pai, é um alpinista social com zero escrúpulos, cada casamento é um degrau a mais, rumo ao sucesso financeiro. As esposas? Não importam. Os filhos? Importam menos ainda, os criados que os criem.
Beberrão, desbocado, com ausência total de bom senso, perdulário até certo ponto. Um homem que não merece menção, de tão obtuso.
Seu primeiro filho, Dmitri. Saiu muito ao pai, perdulário, e com o mesmo defeito, de se ter em conta superior ao que realmente é.
Dmitri e Fiodr representam a hybris grega, uma espécie de presunção, arrogância, de valorar-se muito além do que realmente é, a ponto de os deuses os castigarem. E no romance karamazoviano, a hybris atrai a desgraça também.
O segundo filho é Ivan, um erudito, ateu, apaixonado pela cultura europeia (estrangeiro), ele é o niilista impregnado de religiosidade, e sua filosofia transborda em todos os atos desse livro, "Se Deus não existe, tudo é permitido".
Com esse personagem acompanhamos os melhores diálogos, as reflexões filosóficas mais profundas, os embates teológicos com o irmão mais novo. Mas também vemos que o seu niilismo filosófico não o livra do fardo de salvar "alguém". Não o livra do peso moral nas escolhas. Ao ponto de ter um desfecho bastante trágico, talvez até em aberto.
Alieksei, ou Aliocha, o herói do escritor, o terceiro filho, representação de Abel, o filho preferido. O preferido entre os irmãos também. Querido por todos, até pelas crianças da cidade. Um religioso, com fervor sincero, sem moralismo, sem colocar fardos sobre os ombros dos demais. O fardo de sua religiosidade sincera, é colocada apenas sobre si, por ele mesmo, com a maior voluntariedade possível. Um tremendo personagem, poderia escrever páginas sobre ele.
E, ao final, o filho bastardo, filho de Fiodr com uma mendiga. Nascido ao relento. Órfão de mãe e de pai. Entregue para ser criado junto aos servos da casa. Com um nome que representa "aquilo que fede", Smierdiakov é um amargurado silencioso. Que passa a vida aos pés do dono (seu pai), cozinhando e entretendo. Observa os irmãos com uma vida melhor que a dele e amargura-se, cada dia mais, com tão triste realidade.
Toda a trama gira em torno desses personagens. Todo o climax gira em torno das escolhas deles. E toda a tragédia se desenrola por serem Karamazov.
Dostoievski ensina, nesse livro que somos produto do meio, mas que a família nos faz herdar mais que apenas patrimônio, ele acerta em coro com a bíblia sagrada, que, "amaldiçoado serás, de geração em geração".
Não posso falar mais, para evitar spoillers, mas vale a leitura. Não é a obra prima de Dostoievski, ainda acho Crime e Castigo imbatível, mas é muito bom.