Matheus Fellipe 15/02/2016
Um verdadeiro coquetel do que há de melhor no gênero suspense e policial
O Hipnotista é o tipo de livro que nos hipnotiza e nos faz perder o controle do tempo. Nos obriga a mergulhar no inconsciente e mesmo após terminar a leitura você ainda permanece lá no fundo por algum tempo, meditando cada cena de brutalidade, cada episódio e reviravolta.
“Sob a luz fria do saguão, Joona viu que os corpos ensanguentados tinham sido arrastados pelo chão. Gotas de sangue cobriam a chaminé de tijolos aparentes, a televisão, os armários da cozinha, o forno. Joona observou o caos: a mobília virada, a prataria espalhada, as pegadas e marcas de mão desesperadas. Quando parou em frente ao corpo mutilado da garotinha, lágrimas começaram a correr pelo seu rosto. Ainda assim, se obrigou a imaginar com exatidão o que havia acontecido: a violência e os gritos.” — Pág. 29
Um corpo mutilado e parcialmente desmembrado foi encontrado no vestiário do centro esportivo Rödstuhage, em Tumba na Suécia. O morto é o professor de física e química, Anders Ek. Afim de informar o ocorrido e obter informações, um policial vai até a casa dos Ek e encontra toda a família reunida em silêncio... o silêncio da morte! Katja Ek, sua esposa e seus dois filhos, Lisa e Josef Ek estão pela casa, todos mutilados num verdadeiro massacre. Há sangue por todos os lados, o policial se aproxima de cada um, a mulher está morta, a garotinha está morta, o garoto está... não, há pulso!
Josef é a única testemunha, está vivo, mas inconsciente. A única maneira de descobrir quem é o assassino é por meio da hipnose. Então entra em cena o Dr. Erik Maria Bark, o hipnotista. E é em decorrência da hipnose que uma nova trama se instala. Do primeiro crime, surge um novo caso: um sequestro envolvendo um membro da família do hipnotista. Juntos, Joona e Erik, irão fazer de tudo para encontrar o desaparecido e capturar o sequestrador.
“— Depois disso vem o que é chamado de indução — prossegue Erik. — Introduzo uma espécie de comando oculto no que digo e levo o paciente a imaginar lugares e acontecimentos simples. Sugiro um passeio por seus pensamentos, cada vez mais longe, até que sua necessidade de controlar a situação praticamente desaparece. É mais ou menos como ler um livro e ficar tão empolgado que se perde a consciência de estar sentado lendo.” — Pág. 63
Lars Kepler — pseudônimo do casal sueco Alexandra e Alexander Ahndoril — escreve de um jeito que embriaga o leitor, começa com uma página e quando você se dá conta, já perdeu o controle. Utilizando uma narrativa em terceira pessoa, ele capta e transmite a alma e a personalidade de cada personagem, construindo cada um minuciosamente.
“Há duas coisas que ele odeia, pensa, olhando para a pasta. Uma é desistir de um caso, se afastar de corpos não identificados, estupros e roubos não solucionados, casos de agressão e assassinato. A outra coisa que ele odeia, embora de uma forma inteiramente diferente, é quando esses casos não resolvidos afinal são resolvidos, porque, quando velhas perguntas são respondidas, raramente é da forma que se desejaria.” — Pág. 417
Com as cenas e acontecimentos ocorre algo semelhante, o autor vai liberando as informações aos poucos, vai nos instigando... ele solta uma informação que aparentemente não tem relevância na história, e depois de algumas páginas ele revela o que está por trás daquilo. Passado e presente se intercalam à medida que algumas informações são necessárias. As descrições também são perfeitamente bem escritas, trazendo cores e movimentos para as páginas.
“Eles entram e Joona acende a luz principal. A porta do banheiro está escancarada. O cheiro de podridão é insuportável. [...] O rosto está inchado e moscas andam ao redor da boca e zumbem no ar. A blusa azul puxada para cima, a barriga inchada e azul-esverdeada. Profundas incisões negras correm pelos dois braços. O tecido da blusa e seu cabelo louro estão grudados de sangue coagulado. A pele está cinza-clara, e uma rede marrom de veias pode ser vista com clareza sobre o corpo. O sangue estagnado apodreceu dentro do sistema vascular. Pilhas de pequenos ovos amarelos colocados pelas moscas podem ser vistos nos cantos dos olhos e ao redor da boca e das narinas. O sangue inundou o ralo e escorreu para o pequeno tapete do banheiro, cujas beiradas têm uma cor escurecida. Uma faca de cozinha suja de sangue está caída no box ao lado do corpo.” — Pág. 367
Um porém deste livro, que não me incomodou, mas que fez muita gente não gostar dele tanto assim, foi o final aparentemente aberto. Como assim? O caso do esquartejamento da família Ek continuou durante o livro em segundo plano só que o livro termina sem que o caso seja concluído. Por haver uma sequência, chamada O Pesadelo, protagonizada pelo detetive Joona Linna, eu acredito que o caso possa ser concluído nele ou pelo menos seja citado o final que teve o assassino. Mas se não o for, eu não me importo, pois, a vantagem de um final aberto, caso ele seja mesmo aberto, é que podemos criar uma conclusão alternativa. Fora essa pequena observação, não houve nada que me desagradasse.
“Ela pigarreia e avança um passo, mas de repente suas pernas falseiam. As mãos buscam apoio, mas ela não consegue se manter de pé. Cai no chão, bate com a cabeça contra a parede e sente a dor lancinante em seu crânio.” — Pág. 161
O Hipnotista é um verdadeiro coquetel do que há de melhor no gênero suspense e policial, o livro e o autor entram para minha lista de favoritos e leva 5 estrelas.
Sabe quando bate aquele arrependimento por você não ter lido o livro antes? Aconteceu isso comigo. Eu comprei O Hipnotista e O Pesadelo em 2014 e deixei eles estacionados na estante, sempre adiando a leitura. E te aviso, se você tem ele na estante, pega logo e leia! Se você ainda não tem, compra porque vale muito a pena, não só pela história em si, mas também pela bela edição feita pela Intrínseca, uma das capas mais bonitas da minha estante.
“O sol já está se pondo. A luz baixa brilha nas poças congeladas no estacionamento de visitantes da unidade de neurocirurgia, e o cascalho no asfalto despedaça-se sob os pneus enquanto ele segue para a saída principal. [...] Segue rumo ao norte enquanto a luz que morre borra os contornos do mundo, e pisca para tentar ver melhor. Apenas quando os tons de azul começam a ser predominantes o seu cérebro entende que está escurecendo.” — Pág. 245
site: http://leitornoturno.blogspot.com.br/2016/02/resenha-o-hipnotista-lars-kepler.html