Rita 19/08/2015
É semelhante e não igual
Ao fim da leitura do livro, fiquei com a sensação de que deveria tê-lo lido com mais atenção. Até a página 170 (mais ou menos) a estória estava devagar, sabíamos apenas das intenções de Tertuliano Máximo Afonso em encontrar seu "sósia". Ao ver "sua" imagem projetada na tela de TV ao assistir a um filme, Tertuliano surpreende-se com um ser semelhante a ele, chamado Antônio Claro (cujo nome artístico é Daniel Santa-Clara). A partir daquele instante, Tertuliano obstina-se a encontrar esse ser semelhante, por simples curiosidade. Entretanto, o que descobrimos é que o ser humano, embora planeje em sua mente uma situação ideal, dificilmente consegue calcular as atitudes do outro, o que torna a vida incontrolável e imprevisível. Não vemos a presença de um destino, mas sim a ação do homem sobre a sua própria história. A construção do enredo, de forma vagarosa, com a descrição das indecisões de Tertuliano, faz parecer que a personagem necessitava de que algo mudasse em sua vida, de que ele interpretasse outro papel. O conhecimento sobre Antonio Claro faz sua vida se transformar em pouco tempo e não se sabe ao certo qual o fim da estória. O professor de História que observa as transformações ao longo do tempo torna-se agente de sua própria história e responsável por forjar o seu futuro.
Algumas frases do genial José Saramago:
"Infelizmente, o senso comum nem sempre aparece quando é necessário, não sendo poucas as vezes em que de uma sua ausência momentânea resultaram os maiores dramas e as catástrofes mais aterradoras. A prova de que o universo não foi tão bem pensado quanto conviria está no facto de ter o Criador mandado chamar sol à estrela que nos ilumina. Levasse o astro-rei o nome de Senso Comum e já veríamos como andaria hoje esclarecido o espírito humano, e isto tanto no que se refere ao diurno como ao noctorno, porque, não há quem o ignore, a luz que dizemos da lua, luz da lua não é, mas sempre, e unicamente, luz do sol. É caso para pensar que se tantas foram as cosmogonias criadas desde o nascimento da fala e da palavra foi porque todas elas, uma por uma, falharam miseravelmente, regularidade essa que não augura nada de bom à que, com algumas variações, nos vem consensualmente regendo." (p. 223)
"(...) Não imaginei que fosses capaz de tanto, é um plano absolutamente diabólico, Humano, meu caro, simplesmente humano, o diabo não faz planos, aliás, se os homens fossem bons, ele nem existiria, (...)" (p. 256)