Caio.Malpighi 14/05/2016
Resenha Crítica
Resenha Crítica
Um livro intrigante e que explora a imaginação humana, o opúsculo De optimo republicae statu deque nova insula Utopia (Sobre o Melhor Estado de Uma República e Sobre a Nova Ilha Utopia), ou simplesmente, A Utopia (do grego, em lugar nenhum), escrito por Thomas More, narra detalhadamente os aspectos culturais, religiosos, e políticos de uma sociedade imaginária que prospera na fictícia ilha de Utopia, refletindo uma dura e indireta crítica para a sociedade inglesa do século XVI.
Expoente do movimento renascentista inglês, More foi um nobre que atingiu os píncaros da vida pública, contudo, sem perder seu espírito humanista adquirido com os profundos estudos filosóficos, teológicos e jurídicos, para os quais dedicou sua vida.
No decorrer de sua obra, podemos perceber forte influência da filosofia grega, principalmente de Platão (que escreveu a obra A República, com a mesma finalidade de descrever um Estado ideal adotada por More através de A Utopia) e de Aristóteles (sempre presente e observado pela classe intelectual inglesa). Outras inspirações tomadas por More são as da escola epicurista (More sustenta que o esplendor da sociedade de Utopia reside na maximização do prazer duradouro, tanto do corpo quanto da alma), bem como as da filosofia estoica (vertente transparece na ideia do dever e de virtude, que são as pedras de toque para a organização social de Utopia, de modo que sem tais axiomas arraigados no cerne da cultura de Utopia, nada do que é narrado no livro seria plausível). Por fim, e não poderia deixar de ser, os valores do cristianismo são repetidamente repisados no decorrer da narrativa.
À frente de seu tempo, More expõe ideias que nem sequer eram consideradas no século XVI, e que atualmente são pilares fundamentais de uma sociedade justa, tais como o limite máximo de horas de trabalho; dissolução do matrimonio por consenso dos cônjuges; o Estado Laico e a liberdade religiosa (apesar de defender a importância da espiritualidade e da religião para uma nação justa e próspera). Tece também duras críticas ao sistema mercantilista da época e ao monopólio econômico das terras, meios de produção e, por conseguinte, das riquezas, pelos nobres, enquanto a maioria da população sofre com a miséria.
Neste aspecto, expõe em seu livro uma preocupação com o bem comum em detrimento do individualismo. Um exemplo é a não individualização dos bens e da propriedade na fictícia Utopia, onde todos os bens são res publica e o que predomina é uma produção de subsistência que não deixa sequer um cidadão sofrer com a pobreza.
Com efeito, a Utopia oferece uma narrativa criativa e bem elaborada, na qual tudo tem uma razão de ser, que é ditada pela sua finalidade, ou como dizia Aristóteles, pelo seu telos.
Ao meu ver, a única crítica que se pode tecer sobre esta obra é impossibilidade de sua realização prática no mundo real, uma vez que levado em conta o fato de a sociedade e a cultura de cada povo ter sido moldada ao longo da história por diversas determinantes, ao contrário do que se vê em Utopia, que teve sua cultura e seus valores totalmente originados de uma só pessoa, o fundador da sociedade, o Rei Utópos.
Sem dúvida, tal obra é um marco para o humanismo. Infelizmente, More foi condenado à morte pelo Rei Henrique VIII, à quem serviu muito tempo, simplesmente por seguir suas convicções espirituais e morais que toram o livro A Utopia uma obra profunda e fundamental (foi contra a desvinculação da Inglaterra à Igreja Católica e contra a criação da Igreja Anglicana por Henrique VIII, por entender que o Estado não deveria interferir em assuntos religiosos).