P.S. 12/08/2013
DELÍRIO, DE LAUREN OLIVER
"Para todas as pessoas que no passado me infectaram com amor deliria nervosa — vocês sabem quem são.
Para as pessoas que me infectarão no futuro — mal posso esperar para ver quem serão.
E em ambos os casos:
Obrigada."
Essa é a dedicação de Lauren Oliver no início de Delírio. Linda, não? Sim, muito bonita.
"Noventa e cinco dias, e então estarei segura. Estou nervosa, é claro. Fico imaginando se a intervenção vai doer. Quero acabar logo com isso. É difícil ter paciência. É difícil não sentir medo sabendo que ainda não fui curada, apesar de até agora eu não ter sido acometida pelo deliria."
Lena conta ansiosamente os dias para sua intervenção. É quando finalmente estará imune à pior de todas as doenças: o amor. Nada é tão arrebatador quanto ele: você pode morrer de amor ou da falta dele. Com a intervenção, um processo cirúrgico — que deve cortar uma parte do cérebro do vivente, segundo eu entendi — que todos anseiam, as pessoas maiores de dezoito anos ficam livres do amor ou de qualquer outro tipo de emoção intensa, incontrolável, e até mesmo de qualquer tipo de sofrimento.
Delírio é uma distopia e distopias são uma coisa maravilhosa. Distopias mostram a nossa sociedade, mas com elementos negativos, como a interferência direta e decisiva do governo na vida das pessoas. Aqui, todos devem passar pela intervenção após completarem dezoito anos, queiram ou não. É o governo também quem decide outros aspectos, como sua carreira profissional, com quem irá casar ou quantos filhos irá ter. Tudo isso com base em um questionário feito no dia da avaliação.
Quem nos conta a história é a própria Lena. No início, ela me pareceu um pouco frágil, delicada, quebradiça. Até me lembrou um pouco Bella Swan, mas infinitamente mais inteligente. Me orgulho em dizer que Lena evoluiu muito nesse período de três meses de história. Há uma mudança muito grande de opiniões da própria personalidade da Lena, que antes, obviamente, acreditava no "sistema", no quanto elas estava exposta sem a cura, e no quanto o governo lutava para protegê-los.
Conforme as respostas que Lena dissesse no dia da sua avaliação, ela seria "pareada", isso mesmo, "pareada" como uma vaca no cio — mas nós não somos todos animais? —, com o "homem da sua vida". Eles iriam casar, ter a quantidade de filhos determinada, e ver seus dias terminarem em completa segurança. O casamento também é um fator importante na nossa sociedade, um medidor de sucesso, de merecimento e de "valor": arranje um bom partido e você vai valer muito! A avaliação era, para Lena. o dia mais importante da sua vida. O dia em que encontrarmos nosso grande amor não será o dia mais importante da nossa vida? Não acredito em dias mais importantes da nossa vida, acho que eles anulam os outros dias.
Lena se sente desajeitada, ainda mais quando está perto de sua amiga Hana, a linda e loira Hana. Acho que esse sentimento de "desajeitado", que também estava presente, mas de forma exagerada, na Bella, é um sentimento que, acredito eu, está sempre presente na maioria dos autores. Digo, dos autores como pessoas. Eu, Lucas, me sinto desajeitado e desadequado a este mundo. Essa sensação de não pertencer ao lugar onde se está é muito comum, tanto em personagens literários, como em pessoas físicas. É até um charme, uma característica de alguém frágil, delicado, sensível e romântico. Ou, ao menos, parece.
A diagramação da Intrínseca é tão parelha, que me faz pensar em uma sala com pilastras de mármore, onde tudo é incrivelmente limpo e organizado.
Prestem bem atenção neste trecho:
"Foi quando ouvi. De algum jeito, sobre os roncos, tropeços e gritos, escuto uma risada acima de mim — baixa, curta e musical, como alguém executando notas em um piano.
A galeria de observação. Um garoto na galeria de observação assiste ao caos. E ele está rindo.
Assim que olho para cima os olhos dele se fixam em meu rosto. A respiração escapa de meu corpo com um ruído e tudo congela por um segundo, como se eu olhasse para ele através das lentes de uma câmera, com o máximo de zoom, e o mundo parasse por aquela fração de segundo entre a abertura e o fechamento do obturador."
Foi o que eu senti quando o vi pela primeira vez. Mas, no meu caso, essa sensação só me trouxe dor. Mas, se o amor acontece à primeira vista, deve ser assim, não? Foi muito legal ter essa sensação tão bem descrita na história assim.
Eu achava que Delírio era só um livro bobo sobre romances, estilo Bella Swan — não, eu não gosto dela —, mas eu me enganei. É uma história linda, irreal, real e extremamente apaixonante.
"Na maior parte do tempo, o governo é bem-sucedido. Não vemos uma guerra desde o fechamento das fronteiras, e quase não há crimes, exceto por incidentes ocasionais de vandalismo ou pequenos roubos. Não há ódios nos Estados Unidos, ao menso entre os curados. Apenas casos esporádicos de distanciamento — mas todas as intervenções médicas trazem certos riscos."
Isso explica minha ideia de que uma sociedade distópica é uma sociedade ideal. Tá, vamos deixar um pouco de lado a liberdade de escolha, expressão e o direito à própria vida. Não há crimes nessa sociedade ideal. Não assaltos, sequestros, assassinatos. Não há uso de drogas. Não há traições, insegurança, violência. Não há estupro. Eu sei que o que estou dizendo é bobagem, mas… uma sociedade sem estupros. Claro, há crimes de governo e tudo o mais, mas os índices de violência são mínimos. Eu fico me perguntando: será que não vale a pena? A intervenção pode resolver todos esse problemas, inclusive casos de homossexualidade. Eu volto a me perguntar: será que não vale a pena?
"E lembro a mim mesma que é capaz de eu ter imaginado aquilo tudo — a mensagem, o encontro. Ele deve estar sentado em seu apartamento em algum lugar, fazendo seus trabalhos acadêmicos. Provavelmente, já esqueceu as duas meninas que conheceu no complexo de laboratórios hoje. Provavelmente, só estava sendo gentil hoje, uma conversa casual.
É melhor assim. Mas, não importa quantas vezes eu repita isso, a sensação estranha de vazio em meu estômago não desaparece. E por mais ridículo que seja, não consigo me livrar da sensação persistente e aguda de que esqueci algo, deixei algo passar ou perdi algo para sempre."
Eu também digo isso a mim mesmo. Talvez essa sensação, de ter me enganado com um olhar — porque depois ele apareceu com uma namorada — me faz preferir a cura e uma sociedade ideal a qualquer traço de paixão e recusa.
Lena tem uma cor favorita meio… inusitada. Ela prefere o cinza, o cinza de logo antes do sol nascer, uma cor pálida que não é bem cinza, mas também não é outra cor. E, ao menos na minha cabeça, é essa cor que a capa traz, um papel brilhante, que, conforme a luz refletida, pode ficar azul ou cinza, igual a cor tão importante para Lena. Essa capa, mais a diagramação, fazem com que o livro seja um produto extremamente atraente, o que, salvaria caso sua história não fosse boa o suficiente, o que não é verdade. Eu tive a sorte de comprar Delírio em um sebo, ele está meio amassado, mas livros de sebos são românticos por si só, parecem trazer uma "história de vida" junto consigo. E diante de todo esse romantismo, ainda tenho a cara de preferir a cura do que a paixão.
Ilu.
site: http://www.duasgotas.com.br/2013/04/delirio-de-lauren-oliver_19.html