Jose 30/08/2022
Não Verás País Nenhum, de Ignácio de Loyola Brandão
Ignácio de Loyola Brandão nasceu em Araraquara, São Paulo, em 1936. É Jornalista e escritor, tem mais de 40 livros publicados, já ganhou vários prêmios literários importantes, e é um imortal da Academia Brasileira de Letras.
A narrativa de Não Verás País Nenhum acontece em um futuro não determinado, mas que me pareceu ser mais ou menos nos nossos dias, as primeiras décadas do século 21.
No entanto, os problemas relatados no livro são cada vez mais presentes na nossa realidade.
E os problemas não são poucos não?
Falta d?água, calor insuportável, desaparecimento das florestas e dos rios, montanhas de lixo, controle da informação, fake news para manipular a população, polícia corrupta e violenta, governantes corruptos e medíocres, e uma massa cada vez mais crescente de pessoas doentes, desempregadas e famintas pelas ruas.
Quem narra a história é o Souza, um professor universitário de História que foi aposentado e afastado de suas funções na universidade pela lei de segurança.
De certa forma podemos dizer também que um outro personagem quase tão importante quanto o Souza é o Sol. O Sol é quase onipresente.
Por conta do total descaso dos governantes em relação ao meio ambiente, o Sol nesse livro é quase um vilão assassino implacável, sério, ficar no sol pode dar muito mais que um bronzeado.
A história se passa em São Paulo, que na verdade é a única coisa que resta do Brasil.
É uma São Paulo muito mais populosa do que a dos nossos dias, e é governada por uma ditadura nos moldes da ditadura militar de 1964.
As pessoas chamam essa ditadura de Esquema.
E uma das coisas que o Esquema mais faz é reescrever a história, de forma muito parecida ao que vemos no livro 1984, de George Orwell. Bem no estilo de Guerra é paz, Liberdade é escravidão, Ignorância é força.
Uma coisa interessante que o livro descreve bem é o medo que a classe média sente em relação aos pobres, que moram um pouco mais afastados dos centros em lugares chamados de 'acampamentos paupérrimos'.
As pessoas dessas periferias mais precarizadas são praticamente todas elas afetadas pela radiação do Sol, que realmente causa estragos gigantescos nas pessoas.
E elas estão divididas meio que por categorias de estragos causados pelo Sol.
Por exemplo, Tem os carecas que estão com suas peles descascando; tem pessoas que perdem as unhas, os narizes, os cegos, os que os olhos despencaram e ficam pendurados, enfim, tem sofrimento pra tudo que é lado!
Nessa sociedade distópica, só quem tem acesso abundante à água, os que tem condições financeiras para comprá-la, é o um por cento da população privilegiada.
Em Não verás país nenhum, a falta de preservação do meio ambiente gerou tanto a inexistência de alimentos, os quais passaram a ser feitos em laboratórios, que são chamados de alimentos facticios, quanto a ausência de chuvas, calor insuportável e a escassez de água.
No livro, o que não foi desmatado, foi vendido para outros países, como é o caso da Amazônia. A Amazônia não é mais brasileira?
A polícia brasileira, hoje, é considerada uma das mais violentas do mundo. É muito comum ver cenas de violência policial, como por exemplo, o assassinato de um homem negro em uma câmera de gás improvisada em um carro da polícia rodoviária federal no Piauí.
O pior é que a ação policial estava sendo filmada, e mesmo assim os policiais não se importaram com isso.
No livro tem uma cena muito parecida com isso, quando a polícia, chamada de civiltares, prende o protagonista, o Souza, e uma mulher dentro de um camburão, e vai embora, e simplesmente deixam eles dois presos por muito tempo, simplesmente sendo cozinhados pelo calor infernal.
Quase a mesma coisa que na vida real.
O livro, então, é bastante atual, e tem inúmeros avisos dos riscos e dos perigos do nosso Brasil estar caminhando para se tornar o Brasil de Não Verás País Nenhum.
Se você ler esse livro, vai ver que embora seja uma distopia futurista de ficção científica, infelizmente tem muito parentesco com a nossa realidade brasileira atual, que está sempre à beira do abismo, prestes a se tornar uma ditadura burocrática, corrupta e extremamente perigosa para pessoas pobres.