Krishna.Nunes 09/02/2021Quntas vidas valem uma vida?Já na década de 1960, Duna e Messias de Duna pareceram prever a crise do petróleo dos anos 1970 e a importância que o controle dos combustíveis e a concentração do petróleo no oriente médio daria aos povos árabes na política mundial do século XXI. Acolhido por uma comunidade em tudo semelhante aos povos que seguem o Islã e tomado por eles como um líder messiânico, Paul Atreides os conduz a uma improvável vitória contra o imperador Shaddam IV, condenando-o ao ostracismo e casando-se com sua filha Irulan.
Numa narrativa que tem muito mais de fantasia do que de ficção científica, o fundamentalismo religioso, as visões proféticas, os complôs e a guerra santa são protagonistas em vez da inteligência artificial e dos robôs. Naves espaciais e olhos mecânicos à parte, os mitos e os superpoderes trazem esta história mais para o lado da magia do que das odisseias espaciais.
No lugar de um cenário de batalhas épicas em um planeta estranho do primeiro volume, Messias de Duna foca nas personagens da família Atreides, que conquistaram o poder político e religioso absolutos em Duna, e na intricada conspiração para derrubá-los.
Passando-se doze anos depois dos acontecimento que deram cabo ao primeiro volume, esta parte da trama conta com um protagonista menos superficial, mais maduro e em grande parte mais conformado com o Jihad que ele teve pretensão de evitar no passado, mas que veio a acontecer como consequência direta de seus atos. A mudança de enfoque da narrativa permite desenvolver melhor as personagens principais, aprofundar em suas personalidade e seus conflitos, e passar a temas mais intimistas. Coisa que fazia falta no primeiro volume, as emoções aqui são muito mais exploradas, culminando em cenas de tocar até o mais frio dos corações no último terço da obra.
Ecoando a fórmula do livro anterior, a profundidade do texto reside mais nos diálogos e nos pensamentos do que nas atitudes e nas cenas de ação, mas com uma diferença de estilo: enquanto o volume 1 da trilogia tem um formato notadamente teatral (descortina-se sempre um cenário fechado, onde o leitor assiste a diálogos, diálogos e mais diálogos em que fica sabendo o que aconteceu ou vai acontecer, em vez de testemunhar a ação em si), este livro traz mais descrições e narrações diretas dos acontecimentos em campo aberto, sem, contudo, abandonar a psicodelia das visões/alucinações de Paul e Alia em seus momentos proféticos.
No campo filosófico, há um constante conflito ético e moral nos sentimentos de Paul Atreides, que o levam a questionar cada atitude sua e tudo o que ele é "obrigado" a fazer em nome da manutenção do poder. Quantas vidas valem uma vida? O que é justiça? Os fins justificam os meios? Existem limites na negociação política? O poder presciente de Muad'Dib torna-o consciente da tragédia inalienável que o aguarda e de que qualquer ação sua para evitá-la teria consequências para si e para a humanidade. Um aprofundado senso de drama revelam um autor bem mais experiente e preocupado em não repetir o tom do livro anterior. O final serve como a ponte perfeita para o terceiro livro.