marcelabrazao 25/06/2020
Inesquecível
O livro conta a história da infância de Marguerite Ann Johnson, carinhosamente chamada de Maya, dos seus três anos até bem perto do fim da adolescência. O livro inicia com chegada de Maya e seu irmão Bailey, que era um ano mais velho, a Stamps no Arkansas no Sul dos EUA. Os dois seguem sozinhos de trem rumo a casa da avó paterna após a separação dos pais. A própria autora menciona no livro que na época milhares de crianças negras viajavam sozinhas e assustadas rumo a novos destinos.
Maya e Bailey foram recebidos pela avó, a quem chamavam de Momma, que era dona do Mercado e extremamente respeitada na região. Com esta mulher, os dois foram criados até os sete anos de idade. Nessa fase, Maya relata a segregação racial presente, a perseguição da Ku Klux Klan, como a vida dos negros entregue a pobreza, trabalhando nas plantações de algodão por pagamentos ínfimos e o apego à religião. No trecho abaixo, a autora descreve a situação:
?Em Stamps, a segregação era tão completa que a maioria das crianças Negras não tinha ideia de como os brancos eram. Fora isso, eles eram diferentes, deviam ser temidos, e nesse medo estavam incluídas a hostilidade do impotente contra o poderoso, do pobre contra o rico, do trabalhador contra o patrão e do mal-trapilho contra o bem-vestido?
Aos oito anos, o pai que Maya nunca conheceu, reaparece e leva os filhos. Nessa fase do livro, Maya passa por abusos do padrasto, é estuprada e para de falar. O refúgio da garota passa a ser a literatura. De volta a Stamps no Sul, Maya tem apoio e volta a falar justamente para declamar poemas.
Conforme Maya vai crescendo e voltando a morar com a mãe, com quem acaba criando laços fortes, o racismo e a violência seguem presentes em cada detalhes descrito no livro.
Eu faria uma resenha enorme desse livro! Fiz várias marcações e tudo que posso dizer é: leiam! É um livro extremamente tocante, forte, com cenas difíceis de serem lidas pela questão da violência e do racismo mas muito necessárias para reflexão. As dores expostas por Maya fazem de Eu sei que o pássaro canta na gaiola uma leitura obrigatória. Com certeza, um dos melhores do ano.
Levantei vários trechos do livro mas deixo os mais impactantes abaixo:
"As pessoas de Stamps diziam que os brancos da nossa cidade tinham tanto preconceito que um Negro não podia comprar sorvete de baunilha."
"Os alunos brancos teriam a chance de se tornar Galileus e Madames Curie e Edisons e Gauguins, e nossos garotos (as meninas nem estavam na conta) tentariam ser Jesses Owens e Joes Louis...Nós éramos empregadas e fazendeiros, quebra-galhos e lavadeiras, e qualquer coisa maior que aspirássemos ser era uma farsa e presunção."
"Henry Reed começou a ler seu discurso, ?Ser ou não ser?. Ele não tinha ouvido os brancos? Nós não podíamos ser, então a pergunta era perda de tempo."
"?Annie, minha diretriz é que prefiro enfiar a mão na boca de um cachorro do que na de um preto?.
"A mulher Negra é agredida nos anos jovens por todas essas forças comuns da natureza ao mesmo tempo em que
fica presa no fogo cruzado triplo do preconceito masculino, do ódio branco ilógico e da falta de poder Negro".