spoiler visualizarNilza Russo 01/04/2016
A Festa de Babette
Foi a primeira vez que eu li A Festa de Babette. Lembro-me perfeitamente bem do lançamento do filme em 1987 e de ter me encantado com o resultado.
Pela narrativa da autora, é fácil chegar perto daquele ambiente tão puritano, espartano do vilarejo, com um estilo de vida das pessoas tão severo, sem muitas cores, nem muitos sabores, mas ainda sim, repleto de piedade.
O deão, pai de Philippa e Martine, acreditava no puritanismo, mas sua caridade era muito maior do que o dogma protestante: Em determinado momento cometeu um deslize, pois quando o deão perguntou se era um católico romano, respondeu segundo a verdade, e o velho clérigo, que jamais vira um católico romano, ficou um tanto pálido. Mesmo assim, o deão alegrou-se de poder exercitar o francês, que o lembrava seus dias de juventude, quando estudara as obras do grande escritor luterano francês Lefévre dÉtaples. E, como ninguém era capaz de fazer frente a Achille Papin quando de fato punha todo seu empenho num assunto, no fim o pai acabou concordando, e observou para a filha: Os caminhos do Senhor correm pelo oceano e pelas montanhas nevadas, onde o olhar do homem não enxerga nenhum rastro.
Nestes rastros do oceano, em meio a um vilarejo perdido no meio do mato, se entrelaçaram, de alguma forma, as vidas das irmãs, do General Loewenhielm (antigo apaixonado por Martine) e do cantor Achille Papin (apaixonado pela talentosa Philippa e responsável pela chegada de Babette na casa das irmãs).
A grande artista Babette trabalhou durante anos para as irmãs sem revelar sua arte. As pessoas do vilarejo já se desentendiam, porque as duas irmãs, embora piedosas, não tinham a mesma autoridade do falecido pai.
Babette transformou o ambiente com seu jantar maravilhoso. Ela conhecia o poder da sua arte: Eu era capaz de torna-los felizes (membros da aristocracia francesa frequentadora do Café Anglais). Quando dava o melhor de mim, era capaz de torna-los perfeitamente felizes.
A gente quase passa mal quando lê que os membros do vilarejo decidem que comerão a comida sem sentir o gosto, porque a consideram pecaminosa. Só o General, que é vivido e estudado, consegue compreender o tamanho da preciosidade da refeição servida.
Eu acho que há um paralelo bíblico para esta situação. Os simplórios convidados para a ceia de Babette não tinham merecimento para o jantar. Nem queriam sentir o gosto! Ainda assim, foram convidados, servidos com a melhor comida e, de alguma forma, tocados, porque saíram de lá enlevados e melhorados.