Corações Sujos

Corações Sujos Fernando Morais




Resenhas - Corações Sujos


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Kath 31/03/2022

Sombrio, real e necessário
Essa foi minha oitava leitura de março e eu fiquei bem contente que consegui ler bastante coisa esse mês, apesar de terem sido em sua maioria livros curtos. Também conquistei o hábito de ler nos fins de semana o que tem ajudado ainda mais a acelerar a meta que estabeleci para 2022. Esse livro, inclusive, foi uma adição de última hora por motivos de pesquisa, queria conhecer a fundo sobre a Shindo Renmei para usar esse plano de fundo em um livro de ficção, mas a leitura acabou excedendo e muito as minhas necessidades e expectativas.

O jornalista Fernando Morais começa sua narrativa contando as consequências da rendição do Japão para os chamados "súditos do eixo" nos países vencedores (embora "vencer" numa guerra seja muito relativo, há mais perdas que ganhos no meu ponto de vista, mas ok), o Brasil, nessa época, abrigava a maior colônia de japoneses fora do Japão e dessas pessoas foram tirados os bens, o acesso à informação, o direito de se expressar, de se reunir e de usar sua própria língua. Segregados, os japoneses eram reprimidos pelo Estado ditador.

Sem acesso à informação, pela lei de proibição de publicações em língua japonesa no país, a notícia de que o Japão havia se rendido na guerra chegou atrasada e para poucos japoneses. A maioria, patriota cega e fanática, se recusava a acreditar que seu imperador Hiroíto, o divino, se declarara um mortal e entregara os pontos. Mas os "brios" incendeiam mesmo quando a colônia paulista é invadida por policiais e sua bandeira sagrada é ultrajada por um cabo. Esse é o estopim para o ódio dos japoneses.

Contudo, ao contrário do que se poderia pensar, a mira da nascente Shindo Renmei (Liga do Caminho dos Súditos) não era voltada para os brasileiros que, em sua absurda onda nacionalista, se mostravam tão preconceituosos, xenofóbicos e cruéis quanto o próprio nazismo que combateram durante a guerra, já que o Brasil era aliado dos EUA. A fúria da colônia japonesa era voltada contra eles próprios. Porque um brasileiro, aliado dos americanos, podia contar "mentiras" ou acreditar em mentiras acerca do resultado da guerra, mas um japonês nunca aceitaria a derrota de seu país que jamais antes havia perdido uma guerra. E qualquer japonês que afirmasse acreditar naquela mentira, tinha o coração sujo e, portanto, era um traidor do império.

Começa então a caça às bruxas. O assassinato de um "coração sujo" e o atentado a outro na mesma noite colocam a polícia da época em alerta para um grupo de assassinos que, até então, não tinha muita forma diante dos policiais. Mais ameaças eram distribuídas na colônia e cada vez mais a polícia recebia pedidos de ajuda que pouco podia fazer ou mesmo se interessava em ajudar boa parte dos casos.

Inicialmente, a Shindo Renmei — como bem aponta o autor — era apenas um grupo com nenhum preparo estratégico e um tanto quanto ingênuo, cego por uma vingança que os levava a agir de forma precipitada, mas com "honra" e, dos assassinatos cometidos por eles, vários foram de pessoas inocentes que não eram verdadeiramente os alvos do grupo. Seus líderes se limitavam a dar ordens de morte, dinheiro e armas e todos os assassinos tinham o dever de se entregar à polícia tão logo terminassem o trabalho.

Paralelo a isso, temos a trajetória de suas personagens em um plano de fundo muito bem abordado pelo autor, cada um com uma vida e uma profissão, com um passado ligado à honra de seu país e a busca de uma vida melhor longe de sua casa. Morais parte do plano histórico geral para gradualmente desenhar os dramas pessoais, cheios de detalhes que fornecem conteúdo humano à obra. O contexto histórico, político e social do Brasil também é retratado com clareza e nos oferta uma verdadeira aula de história tão fluida que nem parece que é de verdade.

O intuito aqui não é "passar pano" para os japoneses, alguns deles eram — tal como os ideais de seu país apoiando a Alemanha nazista — preconceituosos, homofóbicos e antissemitas. Contudo, não eram todos, e por mais que discordemos do pensamento de alguém ou de seu estilo de vida, isso não nos dá o direito de tratar essa pessoa com violência, tirar dela seus direitos mais básicos e ofendê-la como aconteceu com os japoneses no Brasil e nos EUA. Esse livro acabou sendo uma espécie de complemento para o plano de fundo de O Amante Japonês no qual a família de Ichimei também sofre a represália do governo pela posição do Japão na guerra, o contraponto nesse livro, contudo, é bem maior (talvez por ser uma ficção) uma vez que Ichimei acaba se relacionando com Alma, uma judia.

De sua parte, igualmente, os japoneses não estavam isentos de culpa pela sua conduta, mas tentei ver o lado cultural deles que é muito diferente do nosso, a maneira como se educam, são criados e sua visão de mundo que é diferente da nossa em todos os aspectos. Por isso, apesar de encarar, com a minha visão de mundo, a atitude deles como inaceitável e absurda, dentro do contexto sociocultural deles faz sentido e, embora não se justifique tirar a vida de alguém não importa a circunstância, pelo menos essa atitude é acompanhada de uma consciência cultural por parte do leito que é magnificamente exibida e explicada pelo autor.

Gostei muito do livro, a forma fluída e fácil de ler, fazendo a gente até esquecer que é um livro jornalístico e, apesar dos eventos tenebrosos que lemos, não é uma leitura crua que trava. Aprendemos um pouco mais sobre a história do nosso próprio país também o que é muito válido num país que não liga muito para história, infelizmente. Além disso, é imprescindível como um material para gerar não somente debate, mas reflexão acerca de muitas questões.

Impressionou-me como mesmo depois de todos os terrores da guerra, de tudo que o mundo vivenciou, da forma pavorosa como os brasileiros se portavam na sua política suja desde sempre, nada se aprendeu. Continuamos repetindo os mesmos erros na tentativa de buscar um resultado diferente, inconscientes que esse resultado novo será nossa própria aniquilação. O mundo agora parece tão preso na cegueira de seu ódio e ganância que os homens parecem ter esquecido que são mortais, puro pó. É lamentável que esses dias sombrios descritos nesse livro estejam prestes a se repetir.
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Taísa 06/04/2017

Sugestão para "consumo" do livro
Não farei nova resenha porque considero excelentes e completas as dos demais colegas. No entanto, preciso recomendar que ouçam o audiolivro! A narração de Sérgio Meneguello é digna de elogios, pois traz as nuances das emoções que habitam em cada diálogo.
Para quem se interessar, deixei abaixo o link do Ubook.

site: http://www.ubook.com/audiobook/108620/coracoes-sujos
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Carlos.Santos 02/10/2017

CARNIFICINA NIPÔNICA NO BRASIL
Eu já tinha ouvido falar na Shindo Renmei (Liga do Caminho dos Súditos), uma organização de caráter nacionalista (daquele tipo bem fanático), fundada em 1942, por membros da colônia nipônica no estado de São Paulo. Getúlio há pouco havia declarado guerra ao Eixo e as tensões entre brasileiros e japoneses começaram a ficar bem acirradas. Entretanto, não imaginava que a ação da organização tenha sido tão violenta a ponto de chamar atenção de diversas camadas do governo da época e de trazer terror a cidades do interior do estado.

Após o Brasil se unir aos Aliados na segunda guerra, o governo de Getúlio Vargas, de prontidão, criou um sem número de restrições as colônias brasileiras dos três países que compunham o Eixo (Itália, Alemanha e Japão). Pelo que é descrito no livro, é certo que os nipônicos foram os que mais sofreram sanções. Tiveram bens e dinheiro confiscados e nem mesmo podiam se comunicar no idioma nativo. Eu entendo que no meio de um conflito daquele porte, a paranoia e o medo tomem conta de todo mundo, todavia a questão racial contou, e muito, para que as leis fossem aplicadas com mais rigidez aos asiáticos, mesmo porque é de conhecimento geral que a colônia alemã no sul conseguiu passar muitas informações aos seus patrícios na Europa enquanto os japoneses estavam isolados, sem contato nenhum com sua terra natal. Tanto é verdade que vários navios mercantes brasileiros foram a pique pelos torpedos alemães.

Ao final da guerra, em 1945, o governo deu uma aliviada na barra dos imigrantes, porém foi justamente ai que a Shindo fez história. O autor Fernando Morais (Olga, A Ilha) narra nesse livro de fácil assimilação, em tom de romance/reportagem, toda a história da organização e sua ação em São Paulo. Morais tem uma escrita simples e bastante ágil, é ótimo na maneira de compor frases e adjetivos, além de imprimir toda a tensão daqueles anos. A história da Shindo Renmei é tão interessante quanto surreal. Após a guerra a colônia nipônica foi dividida entre os makegumi (pessoas mais esclarecidas que tinham real noção da derrota do Japão) e os kachigumi (os que acreditavam piamente que a guerra não havia acabado e o Japão vinha saindo vitorioso a conquistar diversos territórios).

Não adiantaram virem jornais do Japão. Não adiantou o discurso de rendição do Imperador Hiroito no rádio. Os kachigumi, num fanatismo que beirava as raias da loucura, insistiam na ideia de um Japão vitorioso (afinal em 2300 anos a ilha não havia perdido uma guerra sequer). Enfim, orgulhosos, os kachigumi, representados pela Shindo Renmei, organizam uma espécie de milícia e resolvem punir os makegumi, que eles consideram traidores, de forma violenta. Atentados, assassinatos (23 no total) e terror tomam conta da colônia tanto na capital quanto no interior de São Paulo. A polícia tupiniquim fica perdida em meio a confusão, muita gente é presa e o caso vai parar nas altas esferas políticas do país.

Fernando Morais entregou uma obra ímpar sobre um fato histórico extremamente interessante e instigante porém que muita gente desconhece. Corações Sujos é um livro obrigatório para quem quer sentir um pouco da atmosfera desse período.
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Miguelestevao 24/09/2023

Eu desconhecia a história da Shindo Remei até ler Nihonjin, de Oskar Nakasato. Através da leitura de Nihonjin, me senti tentado a ler esta obra de Fernando Morais e ele não decepcionou. Uma pesquisa fantástica e que mostra até que ponto a cegueira ou a idolatria levou um grupo de imigrantes japoneses a matarem seus compatriotas em nome da crença no imperador.
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Marcone.Jose 06/07/2019

O sonho de virar Hokage deu ruim
Esse livro reportagem é sobre guerra. Não aquela famosa que terminou em 1945, mas sobre outra que aconteceu logo em seguida e foi decorrente da derrota.
Desta vez apenas o Brasil serviu de palco para a loucura. Mais precisamente: São Paulo (será que é desde então que não existe amor em SP?), a terra da garoa.
Quem eram nossos inimigos? Os japoneses. Quem eram nossos aliados? Os japoneses!.. pera ?. Rs, LAVE SUA GARGANTA e preste atenção: Com a rendição do Japão em agosto de 1945, a 2 Guerra chegou ao fim. Porém, nesta época e do lado de cá, nascia uma organização secreta japonesa, a Shindo Renmei - ou Liga do Caminho dos Súditos - formada por seguidores que acreditavam que a rendição do país do sol nascente fosse um completo golpe da propaganda para mexer com os sentimentos de nossos queridos japas. Impossível acreditar na rendição do país nipônico (todo *wanna be*) que em 2600 anos nunca tinha perdido uma guerra e tals, cheio de samurais e tals, karatê kid e afins. Pois bem, a colônia japonesa aqui (mais de 200 mil imigrantes) foi partidariamente dividida em duas forças contrárias, os vitoristas (a galera que achava que a rendição do Japão era mentira) e os derrotistas (apelidados de corações sujos, traidores). SÓ SEI QUE SP VIROU UM REBULIÇO e a treta foi feia. Os locão ingênuos e patriotas extremistas começaram a matar os japa que tava de boa e os brasileiro tudo doido pq era japa matando japa mas aí tem que parar então volta, vc fica preso, mas vc pode ir, morreu o informante, meu Deus tem mais 200 clones, quer voltar pro Japão desgraça? parem com isso seus louco ouve o rádio, vcs pedeu, aceita, olha os mangá...
Até que a gente conseguiu e JK perdôo geral dos ninja. MAS O INTERRSSANTE e que mais se destacou neste livro, pra mim, é a força da cultura desse povo tão diferente do nosso. Do seu patriotismo e importância aos valores. Claro que a gente não esquece que escolheram o lado errado na Guerra, mas é inegável a beleza de seu país e população.

O trabalho jornalistico de Fernando Morais é igualmente incrível, Tocantins inteiro pra ele.
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Adriana261 21/10/2022

Fernando Morais escreve maravilhosamente bem. Uma história que poucos conhecem mas traz elementos bastante interessantes para reflexão sobre o fanatismo de uma seita. Incrível como conhecemos tão pouco da história do Brasil do século XX.
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mura 04/02/2013

Uma grande história e um grande livro.
Tem livros que começamos a ler sem pretensão nenhuma. Foi o que aconteceu comigo com Corações Sujos, li apenas por ser de Fernando Morais. Mas aos poucos o livro nos empolga e é impossível parar de ler. Ainda mais por ser tratar de história pouco conhecida e que aconteceu no Brasil. Além de retratar o fanatismo de certos japoneses, o livro mostra também como foi difícil a colonização para os orientais no Brasil, uma cultura completamente diferente e muitas restrições impostas pelo governo do Estado Novo vigente no país.

Leitura recomendadíssima.
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Debora411 31/03/2024

Corações sujos conta a história da Shindo Renmei, uma organização formada por imigrantes japoneses no Brasil que acreditava na vitória do Japão na segunda guerra e se dedicava a perseguir e punir os derrotistas. Gostei bastante do livro, a escrita é envolvente e fluida. Fiquei me perguntando porque isso nunca foi mencionado pelos meus professores de história da escola.

Queria saber em que momento os integrantes da Shindo Renmei entendem e aceitam a derrota do Japão, mas não é falado no livro. Imagino que eles apenas negaram a derrota até a morte.

Recomendo a leitura pra quem se interessa sobre as histórias acerca da segunda guerra e para entender melhor o posicionamento do Brasil na época.
Tiago José 02/04/2024minha estante
Essas histórias que são negligenciadas no contar da História, aquelas que nunca conhecemos e que seriam importante para nossa maior compreensão do mundo.

Ainda bem que tem livros como esse e compartilhamentos como este seu para tantas importâncias ??




Flavio Petraccone 01/03/2020

Manipulação de massas
Belo exemplo de como um grupo de pessoas, cuja cultura privilegia a hierarquia e a obediência, pode ser manipulada e influenciada por indivíduos interesseiros e de mau caráter.

Interessante ler sobre o conceito do yamatodamashii (o código de conduta que todo japonês deveria seguir) e também sobre os absurdos que aconteceram, em função da ação da Shindo Remnei: por exemplo, o fato de enquanto no mundo inteiro o iene se desvalorizava, no Brasil, era o contrário.
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Hamlet 12/04/2020

Um grande trabalho de pesquisa
Uma história pouco conhecida nos dias atuais, a crise de identidade sofrida pela comunidade japonesa no Brasil após o fim da Segunda Ferra Mundial é uma história valiosa. Além de se conhecer um aspecto relevante dessa população, também é possível traçar um paralelo com a atual situação política brasileira.
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Eduardo 29/06/2012

Um livro muito interessante e inquietante. Não conseguia imaginar na existência de uma seita terrorista na colônia japonesa que não aceitava a rendição e a derrota do Japão na 2ªGuerra Mundial, e atacava os próprios patrícios que discordavam desta ideia surreal. Um livro que merece a sua leitura: muito bem escrito e instigante para quem quer conhecer mais sobre esta passagem da história da colônia japonesa no Brasil.
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André 21/01/2013

Os Samurais e Ronins da Colônia
Impressionante como F Morais escolhe temas interessantes para seus livros, Chatô, Olga e Corações Sujos... Conhecer melhor peculiaridades da cultura japonesa, sua disciplina inquebrável, seu fanatismo pela divindade, o imperador, causa espanto. Tudo isso no conturbado período da II Guerra e do Estado Novo brasileiro. Organização secreta japonesa na colônia brasileira matava os patrícios que acreditavam na rendição japonesa, num fundamentalismo dos mais ferrenhos já visto.
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Braguinha 30/05/2016

Uma grande e deliciosa reportagem
Os japoneses que estavam no Brasil na época da Segunda Guerra Mundial se recusavam a aceitar a rendição japonesa. Assim, matavam os japoneses que aceitavam aquela condição de derrota. O autor descreve em detalhes como foi a perseguição que os japoneses “derrotistas” sofreram e quem eram os que perseguidores, bem como o seu fim e sua relação social com o novo país, o Brasil. Ótimo livro que vem de um desdobramento da Segunda Guerra. Na capa da edição que li, a foto dos japoneses assassinos.
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Gustavo M.D. 30/05/2017

Um pedaço do Brasil.
Corações Sujos é um livro jornalístico de Fernando Morais publicado originalmente em 2000.

A obra fala principalmente sobre a Shindo Renmei, um grupo rebelde de japoneses que moravam no Brasil durante o fim da Segunda Guerra Mudial e não acreditavam na derrota do Japão. As ações do grupo incluía propaganda falsa dentro das colônias japonesas no Brasil, invertendo os vencedores da Guerra, assim como ataques aos japoneses e descendentes de japoneses que falavam publicamente que o Japão havia sido derrotado (chamados de makegumi, “corações sujos”). O livro também trata de outros temas relativos ao central, como a imigração japonesa e o tratamento dispensado aos imigrantes no Brasil.

Esse movimento ocorreu especificamente no Brasil justamente pelo Brasil ser o segundo país com a maior concentração de japoneses, atrás apenas do… Japão, é claro.

O livro foi escrito por Fernando Morais após uma intensa pesquisa, possuindo um estilo de escrita quase literário, o que facilita muito na exposição dos acontecimentos, e traz um grande prazer à leitura.

A história da Shindo Renmei é uma história muito interessante, não só pelas suas ações, mas sobre como eles são um estilo de próprio de insurgente, totalmente caraterizados com a cultura japonesa. Para todos os efeitos a Shindo Renmei pode ser considerada hoje em dia uma organização terrorista, principalmente por sua técnica de calar os que discordam dela com técnicas de aplicação de medo e violência pontual como forma de exemplo. O Japão nunca havia sido derrotado em guerra até o advento da Segunda Guerra Mundial, e a Shindo Remnei acreditava que era impossível ele ser derrotado e, portanto, as histórias da derrota eram falsa propaganda dos Aliados.

Mas apesar do terror que causavam, a Shindo Renmei não era concentrada em lutar contra brasileiros (apesar de algumas refregas contra autoridades policiais) mas sim contra japoneses e niseis que não tinham um espírito nipônico de confiança na invencibilidade do Japão.

Isso tudo me lembra da história de Hiroo Onoda, que continuou uma guerra de um homem só nas selvas das Filipinas até 1972, incapaz de acreditar que o Japão havia sucumbido, e se recusando à abandonar suas ordens de ocupar a ilha em que estava. Hiroo só voltou à uma vida normal depois de receber uma delegação militar do Japão, que o dispensou de seu serviço e lhe deu um prêmio pela tenacidade e lealdade. Adivinha onde Hiroo foi morar depois disso? Sim, no Brasil.

Na verdade, o que se torna central no livro é essa ideia do ufanismo e dedicação dos japoneses, e como os filhos de japoneses no Brasil sempre aprendiam a ser japonês antes de ser brasileiro ou qualquer outra coisa.

Uma das minhas partes prediletas do livro é quando é descrito uma rádio pirata que enviava falsas notícias para as colônias japonesas, entre elas:

“MacArthur suicidou-se”

“O boato de que o Japão perdeu a guerra vem dos judeus do Rio de Janeiro, que estão fugindo para São Paulo, porque o povo do Rio sabe da vitória certa do Japão.”

Enfim, Corações Sujos é uma história das mais interessantes, com um foco histórico e sociológico sobre um grupo de imigrantes tão singular dentro do Brasil.

Edição que eu li: Editora Companhia das Letras, 2011. Terceira Edição.

site: http://www.grifonosso.com/2016/02/coracoes-sujos/
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Kizzy 29/01/2019

Mais que o radicalismo, um documento sobre a imigração japonesa no Brasil
O objetivo da narrativa é contar a história da Shindo Remmei (Liga dos Caminhos dos Súditos), organização formada por imigrantes japoneses residentes em São Paulo. Radical Nacionalista, a “seita” pregava que as notícias internacionais que davam conta da derrota do Japão na Guerra e a consequente rendição do imperador japonês às forças Estadunidenses, eram falsas e não passavam de uma trama orquestrada para desacreditar a população japonesa que residia fora da sua terra natal. Baseada nesta premissa, o objetivo da Shindo Remmei era assassinar os próprios colonos japoneses que acreditavam nas versões oficiais, denominados pela seita de Corações Sujos.

O Livro, enquanto obra jornalística, traz um panorama extremamente didático e instigante sobre a situação que essa premissa (hoje absurda aos nossos olhos), provocou na colônia nipônica brasileira, reportando dados comprovados de acontecimentos, prisões, documentos de formação e gestão da seita, nomes oficiais, fotos originais e o número confirmado de 23 imigrantes mortos e cerca de 150 feridos em apenas um ano de ação. A descrição do radicalismo e da negação dos integrantes aos fatos e provas documentais é assustadora, principalmente se correlacionada com acontecimentos atuais.

Fernando Morais, como sempre, faz os acontecimentos parecerem vivos e instigantes através de um texto rápido, jornalístico, coeso, ilustrado e vigoroso. Mais do que retratar a atuação da seita, Morais produz um importante, abrangente e coeso histórico da imigração japonesa no Brasil.

A obra aborda o contexto dos primeiros japoneses que chegaram ao Brasil no início do século XX, como as especificidades culturais sempre foram marcantes na colônia que tinha fortes restrições em se miscigenar aos brasileiros em todos aspectos, sua contribuição à agricultura e a forte influência na capital paulista e em cidades do interior de São Paulo como Tupã, Bastos e Marília, que chegaram a ter mais de 75% de população japonês em meados de século citado, tendo o Brasil atualmente, a maior concentração de japoneses fora do Japão em todo mundo.

A história brasileira é fascinante e cheia de movimentos e acontecimentos aventurescos, mitológicos e conceitualmente amplos, é uma pena que bebamos tão pouco dessa fonte e falhemos em passar esse conhecimento de forma viva e entusiástica nas escolas. “Corações Sujos” é uma ótima oportunidade para isso!

“Não assinaremos nada que fale de rendição do Japão! Nossa pátria está nessa guerra por ordem divina. Nós acreditamos piamente na vitória do Japão! O Japão é um país divino, dono de uma gloriosa história de 3 mil anos.”
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