Gabi 25/04/2014
Muito bom!
A Guerra do Vietnã é até hoje uma ferida que não cicatrizou totalmente para os americanos. É considerado a maior derrota militar e moral, isso contra um inimigo não muito bem definido, com um poderio militar muito inferior. Os vietcongues, como eram chamados os soldados vietnamitas representaram em combate algo próximo do que os japoneses representaram durante a Segunda Guerra. Lutaram em seu próprio território, que conheciam bem, e com um propósito mais bem definido que foi principalmente defender o país de um invasor externo, mais do que isso eram combatentes destemidos e obstinados. Ao contrário dos americanos, que lutavam contra a expansão comunista, muitos soldados talvez nem entendessem bem a finalidade dessa guerra, muitos sabiam que o comunismo era um inimigo a ser combatido, mas não sabiam exatamente quem ou como era esse inimigo. O uso de armas não convencionais pelos Estados Unidos parecia ter uma justificativa similar à que foi usada quando bombardearam Hiroshima e Nagasaki no final da Segunda Guerra, infligir um grande número de baixas, mesmo entre a população civil para humilhar o inimigo, instaurar medo e pânico e tentar vencer a guerra. Dessa vez não deu certo.
A guerra inaugurou também o movimento de manifestações contrárias à guerra. Até então, aparentemente, os Estados Unidos só haviam entrado em guerras supostamente justas, se é que se pode chamar uma guerra de justa, mas pelo menos tinham o apoio da maioria da população. De repente as famílias passaram a questionar a finalidade de estarem enviando os filhos para lutar. E motivos não faltaram para manifestações, principalmente com a exploração pela imprensa das imagens dos soldados mortos ou mutilados que eram trazidos de volta.
Em toda guerra ocorrem vários tipos de atrocidades, mas as que ocorreram no Vietnã parecem ter sido mais bem documentadas, com filmes, fotos, documentários, e foram talvez as mais exploradas pela mídia contrária à guerra. O veterano de guerra que lutou no Vietnã, no caso o americano, também parece ser o soldado mais traumatizado, com inúmeros exemplos em livros, filmes e principalmente na vida real mostrando as consequências psicológicas devastadoras que ocorreram nos soldados. Isso por conta de uma guerra travada em um lugar inóspito e contra um inimigo que sabia técnicas de combate e guerrilha superiores. Mas mesmo isso não foi o suficiente para evitar os massacres que ocorreram em alguns vilarejos vietnamitas. O caso mais famoso é o da aldeia de Mi Lai onde quase todos os camponeses do vilarejo, homens, mulheres, idosos e crianças, foram assassinados, aparentemente pelo fato de alguns soldados terem perdido a sanidade.
O tema da guerra é um dos mais explorados em livros, filmes, documentários, música, monumentos, etc. Talvez não haja outra guerra no mundo tão largamente explorada como a guerra do Vietnã, talvez mais do que a Primeira e Segunda Guerras Mundiais. Só em filmes temos "Apocalipse Now", "Bom Dia Vietnã", "Platoon", "Nascido para Matar" e muitos outros.
Virgil Flowers, investigador do Departamento de Detenção Crimonal de Minnesota, pode ser considerado uma espécie de Myron Bolitar. Claro que temos algumas diferenças, não temos Win, Esperanza, nem Mickey, nem o famoso achocolatado, mas de resto temos tudo, principalmente o humor, o mesmo humor sarcástico de alguém que se considera o tal. Não dá pra dizer que temos mais do mesmo como muitos poderiam pensar, mas um mais do mesmo diferente e bem bacana. No tema investigação temos Myron Bolitar, Alex Cross, D. D. Warren e agora Virgil Flowers em seu segundo livro. São variações de um mesmo tema, mas cada um com sua particularidade. Virgil, apesar de estarmos comparando com Myron é mais parecido com Win em relação às mulheres, é bem mais mulherengo que Myron, algo que sem ele saber pode até atrapalhar suas investigações, embora ele não sinta muito remorso ou arrependimento por isso. Seus casos vão desde ex-esposas, colegas de trabalho, e outras que aparecerem. Mas Virgil é muito perspicaz e consegue se safar de várias situações difíceis, e não são poucas.
Ele não lutou no Vietnã, mas precisa descobrir qualquer coisa relacionada com rituais da guerra, como o fato de se colocar um limão na boca de um condenado antes de sua execução. É desse modo que a polícia encontra alguns homens assassinados, com um limão na boca e ao lado de um monumento de guerra. A missão de Virgil será desvendar esses crimes, contando com a ajuda de um professor universitário e sua filha, com quem Virgil, é claro, acaba se envolvendo. A narrativa dessa vez parece mais tranquila, o autor tenta deixar bem explicada a trama, o método dos assassinos, o temor dar vítimas, a investigação de Virgil, são vários personagens e lugares, um pouco da história da guerra. Dá pra perceber a dificuldade de Virgil em descobrir algo de concreto, mas aos poucos ele vai percebendo seus erros e com a ajuda de muitos e muitos colegas põe em prática um plano para desvendar o caso.
Há muitas referências e citações, de bandas de rock a músicas, lugares e pessoas, pescaria, que é um hobby de Virgil, são muitos personagens e tudo com muito humor. Para se ter uma idéia até o nome de um colega de Virgil é digno de comentário, trata-se de Del Capslock, o nome mais informático que já apareceu em uma resenha. A trama se passa em várias cidades do estado de Minnesota, parece que quando o autor descreve um local imaginamos uma cidade americana pequena e interiorana, mas não com aquele jeito de cidade atrasada que geralmente se imagina a respeito de cidades americanas desconhecidas. Virgil Flowers já teve o livro "A Sombra da Lua" resenhado em nosso blog, e provavelmente terá mais. Como sempre, é um tipo de leitura para entreter, um tipo de leitura agradável, e muito divertida. Temos suspense, não importa se o herói vai sobreviver, sabemos que sim, o que importa é como ele vai sobreviver. Temos o mistério, quem é, ou quem são os culpados, quem matou ou quem vai morrer, e por mais que tenhamos idéia de como tudo vai acabar, há os desfechos improváveis e surpreendentes. Enquanto nossos autores tiverem imaginação, vamos tentar acompanhá-los com as resenhas de nossos detetives e investigadores preferidos.
site: http://ilusoesnoturnas.blogspot.com.br/2014/04/resenha-noite-de-tempestade-john.html